Se a geração do "baby boom" - nascida entre 1958 e 1975 - sabia que se poderia reformar onde tinha começado a trabalhar, os millennials - que nasceram entre os anos 80 e meados dos anos 90 do século passado - não temem a mobilidade, especialmente se isso lhes puder trazer melhores condições de vida e de trabalho.

Um dos grupos profissionais em que isso é demonstrado é o dos médicos. Segundo a Organização Médica Espanhola (OMC), citada pelo diário El Mundo, entre 1 de janeiro e 1 de julho de 2019, foram emitidos 2.540 certificados de aptidão para trabalhar no estrangeiro, correspondendo a pedidos de 1.671 médicos.

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O número representa um aumento de 20% face ao mesmo período do ano anterior, quando foram fornecidas 2.115 autorizações. Em Portugal, ainda não são conhecidos os números deste ano referentes aos pedidos à Ordem dos Médicos para trabalhar no estrangeiro.

A distinção entre os sexos não é significativa e a maioria dos médicos espanhóis parte para o Reino Unido ou França, sendo as especialidades onde estas licenças são mais solicitadas a Medicina Geral e Familiar, a Anestesiologia e a Pediatria.

Um dos dados que mais chama a atenção nestas estatísticas é que a maioria dos pedidos de trabalho é liderada por médicos com menos de 35 anos (um total de 456), seguida pelo corte de idades entre os 35 e os 50 anos (406).

Em Espanha, escreve o referido jornal, esta é uma tendência que se regista há algum tempo e cujos motivos estão diretamente relacionados com as condições de trabalho dos profissionais, segundo organizações como a União Médica da Comunidade Valenciana CESM-CV, que extrapolam a situação para o resto de Espanha.

Em Portugal

A emigração de médicos, sobretudo dos recém-especialistas, não é novidade em Portugal. Este fenómeno que à semelhança de outras profissões é muitas vezes chamado de Brain Drain, ou fuga de cérebros, voltou a aumentar em 2018 depois de ter descido desde o início da atual legislatura e ameaça, nos próximos anos, assumir a mesma dimensão que teve nos anos da crise económica. Em meio ano, saíram quase tantos médicos do país como em todo o ano de 2017: a maioria dos casos diz respeito a jovens profissionais sem lugar para internato, que procuram tirar uma especialidade no estrangeiro.

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Já outros dados da Ordem dos Médicos não deixam margem para dúvidas: 63% dos 130 médicos que até 30 de junho de 2018 pediram a declaração para trabalhar no estrangeiro (em todo o ano passado foram 182 e em 2016 foram 198) não estão inscritos em qualquer especialidade; e 60% do total têm entre 25 e 34 anos.

Já o estudo "A carreira médica e os factores determinantes da saída do SNS", realizado em 2018, mostrou que mais de dois terços dos médicos portugueses mostraram-se insatisfeitos ou muito insatisfeitos com o SNS. O único aspeto em que a maior parte dos 2283 médicos dos três grupos que responderam ao questionário online se mostram globalmente satisfeitos é no relacionamento com os colegas.

Oportunidades aliciantes

A somar à insatisfação dos profissionais, não faltam oportunidades aliciantes no estrangeiro. Uma agência de recrutamento profissional da Irlanda anunciou em março deste ano que estava interessada em recrutar médicos de Medicina Geral e Familiar portugueses, oferecendo-lhes um salário bruto de 2.750 euros por semana, o que se traduz em mais de 11 mil euros brutos mensais. A oferta fez manchetes nos jornais nacionais na mesma altura em que a Galiza abriu um concurso destinado a médicos portugueses com ofertas salariais superiores às proporcionadas pelo Estado português.

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Em Portugal, um médico em início de carreira recebe cerca de 28 mil euros brutos por ano, o correspondente a dois mil euros por mês.

A Ordem dos Médicos já se mostrou preocupada com a eventual emigração de clínicos numa altura em que Portugal tem quase meio milhão de portugueses sem médico de família. A região de Lisboa e Vale do Tejo é a mais afetada. "Isto é absolutamente lamentável e, nesse tipo de condições, é difícil que depois não haja falta de pediatras, médicos de família, anestesiologistas, dermatologistas e por aí adiante", disse em março a propósito deste tema o bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães.