Para Jaime Branco, o cenário de rotura do SNS não se deve à falta de médicos, mas ao “défice de gestão de recursos humanos e de oferta de condições às pessoas para trabalharem condignamente”. O candidato a bastonário deixa fortes críticas ao ministério da Saúde que “não preza a opinião e a colaboração dos médicos”.

HN- Da análise que faz dos 43 anos que já leva no Serviço Nacional de Saúde, considera que tem havido uma progressiva perda de liderança dos médicos nos serviços de saúde?

R- Não tenho a menor dúvida. E penso que houve uma perda de liderança não só dos serviços de saúde como uma perda de liderança clínica. Houve uma diluição da liderança médica, da profissão médica durante estes anos que é absolutamente notória. Para quem os viveu, como eu, é muito claro. Hoje há decisões, terapêuticas, por exemplo, que deixaram de pertencer ao médico e que pertencem a comissões de farmácia e a outras comissões clínicas que muitas vezes não têm uma opinião médica capacitada. Quando eu digo uma opinião médica capacitada não quer dizer que não haja médicos incluídos nesses grupos de trabalho, mas muitas vezes não são das áreas para as quais as terapêuticas são dirigidas. Isso é, claramente, uma perda de liderança e até de responsabilidade. Porque quando um doente escolhe um médico, ou tem uma relação depois com um médico (às vezes não escolhe, é o que lhe aparece numa primeira consulta e depois se mantém), o doente passa a confiar no médico, mas ao mesmo tempo responsabiliza-o. É uma base de confiança e de responsabilização. E a confiança pode-se manter exatamente na medida em que a responsabilização é possível, e é desta relação que é feita boa parte da relação médico-doente. Ora, a verdade é que os médicos têm sido apeados da capacidade de serem responsáveis perante muitas coisas em relação aos doentes, e isso é obviamente mau porque se alguém, mesmo numa equipa de trabalho, tem a visão global de todo o processo, é o médico. Isto não tem nada que ver com elitismos. Não é nada disso. É a nossa formação, é a forma como as coisas decorrem nos serviços de saúde.

O que é que aconteceu também foi que outras áreas de saber e outras aptidões foram entrando na saúde na medida em que os números, sem qualquer crítica porque é normal (as coisas têm que ter boas contas), os números foram-se sobrepondo ou pelo menos ficando ao mesmo nível da eficácia que os cuidados de saúde têm que ter, e sob esse ponto de vista foram-se destacando outras profissões como gestores, administradores, etc., que vinham de outras áreas e que foram ocupando espaço, alguns com grande sensibilidade – eu conheço muitos profissionais desses com grande sensibilidade –, mas outros sem sensibilidade nenhuma para aquilo que estão a fazer.

HN- Faz sentido que um conselho de administração que tem de decidir se um doente vai fazer ou não determinada terapêutica não tenha um médico?

R- O conselho de administração tem um diretor clínico, obrigatoriamente. E o diretor clínico, se não se sente capacitado para decidir sobre aquele doente específico, deve falar com o diretor do serviço a que o doente pertence. Teoricamente deve fazer assim, mas eu sei que isso nem sempre acontece, evidentemente. E também sei que, provavelmente, haverá conselhos de administração que decidem sem ouvir o diretor clínico. Têm poder para isso, um presidente de um conselho de administração, mas evidentemente que o desejável era que o diretor clínico fosse sempre ouvido. Mas também lhe digo que o próprio diretor clínico neste momento emana de uma escolha superior. Não significa com isto que os colegas que ocupam as direções clínicas não se empenhem da melhor forma e não deem o melhor de si às instituições que servem, com certeza o farão, mas a verdade é que não emanam de uma escolha dos seus pares.

HN- Mas já emanaram.

R- Já emanaram. Eu penso que provavelmente uma decisão mista podia ser útil. Isto é, de um conjunto de três ou cinco propostas do conselho de administração, os médicos escolherem uma delas.

HN- No anúncio da sua candidatura falou de uma necessária e urgente renovação da Ordem. O que é que está a falhar?

R- A Ordem é uma estrutura muito pesada.

HN- Quase 2000 mil dirigentes, não é?

