Façamos esta viagem por um tempo sem pressas através de quatro artes intemporais. Cerâmica, olaria, tapeçaria, assim como o vinho, fazem-se de gestos com vagar e, por isso, sem fintarem a urgência no calendário.

Artes que pedem mãos sabedoras, ritmadas, percorrendo gestos seculares no padrão floral de um Tapete de Arraiolos, na harmonia de uma peça de barro, na pintura cuidada de um painel de azulejos e no vinho que é assinatura do território em que se fez.

Um metro quadrado de Tapete de Arraiolos não se mede na pressa de fintar o relógio. Exige mão paciente, na urdidura da lã sobre a tela para criar padrões de geometria precisa. Como também pede mão com saber o barro que assenta sobre a roda de oleiro e que, mais tarde, há de fazer-se prato, caneca, pote, travessa ou peça decorativa.

Também o vinho é expressão de um tempo que se faz a pouco e pouco. Muito antes de ser néctar para saborear, o vinho pede mão e engenho que o pense. Não pode haver pressa neste processo de fazer da uva um vinho.

Olhemos, em quatro histórias de vida, para o tapete, para a olaria, para a azulejaria e para o vinho. Em comum, para além dos artesãos que laboram sem pressas, o desafio: expressarem na sua arte a homenagem ao vinho Monte Velho, néctar produzido pelo Esporão. Como mote: “Feito devagar no Alentejo”.

Emília Cristina e a paciente arte do Tapete de Arraiolos

Com o vagar que o tempo lhe oferece, Emília Cristina tece os seus tapetes. Lisboeta de nascença, encontrou há muito porto seguro para a sua arte, aprendida no liceu, na loja com o número 35 na rua Actor Vale, na capital. Enquanto tece, recorda o tempo em que fez um tapete para uma colega de trabalho e não mais parou. “Uma colega de trabalho perguntou-me se eu sabia fazer estes tapetes e eu disse que sim. Ela queria que eu lhe fizesse um, mas eu decidi ensiná-la. Resumo da história: acabei por ser eu a acabar o tapete".

artesãos do tempo
Esporão

Atualmente a governar os destinos da loja que lhe encomendava inúmeros tapetes no passado, a artesã procura novos caminhos para a sua arte. Emília não se limita aos padrões habituais pois, como confessa, “a técnica deve acompanhar a evolução”. A artesã conta com famílias inteiras e amigos que lhe pedem restauros, mas também com projectos diferentes.  Do velho, faço novo. E faço tapetes especiais, com tamanhos e cores que não são habituais nos tapetes clássicos. Se alguém quer uma cópia de uma fotografia, uma paisagem ou algo muito específico, eu faço”.

Um progresso que a tecedeira aplicou nos dois tapetes especiais que elaborou para homenagear o vinho Monte Velho. “Colaborações como estas ajudam a divulgar a arte. Um tapete deste tamanho, que vai ser mostrado em diversos lugares, permite partilhar com as pessoas uma nova vida dos Arraiolos”.

Arte que é exigente: 11 horas para bordar 160 gramas de lã sobre o tecido áspero da tela. Mais de 320 horas para completar um tapete.

Xico Tarefa, oleiro e contador de histórias

Honre-se a paciência do oleiro Francisco Rosado, carinhosamente apelidado de Xico Tarefa, obreiro de dezenas de milhares de peças em barro e exímio contador de histórias. Multiplique-se o labor de tempo que exige cozer uma única peça, por tantas outras que já passaram pelas mãos sabedoras do oleiro: 16 horas no calor do forno, outras tantas de pinturas.

No Redondo onde tem a sua olaria, Francisco recorda com nostalgia um tempo em que operavam mais de 30 oficinas. Ainda menino, o artesão entretinha-se com o barro. Depois, um mestre local ensinou a Xico Tarefa todos os segredos da profissão. Aos 16 anos fez-se mestre. Mais tarde, no Centro Lúdico, ensinou a olaria a crianças e preservou assim a arte. Quando se reformou, Xico Tarefa montou a sua oficina e não mais parou, sempre obedecendo às regras da olaria do Redondo: desenho a três cores (amarelo, verde e castanho), barro engrafitado e, depois, pintado.

