“Pretendemos que o legislador atue, acautele e proteja todos os dadores que o fizeram debaixo do chapéu do anonimato e que têm direitos fundamentais que devem ser respeitados, como o direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar”, afirmou Carla Rodrigues na comissão de Saúde, onde foi ouvida a seu pedido.

O pedido de audiência do CNPMA surgiu na sequência de um acórdão do Tribunal Constitucional, que considerou inconstitucionais algumas normas da lei da PMA, nomeadamente o anonimato dos dadores de gâmetas.

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Carla Rodrigues defendeu também que se defina “um período transitório” para que os gâmetas e embriões que estão neste momento criopreservados possam ser utilizados, garantindo-se o anonimato dos dadores que quiserem permanecer anónimos.

A presidente do CNPMA adiantou que as preocupações do conselho se prendem com o funcionamento dos Centros de Procriação Medicamente Assistida, com os dadores de gâmetas e com os beneficiários, mas “sobretudo com as crianças já nascidas e com as que vão continuar a nascer fruto destas técnicas”.

Segundo a responsável, o acórdão do Tribunal Constitucional, que determina que o anonimato dos dadores terá de deixar de existir, cria uma contradição que “tem de ser ultrapassada”.

“Queremos saber como isto se vai operacionalizar e como vamos resolver as questões que estão pendentes nos centros de PMA”, disse, adiantando que existem duas situações distintas.

Por um lado, existem os dadores que já doaram gâmetas e em que já há crianças nascidas, na sequência de uma “dádiva que foi feita no pressuposto de que seria anónima para sempre”.

“Alguns dos dadores fizeram-no com a garantia acrescida” do acórdão do TC de 2009, que declarou que o anonimato não lhes merecia qualquer “censura institucional”, frisou.

Por outro lado, existe a questão de gâmetas e embriões que foram doados, que estão criopreservados, mas que, neste momento, não podem ser utilizados, porque é necessário obter “o consentimento expresso dos beneficiários e dos dadores de que, caso seja levantado o anonimato, não se opõem” ao processo, explicou.

Por “prudência”, contou, os centros têm contactado os dadores e os beneficiários com tratamentos agendados para perceberem e receberem o seu consentimento, mas “há dificuldades de contactar muitos dos dadores e há depois dificuldades que se prendem com a decisão dos dadores”, porque alguns não aceitam essa possibilidade.

“Também gostaríamos de saber qual o destino que vamos dar a estes gâmetas e a estes embriões”, disse, considerando que “seria trágico” num país como Portugal, que tem “uma carência tão grande de gâmetas doados” destruí-los.

Para a presidente do CNPMA, “o que está em causa é a continuidade em Portugal da procriação medicamente assistida com gâmetas”.

Com o alargamento das dádivas a casais do mesmo sexo e a carência de gâmetas que existe houve “um alargamento da lista de espera, houve um aumento da procura de gâmetas”, sendo que “neste momento é também a eficácia e o cumprimento desta lei que está posta em causa”.

Quanto à gestação de substituição, pediu aos deputados que “revisitem a lei e que a alterem da melhor forma que entenderem para acautelar aquelas que foram as preocupações do Tribunal Constitucional, mas que voltem a legislar” sobre este assunto, o que mereceu o aval dos deputados.

“É fundamental que se legisle e que não se empurrem os casais para situações menos transparentes, menos claras”, defendeu Carla Rodrigues.

Explicou ainda que o pedido de audição na Comissão de Saúde é “o culminar” de um “processo de sensibilização” que teve início com encontros com os grupos parlamentares, à exceção do PS, sobre “o impasse que se instalou na procriação medicamente assistida em Portugal com gâmetas doadas e com a gestação de substituição”.

“Nós viemos a esta comissão não para lamentar o acórdão”, concorde-se ou não, “respeitamos a sua decisão, queremos cumprir a lei, mas temos que saber que lei que temos que cumprir e é isso que neste momento não sabemos concretamente”, salientou.