R- Fui apoiante do Dr. Miguel Guimarães nas suas duas eleições e não estou arrependido. Mas a verdade é que a Ordem dos Médicos vai muito para além do bastonário. Começa logo por três poderosas secções regionais com estruturas pesadas e que no fundo são as responsáveis pela decisão em relação à formação e à disciplina, que são as principais atribuições da Ordem. E depois tem as sub-regiões. Acabou de me dizer que a Ordem tem cerca de 2000 dirigentes ou pelo menos pessoas, de entre médicos que se relacionam com a administração e com a vida da Ordem. Já não estou a falar de funcionários, que são centenas. Portanto, é uma máquina muito pesada. Sob o ponto de vista administrativo, sob o ponto de vista da gestão, sob o ponto de vista financeiro, eu penso que é necessária uma harmonização que torne mais ágeis as decisões, nomeadamente no que diz respeito à disciplina. Posso-lhe dizer, por exemplo, que hoje a litigância chegou também a Portugal, como a outros países, evidentemente, e foi exacerbada até, agora, provavelmente com a pandemia, por motivos de variadíssima ordem. Ora, nós temos, nos conselhos disciplinares, necessariamente, que separar a queixa da “queixinha”. Fazer um rastreio inicial do tipo de queixa. Porque as queixas não são, obviamente, todas iguais. O conselho de disciplina tem que responder rapidamente às queixas, e não às “queixinhas”. Provavelmente isto já existe, nem que seja parcialmente. Porque não sou só eu que vejo. Sem dúvida nenhuma que o número de queixas que hoje chegam à Ordem não só exigem um trabalho específico que é mais jurídico – os médicos não têm formação jurídica, portanto têm que estar acompanhados por juristas – e as condições em que isso é feito são, provavelmente, extralaborais, e depois a decisão, que é sempre do conselho nacional, muitas vezes pode ficar adiada por esse motivo.

HN- Há muita litigância neste momento?

R- Penso que sim; que houve um aumento significativo das queixas entradas na Ordem, em todas as regiões.

HN- Quais são as suas principais propostas para iniciar o novo ciclo e conseguir devolver aos médicos o protagonismo? Hoje nós assistimos a um total bloqueio comunicacional com a tutela. A Ordem dos Médicos foi recebida uma vez.

R- E ao fim de dois anos. Eu acho que isso é muito grave. Logo num momento em que devíamos ter cerrado fileiras e devíamos de facto ter trazido para ao pé de nós – e agora já estou a falar do Governo – aqueles que são os nossos aliados. E eu penso que a Ordem dos Médicos e provavelmente as outras ordens relacionadas com a saúde seriam aliadas do Governo no enfrentamento da pandemia. A Ordem teve uma estrutura central para a pandemia que nunca foi aproveitada, que de uma forma geral estava em desacordo com as decisões tomadas – às vezes estava de acordo, mas a maior parte das vezes esteve em desacordo – e teria sido melhor juntar esforços, que não seriam demais, para que os esforços governamentais e da Direção-Geral da Saúde, que foram imensos com certeza, tivessem melhores resultados. Mas o que aconteceu foi que a Ordem, ao fim de dois anos, foi recebida em conjunto com as outras ordens todas. Não tenho aqui nada contra as outras ordens, mas penso que as ordens deviam ter sido recebidas cada uma per si, como é lógico, porque cada uma pode oferecer coisas diferentes, primeiro que tudo, e em segundo lugar porque teriam mais tempo para falar com a senhora ministra. Porque se recebe sete ordens ao mesmo tempo numa reunião, cada uma só tem, na melhor das hipóteses, um sétimo do tempo dessa reunião, e penso que seria necessário, sobretudo ao fim de dois anos, falar de muita coisa.

HN- É que não há paralelo desde que me lembro de nenhum gabinete que reunisse tão pouco com os médicos.

R- É porque não preza a opinião da Ordem e dos Médicos. É a única explicação que eu vejo. Ou há canais que nós não conhecemos de conversação e de colaboração…

HN- Não é isso que nos chega.

R- É o que eu estou a dizer, que nós não conhecemos. E, portanto, acredito que não haja. Ou então é porque o ministério não preza a opinião e a colaboração dos médicos. É a única conclusão a que eu posso chegar.

