Estou sempre com muito receio de errar e ser despedido(a).

Se eu não sou pedófilo porque é que estou sempre a pensar que sou?

Se tenho sempre boas notas porque é que penso que não sou bom aluno(a)?

As dúvidas excessivas foram originalmente designadas como folie du doute (a loucura das dúvidas). Referem-se à perceção persistente da própria pessoa de que se encontra em situações de “erro” ou de perigo, constituindo-se essa perceção como central na Perturbação obsessivo-compulsiva.

Esta perturbação caracteriza-se pela presença de duas condições clínicas relacionadas, ou seja, por obsessões e compulsões, tendo como pano de fundo a ansiedade patológica. As obsessões dizem respeito a pensamentos, preocupações ou imagens recorrentes sentidas como intrusivas e indesejadas. As compulsões são comportamentos ou atos mentais repetitivos realizados como respostas às obsessões e rigidamente aplicadas, com o intuito de reduzir a ansiedade que provoca ou de prevenir acontecimentos indesejados. No entanto, o alívio da ansiedade é momentâneo, facto que leva a pessoa a reproduzir sistematicamente o ciclo obsessivo-compulsivo.

Apesar desta patologia surgir, normalmente, associada à imagem de alguém excessivamente arrumado, meticuloso e organizado ou à simetria e limpeza excessiva, não se revela apenas nestas características clínicas. De facto, esta perturbação, nas suas várias formas de expressão, pode causar um rol de dúvidas intermináveis, medos intensos e fobias.

As dúvidas de natureza obsessiva (patológica), o segundo sintoma mais comum (muito embora possam não ser facilmente diagnosticadas como sintomas da perturbação obsessivo-compulsiva), podem apresentar um sem-fim de preocupações, tendencialmente relacionadas com a possibilidade de que em consequência de um descuido próprio ou de um mau pensamento vá acontecer algo catastrófico, perigoso ou com consequências negativas, principalmente para com os seus familiares ou amigos, para com o trabalho ou com bens.

Refira-se, como exemplo, o imenso e continuado medo de um acidente de viação ou o receio de que a casa se incendeie. Embora possam ter alguma convicção da terem tido os devidos cuidados, prevalecem as dúvidas excessivas. De facto, facilmente duvidam das suas próprias perceções, sem que as consigam validar ou confirmar.

Rituais de verificação

Quando a dúvida é patológica determina a realização dos rituais de verificação, os quais podem durar horas. Pode ser o caso de quem procura confirmar que é correspondido numa relação questionando o outro, sistemática e insistentemente, sobre os seus sentimentos até que, finalmente, tem a resposta que oferece alguma tranquilidade, ainda que esta seja efémera, precipitando rapidamente para novo ciclo de dúvidas intermináveis e novos questionamentos.

Estes comportamentos podem representar um sofrimento e ansiedade de tal ordem que conduzem ao evitamento do outro, podendo culminar em rutura da relação. Noutros casos, por exemplo, as pessoas podem consumir horas a realizar numerosas verificações antes de conseguir sair de casa, causando significativo prejuízo no seu funcionamento e no dia-a-dia.

A Perturbação obsessivo-compulsiva também é conhecida como “doença escondida” devido à relutância que as pessoas afetadas têm em referir os conteúdos das obsessões e compulsões ao profissional de saúde mental. Tendencialmente, são de natureza religiosa, sexual ou violenta, considerados como impróprios, imorais ou proibidos pelo próprio.

Tratando-se de uma doença do foro mental que interfere significativamente com o funcionamento e bem-estar da pessoa, procurar ajuda através da consulta psicológica pode ser a melhor opção, revelando um comportamento de amor próprio e de desejo por maior qualidade de vida.

Um artigo da psicóloga clínica Lina Raimundo, da MIND | Instituto de Psicologia Clínica e Forense.