Combater a iliteracia alimentar é um dos principais objetivos de À Roda da Alimentação, um blogue apresentado publicamente no final de 2018. Em 2019, o projeto vai ser complementado com um programa de televisão, que já está a ser gravado, conduzido por Catarina Furtado. Em entrevista, a apresentadora, o rosto mais mediático deste movimento, revela os hábitos saudáveis que tem e ainda fala do sonho a move.

À Roda da Alimentação, um blogue que pretende ensinar os portugueses a comer melhor, é um dos seus grandes projetos para 2019. Tendo em conta os muitos erros alimentares que se cometem à mesa, tem um grande desafio em mãos…

Tenho um super desafio e estou muito contente com ele porque, de facto, tenho de confessar que passou de uma preocupação particular, que tinha enquanto mãe de família, mulher e comunicadora, para uma preocupação pública. Há muitas preocupações que eu tenho ao longo da vida que, basicamente, têm o mesmo objetivo, que é melhorar a qualidade de vida das pessoas.

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Publicamente, enquanto embaixadora de Boa Vontade do Fundo de População das Nações Unidas [UNFPA] e enquanto presidente e fundadora da [associação] Corações com Coroa, tenho sempre tido essa preocupação.

São causas públicas. A promoção da não discriminação, da não violência, da igualdade de género... Essas são as minhas causas! E é engraçado que uma dessas minhas causas é a questão da alimentação saudável e da qualidade de vida.

Sempre o foi lá em casa! Portanto, quando de repente achei que podia passar essas minhas preocupações da esfera privada para a pública, o melhor aliado tinha de ser o Continente, que também tem essa causa há muito tempo. Há uns anos, não sei precisar quantos, dei a cara pelo Movimento Hiper Saudável do Continente.

Isto vem no seguimento disso! Agora, é um desafio muito maior, porquê? Porque tem um blogue, porque vai ter um programa de televisão e porque, no fundo, vou verdadeiramente aprender mais coisas [sobre alimentação, saúde e bem-estar] e aprender a traduzi-las, para os portugueses, que são os meus interlocutores.

E está confiante? Os portugueses não são propriamente dos que mais se preocupam com a alimentação…

Estou! Eu acredito piamente, ainda que tome o seu tempo, numa mudança de hábitos alimentares e de comportamentos. Porque não estamos só a falar daquilo que queremos mas também da forma como vivemos. Os hábitos saudáveis também passam pelo bem-estar.

Não é necessariamente ir ao ginásio todos os dias mas é ter uma consciência do corpo diferente. Ainda por cima, no meu caso, eu sou daquelas pessoas que não são excessivas em tudo. Modéstia à parte, acho que sou equilibrada e, portanto, é essa mensagem que eu quero passar… A necessidade de equilíbrio!

O blogue está online desde o final de 2018…

O blogue já está ativo. Avançou devagarinho. Não quisemos logo promovê-lo desde o início…

A ideia é ensinar os portugueses a comer melhor mas, no seu caso pessoal, alimenta-se bem?

Tenho hábitos que ganhei porque fui bailarina profissional, o que me exigiu muita disciplina e fez com que eu, hoje em dia, mesmo já não dançando, tenha determinadas necessidades. O próprio organismo pede-me comida. Tenho de comer de duas horas e meia em duas horas e meia. Não há como fugir! De duas horas e meia em duas horas e meia, o meu estômago manda-me comer.

Este é um hábito alimentar que é absolutamente vital. Muitas pessoas, muitas vezes, dizem-me que não comeram nada durante o dia e que, ainda assim, estão a engordar… Claro! Não comeram nada durante o dia e, depois, comem à noite. Estão cansadas do trabalho e da vida difícil de todos os dias e ingerem hidratos [de carbono], que são exatamente aquilo que lhes vai fazer mal, porque depois não gastam essas calorias.

Eu como de duas horas e meia em duas horas e meia. Nunca passa disso! Alguns nutricionistas até falam em três horas ou em três horas e meia mas, no meu caso, o corpo já está habituado assim. Esse é um hábito. Beber muita água é outro. Muitas pessoas, por vezes, tendem a esquecer-se. Depois, há outros, mas estes são assim os principais…

E, mesmo respeitando esses horários, a alimentação que faz é sempre saudável? Há dias em que, com a sua vida agitada, não deve ser propriamente fácil…

Essa é uma boa pergunta. Há dias em que não é fácil! Não vos vou dizer que a minha alimentação é sempre saudável. Estaria a mentir se o dissesse e eu não minto aos portugueses. Há dias em que não é possível, dadas as circunstâncias, mas são raríssimos esses dias porque eu já me previno, levando comigo uma lancheirazita com cereais, com bolachas, com nozes, com iogurtes…

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Vou dar-vos um exemplo muito engraçado. Eu, quando faço as reportagens para o [programa de televisão] "Príncipes do nada", permaneço durante muito tempo no país [onde é gravado]. Em Moçambique, em Cabo Verde ou em São Tomé, vou para sítios onde não há nada e um dos meus hábitos, antes de viajar para lá, é ir ao supermercado. E, depois, faço lancheiras para a semana inteira. Faço-o não só para mim mas também para os meus dois companheiros, o realizador e o câmara.