Mas em relação à sua pergunta, o que eu penso é que, de facto, tem que haver uma maior liderança dos médicos, para melhor tratar as pessoas. Essa é a prioridade. E isso é obviamente multidisciplinar. Não só o ministério tem que encarar isto de uma forma definitiva e como uma necessidade, como os médicos per si também têm que procurar melhorar a sua capacidade de gestão. Não é por ser médico que deve ser líder. Deve ser líder porque é um líder e porque tem um melhor conhecimento do processo, e porque tem também aptidões para liderar. Por outro lado, nós temos hoje uma necessidade absoluta de pôr em comunicação o Serviço Nacional de Saúde com o setor privado de saúde. Por exemplo, em relação aos médicos é fundamental que haja uma revisão das carreiras médicas, mas uma revisão das carreiras médicas que englobe também o setor privado. O sistema tem que ser aligeirado, tem que dar uma resposta num prazo definido, seja ele qual for, tem que se definir um prazo para que os resultados estejam cá fora, e tem que se minimizar aquilo que são as pequenas diatribes, e pequenos aproveitamentos, e pequenos defeitos da lei, para os concursos serem contestados. Porque senão não vamos a lado nenhum. Mas esta não é uma necessidade só do Serviço Nacional de Saúde. É um problema também do setor privado. Talvez os colegas que estão no setor privado hoje não tenham esta opinião, mas eu prevejo que daqui a 10 anos este problema das carreiras também os irá afetar.

HN- Pensa que se vá sentir também?

R- Absolutamente. Porque, como é evidente, as condições que hoje são oferecidas aos médicos que trabalham exclusivamente no setor privado, e são mais de 6.000 médicos, trabalham só no setor privado, e já há sinais nesse sentido, daquilo que eu tenho ouvido, já se sabia, mas tenho ouvido sobretudo nestes últimos dois meses/dois meses e meio em que me tenho dedicado mais a estas tarefas, é que as condições oferecidas aos médicos começam de facto a ser de qualidade inferior àquelas que ocorriam no ano passado.

HN- Nós temos um problema grave no sistema de saúde que é uma falta crónica de acesso aos cuidados de saúde primários. Neste momento temos 1.3 milhões sem médico de família. Se se reformar a sua vaga geracional, quando se reformar, vamos ter 2.5 milhões. Será um verdadeiro colapso. Como é que se entende esta situação?

R- A minha leitura desta situação não passa por falar em falta de médicos. Se fizermos uma comparação aos números dos países OCDE, vemos que somos o segundo país com mais médicos, e o primeiro em formação por número de habitantes. Nem sei até se no próximo ano não seremos já o primeiro país em número de médicos por habitante. Não há falta de médicos, há é, evidentemente, um grande défice de gestão de recursos humanos, e de oferta de condições às pessoas para trabalharem condignamente. Quando falo em condições não estou a falar exclusivamente e maioritariamente de condições financeiras. Onde é que existe hoje uma maior falta de cobertura de médicos de família em relação a utentes? Lisboa e Vale do Tejo. Também um pouco no Algarve, mas especialmente em Lisboa e Vale do Tejo. Porquê? Porque é caríssimo viver em Lisboa. Neste momento está a começar a acontecer o mesmo na região do Porto, no Grande Porto, porque os preços do Porto também estão a disparar.

HN- Mas é interessante notar que a falta se nota mais em Lisboa, sendo que no Norte é onde se concentram o maior número das unidades de modelo B.

R- É verdade. Sabe porquê? Por causa das quotas. Não basta que uma USF de modelo A tenha as condições para passar a modelo B. Tem que ter as condições, mas depois só passa se cumprir a quota. Isto é, há muitas unidades USF A que podiam ser USF B, mas se por exemplo este ano só há 30 vagas, se eu tiver 70, há 40 que ficam de fora. E essa questão, que acontece de facto, tem penalizado mais o sul do que o norte, não sei por que motivos. Mas se calhar criaram melhores condições no norte. E evidentemente que o médico não é diferente das outras profissões, procura os sítios, as instituições e as oportunidades onde pode viver melhor.

As autarquias aqui podem ser muito importantes, como foram no passado em relação ao interior, onde não havia médicos e as autarquias fomentavam. Por exemplo, nos primeiros três anos, as pessoas tinham casa mais barata.