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créditos: Esporão

Face ao projeto que lhe foi endereçado pelo Esporão, reproduzir em barro uma garrafa de Monte Velho, Xico percebeu que precisaria de tempo e criatividade. “Com o tempo procurei novas abordagens. Tal como este projecto com o Esporão, que considerei logo um desafio", reconhece. Feita a placa em barro, foi-lhe dado um banho de tinta branca. Após a secagem, o artesão fez o esboço do desenho, depois decalcado, trilhado e riscado com lápis de cor.

“Eu acho que ficou excecional e fiel ao seu lema ‘Feito devagar no Alentejo’. Mas, na verdade, eu sou suspeito”, termina Xico Tarefa.

Manuela Guerreiro e o apego à cerâmica

Arte de rigor sintetizam a azulejaria de Manuela Guerreiro, artesã da empresa Viúva Lamego, casa fundada em 1849, em Lisboa. Manuela, com mais de 40 anos na empresa, não se “imagina a fazer outra coisa”, como confessa, adiantando que “adoro receber novos projetos como este do Esporão”.

Viagem ao Alentejo “feito devagar”, o lugar onde moram os artesãos do tempo  - Azulejaria

A artesã emprestou uma semana do seu tempo na elaboração do painel de azulejos para o vinho Monte Velho (em exposição no enoturismo da Herdade do Esporão). “Depressa e bem não há quem”, recorda-nos Manuela, salientando o processo de pintura camada após camada, de jogos cromáticos, numa paleta com dezenas de cores.

“Com o papel vegetal copiámos o desenho e picotámo-lo com uma agulha. Posteriormente passámos o carvão – um pó que desaparece no forno -, no picotado e o desenho ficou delineado no branco. Depois, pintámos a peça à mão com a aplicação de cores e sombras tal como a garrafa. Sendo um painel, há um processo de marcação atrás para facilitar a montagem do mesmo”, explica Manuela.

A artista não esquece o labor de toda uma equipa que emprestou o teu saber e tempo pacientes ao painel de azulejos. Uma entre “peças que são únicas. Essa singularidade e a marca de quem as faz, acrescenta-lhes valor”, resume Manuela Guerreiro.

Sandra Alves, mentora de vinhos pacientes

Disponibilidade para saber esperar é dom que bem conhece Sandra Alves, diretora de enologia no Esporão, casa produtora de vinhos, fundada em 1973, com presença em diferentes territórios nacionais, no Alentejo, Douro e região dos Vinhos Verdes.

“Ainda estava na faculdade a estudar enologia e o Monte Velho já era um vinho de referência. Estava longe de imaginar que um dia seria uma das responsáveis pela sua produção", recorda Sandra Alves.

feito no alentejo
créditos: Esporão

Tal como todos os artesãos, Sandra Alves, há 20 anos no Esporão sabe como cada colheita é única. Um vinho obedece às exigências do tempo sem pressa. Não há como quantificar quantas horas, dias, semanas ou meses, lhes pede um néctar. Há que assumir um compromisso entre quem elabora o vinho e quem o prova. Um “diálogo” que traduz as origens, a paciência, o elo com a sustentabilidade e o respeito de todas as etapas que sustentam um vinho. Trabalho em rede que junta diariamente as equipas de enologia e agrícola.

Um pensar o vinho que envolve os viticultores que trabalham com o Esporão. “Estamos em contacto diário com todos”, salienta Sandra. Há de chegar o momento da vindima e a adega passa a ser o lugar onde tudo acontece. “Desde a receção, processo de fermentação, prensagem, pré-estágio e maturação, importa estarmos atentos a todos os pormenores até o vinho chegar ao consumidor”, sublinha a enóloga. 

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créditos: Esporão

Sucede-se a prova, momento para identificar e definir as diferentes personalidades da colheita. “Para nós, enologia, é um momento diário de grande concentração, onde são tomadas as mais importantes decisões, que determinam o futuro de cada vinho”. Isto numa adega desenhada à medida de um “vinho feito com seriedade e nas melhores condições possíveis. Tanto para o tinto, para o branco como para o rosé, procuramos um perfil intenso, fresco e fundamentalmente, que retrate o melhor do Alentejo”.