Assim, garanto que não passamos muito tempo sem comer e também que nos alimentamos de forma saudável, com cereais, bolachas e frutos secos. Habitualmente, não levo fruta porque, nesses sítios, há sempre fruta excelente. Tomo conta deles, que é uma coisa que eu gosto de fazer. Eu gosto de tomar conta das pessoas.

E, quando está em Portugal, o que é que tem sempre na mala e na lancheira?

Na minha mala, há sempre maçãs! De vez em quando, ponho lá bolachas, barras de cereais, bolachas integrais, das quais gosto imenso. Também costumo ter bolachas de arroz, daquelas que parecem esferovite… [risos]

Consegue resistir sempre às tentações? Nunca comete nenhum pecado?

Não é que não coma um chocolate de vez em quando… Como chocolate preto, por exemplo, mas eu não sou muito de doces. Sou mais de salgados! Aquilo com que tenho mesmo de me controlar, e aí desce à terra uma consciência terrível, são os salgados…

E, dentro dos salgados, há assim um que seja uma tentação maior?

Há, os folhados… Mas raramente como! Só quando o rei faz anos. Não é quando o [João] Reis [o marido] faz anos, que é só em janeiro… [risos]

Está a ensinar os portugueses a comer melhor mas também a comprar melhor, aprendendo a fazer as escolhas mais saudáveis. Também vai ao supermercado?

Quem vai, normalmente, ao supermercado lá em casa é o meu marido, mas é uma tarefa que é partilhada. Há uma lista que é feita. A minha filha sugere os cereais de que gosta mais, o meu filho sugere os iogurtes… O meu marido é que tem ido mais às compras. Ele é que tem estado mais atento aos rótulos…

Na sessão de apresentação do blogue À Roda da Alimentação, vários especialistas alertaram para o facto de muitos pais excluírem os filhos da cozinha e da preparação das refeições. Os seus filhos também são envolvidos nestas questões da alimentação saudável ou, como diz o ditado popular, em casa de ferreiro espeto de pau?

Sim, estão mesmo. Mas também cedem a tentações. Quando há uma festa de anos, já sei que no meio das coisas saudáveis que estão disponíveis, eles podem sempre pecar um bocadinho. Os amigos dos meus filhos já sabem que, nas festas de anos deles, as coisas são sempre saudáveis.

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A maior parte das coisas que ponho numa mesa numa festa de anos é saudável, à exceção de uma coisa ou de outra que possa ter mais açúcar.

Mas eles já sabem que essas coisas são para os dias excecionais. O que vamos procurar fazer aqui no movimento À Roda da Alimentação é evitarmos ser demasiado demagogos ou demasiado exigentes. Não vamos agora, de repente, dizer que faz tudo mal. É mentira! No equilíbrio, é que está o grande segredo.

O grande segredo é não comer muito, é comer menos, porque os portugueses comem muito. Repetem muito. Comem mais do que aquilo que precisam para os seus gastos energéticos, quando pode haver uma gestão equilibrada e sã, com uma consciência clara em termos de informação. A partir daí, informados, podem optar conscientemente, o que é completamente diferente. Podem passar a fazer uma escolha responsável.

O programa de televisão associado ao blogue começou a ser gravado ainda em 2018 com a participação de especialistas. Tem sido um período de descobertas, sobretudo no que se refere aos mitos em que todos cremos e que, muitas vezes, não têm qualquer fundamento…

Sim, eu própria tinha mitos. Há alimentos que eu achava que engordavam. Ainda no outro dia, estava a gravar um episódio do novo programa com uma nutricionista e, a dada altura, ela fala sobre as bananas e sobre as batatas. Eu interrompi-a para dizer que ambas engordavam e ela explicou-me que não.

Desde que a alimentação seja equilibrada e, desde que não se repitam várias vezes ao dia, as batatas e as bananas não engordam, como ela me explicou… Eu também tinha esse mito! São coisas que vamos ouvindo…

E, em casa, costuma cozinhar?

Não… [risos] Já estou a aprender umas coisas mas, lá em casa, quem cozinha é o meu marido. Não vou mentir… Eu adoro comer e adoro saber o que é que como mas cozinhar não é o meu forte. Quando conheci o João [Reis, o marido] perguntei-lhe se sabia dançar e se sabia cozinhar. Ele disse que sim. Perfeito! [risos]

Na associação que fundou, a Corações com Coroa, que agora no início de janeiro de 2019 já fez sete anos, também procuram abordar esta temática no âmbito dos vários projetos que levam a cabo?

Sim! Um dos serviços que atendimento que temos na Corações com Coroa é o aconselhamento com uma nutricionista. É um serviço gratuito, que está disponível, todas as semanas, na nossa sede, na rua da Junqueira, [número 295/7, em Lisboa].

Desde que começou a sua carreira de apresentadora, nos primeiros anos da década de 1990, muita coisa mudou. Hoje, os apresentadores, tal como os atores e outras celebridades, são eles próprios marcas. Muitos associam-se mesmo a empresas para promover produtos e serviços. No seu caso, apesar de também já o ter feito numa ou noutra situação, prefere associar mais o seu nome a causas…

É incrível, não é?

Nunca tem a tentação de se desviar desse caminho?

[faz uma pausa] Eu tenho um sonho e esse sonho é, quando me for embora, saber que a minha pegada neste mundo fez com que as pessoas, independentemente de estarem em Portugal ou num país em desenvolvimento, viveram melhor porque eu contribui para isso. Esse é o meu sonho!