E tornar mais maleáveis os horários. Porque é que uma pessoa que quer só trabalhar 20 horas por semana, ou porque é mãe, ou porque é pai, ou porque está a fazer uma pós-graduação, ou porque tem outra profissão qualquer, é artista – quer dizer, não me interessa nada, desde que seja uma pessoa competente – não pode? Não consigo perceber esta rigidez. Espartilha a vontade das pessoas, e as pessoas acabam por ir para o privado, que obviamente aproveita as pessoas conforme aquilo que elas podem dar. Desde que lhes reconheça competência e capacidade de trabalho naquela área, se são 20 horas que quer dar, são 20 horas que recebe.

Outra coisa que eu faria, e que vou pugnar e defender, são os concursos sempre abertos. Porque é que em Lisboa há um concurso ou dois por ano? Porque é que as vagas não estão sempre abertas? Os serviços são capazes de ter explicação boa para isto, mas eu não estou a ver qual é. O respeito pelas pessoas, não é só o dinheiro, é a maleabilidade dos horários, é a possibilidade de eu concorrer quando entendo concorrer. Depois são as condições de trabalho. Eu gosto de trabalhar em sítios onde a minha informática trabalhe, onde a minha cadeira é confortável, com ar condicionado. Eu não posso estar todo suado a ver um doente, ou cheio de frio. Existem condições de trabalho que vão muito para além do ordenado e que também não são oferecidas neste momento às pessoas. Eu posso-lhe dar-lhe um exemplo que ocorreu no Hospital de São João. Já foi há algumas administrações atrás, não tem nada que ver com esta administração. Essa administração contratou uma empresa para saber, junto de todos os funcionários, o que é que os podia tornar mais felizes e os podia pôr a trabalhar melhor. Sabe qual foi a primeira necessidade identificada pelos médicos? Era terem uma farda diferenciadora da dos outros profissionais. A administração fez isso e os médicos ficaram satisfeitíssimos.

Outra coisa: os estacionamentos. Se uma pessoa não tem dinheiro para viver em Lisboa, se os transportes são como são, se vem de automóvel, deixa o carro onde? Não tem sítio onde deixar. E são coisas que podiam ser eventualmente resolvidas. Se se pensasse nelas. Se calhar o Hospital de São José, ou o Hospital dos Capuchos, onde eu, quando passo ali para ir para faculdade, vejo pessoas em fila para entrar às 7h30… Porque é que não há estacionamento no Miguel Lombarda, que está ali devoluto há uma data de anos? É não pensar nas pessoas, e não estou a falar só de médicos.

HN- Ensino. Tem-se vindo a anunciar sucessivamente a necessidade de mais escolas médicas e até a abertura de três novas escolas. Abriu recentemente uma privada. Há de facto falta de escolas médicas?

R- Eu acho que não há falta de escolas médicas. Já lhe expliquei há pouco que nós somos dos países da OCDE com mais médicos, e portanto não há faltas de escolas médicas. Nos países desenvolvidos o número de escolas médicas por habitantes deve ser uma para 2 milhões. É assim na Alemanha, é assim na França. E, portanto, seriam cinco em Portugal. Ora, nós, em Portugal, já temos nove. E portanto, não há falta de escolas médicas. Não é só dizer “eu tenho aqui uma nova escola médica”. Quem é que ensina? Quem é que está preparado para ensinar? Há aí montes de gente desempregada que é capaz de ensinar Medicina? Não há. Então vão buscá-los onde, em primeiro lugar. Depois onde é que põem os alunos a fazer a sua formação clínica? Os hospitais já têm lá alunos.

Uma outra questão, que gerou polémica recentemente: Médicos no desemprego. Já existem, porque quase todos os anos, salvo raras exceções as vagas de especialidade ficam aquém do número de concorrentes … Este ano prevê-se que haja 2.500 concorrentes para entrar no internato de especialidade e só 1.500 vagas. Isto é, estas pessoas ficam sem formação específica. E portanto, a questão é que depois os utentes não sabem quem são. E por mais dedicados e estudiosos que estes colegas sejam, a verdade é que, não tendo uma formação específica, não podem oferecer o mesmo tipo de cuidados que os outros oferecem. E isto acontece porquê? De novo, porque os serviços não têm capacidade para formar mais.

