A infertilidade é considerada um problema de saúde pela Organização Mundial de Saúde. Define-se como ausência de gestação após 12 meses de tentativas, sendo tentativa caracterizada por uma vida sexual ativa (relações de 2 a 4 vezes por semana) sem a utilização de quaisquer métodos contracetivos. Pode afetar cerca de 10 a 15% dos casais e 30% dos casos estarão relacionados com causas femininas, outros 30% com causas masculinas, 20% com causas mistas e outros 20% inexplicados.

É muito comum os pacientes relatarem a infertilidade, assim como os tratamentos associados, como um dos acontecimentos de vida mais stressantes para o casal. Os fatores culturais, sociais, individuais, demográficos e clínicos, estão na origem de diferenças individuais nas respostas emocionais e são determinantes para a forma como cada pessoa vivência as suas dificuldades reprodutivas.

A sociedade atual ainda promove muito o papel da mulher enquanto ser capaz de conceber e gerar uma criança. Por este motivo, a vivência da infertilidade surge muitas vezes associada a sentimentos de diferença, estigmatização, defeito e solidão, sobretudo nas mulheres. Em pleno século da igualdade de género, as mulheres ainda tendem a viver mais a pressão social no sentido de terem filhos e a assumir a culpa da infertilidade, comparativamente com os homens, mesmo nos casos em que a infertilidade se deve a fatores masculinos.

A infertilidade é um desafio do casal e a sua vivência é também condicionada por fatores da conjugalidade. Quando o contexto é a montanha russa de emoções provocadas pela infertilidade, a forma como o casal comunica entre si as suas necessidades emocionais pode trazer desafios e precisar de ser reajustada. Por outro lado, os tratamentos invasivos fisicamente, por vezes acabam por interferir negativamente na intimidade do casal. É uma fase, é importante conversar sobre o que cada um sente e nas diferenças procurar a complementaridade.

Alguns casais, quando procuram ajuda por dificuldades reprodutivas, já chegam muito desgastados. Por norma, já viveram uma sucessão de ciclos sem gravidez, um acumular de questões para as quais não obtiveram respostas e eventualmente algumas perdas marcantes, com lutos ainda a processar. É muito importante conhecermos a história do casal que nos chega, porque essa história pode de facto condicionar a forma como vão receber toda a informação e também os seus processos de tomada de decisão, assim como a sua capacidade de lidar com os tratamentos.

A infertilidade pode ser um caminho de incerteza, ambiguidade e imprevisibilidade. Esse sentimento de ausência de controlo, assim como o confronto com as taxas de sucesso reais (por norma bem mais baixas do que as pessoas tendem a projetar) acabam por gerar ansiedade. Na nossa sociedade, ainda existe a crença generalizada de que as mulheres podem engravidar a qualquer altura das suas vidas ou que um tratamento é a solução imediata para as dificuldades reprodutivas. Para algumas pessoas, o confronto com a realidade é vivenciado como um choque que tem um impacto forte na forma como se sentem e também como se projetam no futuro. São crenças e expetativas que precisam de ser reajustadas.

Por vezes os tratamentos prolongam-se no tempo e sucedem-se sem o resultado desejado. Na sequência de vários ciclos de tratamentos com resultados negativos, naturalmente tendem a surgir mais sentimentos de tristeza, zanga e depressão. Cerca de 25 a 40% dos casais com dificuldades reprodutivas relatam sinais de ansiedade e depressão mais elevados comparativamente com os casais férteis. Felizmente a saúde mental tem sido cada vez mais colocada na ordem do dia e valorizada de forma transversal, nos diferentes contextos da nossa vida. Hoje sabemos que não há saúde sem saúde psicológica. Quando falamos de saúde psicológica é fundamental abordarmos as nossas necessidades de saúde psicológica. A resiliência, o autocuidado, as relações de intimidade saudáveis, a empatia, o humor, a aprendizagem, a esperança, o sentido de propósito, são algumas delas. São áreas que exploramos na consulta de psicologia.

A resiliência é a capacidade para lidar com as adversidades, assim como com as consequências negativas e conseguir superá-las. Implica uma adaptação à mudança e a transformação de experiências negativas na nossa vida. Pessoas menos resilientes poderão sentir que não são capazes de regular as suas emoções negativas. Consequentemente poderão sentir que não se conseguem mobilizar para se envolverem em atividades que ajudem a manter o sentido de propósito e a perceber o que é que mais valorizam. A resiliência ajuda-nos a gerir melhor o stresse das situações difíceis e a aproveitarmos as coisas boas da vida, mesmo quando há aspetos que correm mal. A resiliência não vai fazer com que os nossos problemas desapareçam nem evitar que surjam de forma mágica. Ser resiliente não significa aguentarmos sozinhos tudo o que nos acontece, pelo contrário, é também saber pedir ajuda quando precisamos dela.

A resiliência é algo que se constrói, que requer tempo e prática, que por vezes funciona por tentativa e erro, mas que é útil e nos ajuda a superar os desafi­os que surgem ao longo da vida, assim como a realizar as nossas capacidades e potencial. Podemos desenvolver a nossa resiliência ao alimentar relações positivas com familiares e amigos, que nos acompanhem nos dias bons e nos menos bons, que nos ajudem a pensar e a lidar com os nossos desa­fios. Aceitar que a mudança e a incerteza fazem parte da vida, encontrar signifi­cados, fazer coisas que, diariamente, dão sentido e propósito à nossa vida são também formas de nos tornarmos mais resilientes. Todos nós já passámos por momentos difíceis - que recursos, estratégias e competências utilizámos para os ultrapassar? Reconhecer e aprender com a nossa própria experiência é também uma ferramenta.

Muitas vezes, nas fases de maior stresse há uma tendência para adotar mais comportamentos de risco como fumar mais, desenvolver problemas de sono, ter uma má alimentação e ao mesmo tempo investir menos ou não investir de todo no autocuidado. É exatamente nessas alturas que mais precisamos de o fazer. O autocuidado pode-nos ajudar a gerir e a equilibrar melhor as exigências de fases mais desafiantes. As necessidades do autocuidado variam de pessoa para pessoa e não são sempre as mesmas em diferentes momentos da vida. Autocuidado pode ser envolvermo-nos em atividades que nos façam sentir bem, que nos ajudem a relaxar e a sentirmo-nos felizes; podem ser escolhas saudáveis no dia-a-dia relacionadas com a alimentação, a prática de exercício físico e a rotina do sono; pode ser investir nas relações sociais; pode ser procurar um equilíbrio mais saudável entre a vida profissional e a familiar. São temas que exploramos na consulta de psicologia quando alguém procura apoio para lidar com o impacto da infertilidade e dos tratamentos.

A Saúde Psicológica está relacionada com a capacidade de utilizarmos as nossas competências para gerir os desafios do dia a dia nos diferentes contextos em que vivemos. Quando temos Saúde Psicológica, sentimo-nos confiantes e capazes de lidar com a nossa vida e com as outras pessoas. Procurar um psicólogo pode ser importante, falar ajuda.

Um artigo da psicóloga clínica Filipa Santos, especialista na Clínica IVI Lisboa.