HN- Para além da falta de médicos que vamos ter, vamos ter falta de idoneidades formativas nos cuidados de saúde primários por reforma dos médicos.

R- Depois vêm dizer que os médicos não formam mais porque são isto e são aquilo e querem-se defender uns aos outros. Não é nada. Nós queremos é que a pessoa que nos substituir seja melhor que nós, para tratar bem os doentes. É só isto. É preciso que as pessoas entendam que as condições que preconizamos e defendemos ter e as condições de formação que nós procuramos que haja devem ser as melhores em favor dos doentes. A nossa preocupação, ou pelo menos a minha preocupação, já hoje, mas, se for eleito, evidentemente redobrada, é com os médicos, o meu compromisso é com os médicos, quem for eleito bastonário é com o voto dos médicos, mas é sobretudo com os doentes. De facto, o bom cuidado ao doente só pode ser feito por médicos que estejam satisfeitos com a prática da sua profissão.

HN- Caso seja eleito, o que é que sugere que seja feito para apoiar o número elevadíssimo de médicos em burnout?

R- Isso está especificamente no meu programa de ação, que ainda não é público, mas que conto apresentar em setembro (ainda está em redação). Aliás, em redação vai estar sempre. Vai estar sempre aberto a novas ideias.

Essa é uma questão grave. O burnout é, no fundo, o esgotamento (é a tradução para português). É mais frequente nos médicos do que na população em geral e está mais relacionado com o erro médico – lá está, sempre a preocupação com o doente –, está mais relacionado com a depressão, está mais relacionado com o suicídio. O que eu penso que deve ser feito é um diagnóstico o mais apurado possível em relação à generalidade das pessoas que quiserem responder. Nós não podemos obrigar os médicos, evidentemente, a responder a um questionário, mas este deve chegar à casa de todos os médicos, por via informática ou outra. Existem instrumentos que fazem facilmente o diagnóstico, até de autoavaliação.

Evidentemente que outra área que me importa muito é a agressividade nos serviços de saúde e as agressões de que os médicos têm sido vítimas. A legislação vai ter que mudar e sobretudo a dissuasão. E há também instrumentos que nos fazem prever quem é que se pode tornar agressivo no contexto de uma consulta, e se estes instrumentos fizerem parte do rastreamento dos utentes – não têm que ter aplicados por médicos, que evidentemente que já têm o tempo completamente ocupado com todas as atividades quer médicas quer administrativas de diluição de responsabilidade e de liderança – a verdade é que nos podem antecipar quais são os grupos de pessoas que podem ser mais agressivas em relação aos profissionais de saúde, sejam médicos, sejam outros.

HN- Uma última palavra.

R- Eu entendo de facto que a gestão dos hospitais deve estar quanto possível na mão dos médicos, porque têm outro tipo de sensibilidade em relação a esta gestão. No centro hospitalar onde eu trabalho, e vou completar 30 anos de serviço lá em novembro, só por talvez dois mandatos o conselho de administração não foi liderado por médicos. Tenho essa felicidade. E mais, mesmo quando o administrador não era médico, a personalidade dos diretores clínicos era tamanha, como no caso do Dr. Vasco Araújo, que realmente se impunha nas decisões que o conselho de administração tomava. Portanto, eu tive a felicidade, durante a maior parte da minha vida profissional, de viver num hospital e depois num centro hospitalar gerido por médicos e noto a diferença em relação àquilo que os meus colegas dizem. Isto é fundamental exatamente porque os médicos dominam melhor a realidade clínica, acompanham as equipas, os serviços e as necessidades dos recursos humanos que vão surgindo. Porque é que a direção clínica, juntamente com a direção de serviços, não pode abrir concursos rápidos para colmatar vagas nos serviços? Posso-lhe dizer que o meu serviço está carente de três médicos.

Veja o exemplo dos hospitais que são geridos por médicos. O Hospital de São João, por exemplo, é hoje um modelo, mas já foi anteriormente também dirigido por outro médico, o Prof. António Ferreira, e foi também considerado modelar na altura. E há muitos mais casos. Porquê? Exatamente pela maior sensibilidade, pelo melhor conhecimento dos processos, pelo melhor conhecimento global e até pela melhor preparação que nós temos.

Entrevista de HealthNews, pode aceder à revista aqui