Em declarações à Lusa, Gisélia Alcântara, primeira autora do estudo, publicado na revista Comparative Immunology, Microbiology and Infectious Diseases, revelou hoje que o mesmo surgiu da necessidade de conhecer “o comportamento dos veterinários portugueses na prescrição de antimicrobianos”.

Além de avaliarem o método de prescrição utilizado, os investigadores analisaram o que motivava a prescrição de antimicrobianos e as recomendações dadas aos tutores, uma vez que a resistência aos microbianos representa “uma ameaça crescente à saúde pública” e pode propagar-se entre animais, seres humanos e ambiente.

“O uso indevido e excessivo de antimicrobianos nos animais de companhia aumenta o risco de resistência antimicrobiana tanto nos animais como nos humanos, colocando em perigo a saúde e o bem-estar das pessoas e dos animais”, salientou Gisélia Alcântara.

O estudo, que teve por base um questionário realizado entre outubro de 2019 e janeiro de 2020, envolveu 417 veterinários portugueses.

“A maioria dos veterinários portugueses não usam protocolos para prescreverem antimicrobianos aos animais de companhia”, afirmou a investigadora, acrescentando que no estudo foram identificados dois tipos de veterinários: os que prescrevem segundo orientações do protocolo do local de trabalho e os que o fazem de forma empírica.

“A preferência pela prescrição empírica acontece porque 80% dos veterinários não têm um protocolo que oriente a prescrição no seu local de trabalho”, referiu Gisélia Alcântara, sublinhando que a prescrição é feita através da análise dos sintomas do animal e sem recurso a exame que comprove a necessidade de prescrever tais fármacos.

O estudo indica também que os veterinários que trabalham em hospitais usam com mais frequência o protocolo para a prescrição de antimicrobianos e têm uma “atitude mais prudente” na receita destes fármacos.

A par do método de prescrição, a investigação mostra ainda que a eficácia dos medicamentos e os tutores dos animais de companhia influenciam a prescrição destes antimicrobianos, com “59% dos veterinários a mencionarem que os tutores pedem antibióticos quando os animais vão à consulta”.

“Verificamos que a prescrição de antibióticos destinados ao uso humano é sobretudo motivada a pedido do tutor e não porque o veterinário acredita ser a melhor solução”, salientou a investigadora.

Face aos resultados obtidos, Gisélia Alcântara disse ser necessário que os veterinários tomem consciência do seu papel de divulgadores da resistência antimicrobiana e dos problemas associados a fim de reforçar as medidas higiénico-sanitárias durante o período em que o animal está a tomar o fármaco.

A par da sensibilização dos tutores, o estudo alerta para a urgência de em Portugal se criar um protocolo que oriente os médicos veterinários no momento da prescrição para ajudar os profissionais “a fazerem um uso mais adequado dos antimicrobianos”.

Ao reconhecer as necessidades dos veterinários, este protocolo, poderá guiá-los a “prescrever de forma mais prudente antibióticos que não tragam mais risco à resistência”.

À Lusa, Gisélia Alcântara afirmou que decorre agora a segunda parte do estudo, ainda por publicar, que mostra “quais os antibióticos de maior preferência dos veterinários portugueses” e se essa preferência “reflete risco para a saúde pública”.

“Nesta segunda parte, foi também feito um trabalho estatístico, onde dividimos os veterinários para compreender se as escolhas de antibióticos poderiam ser influenciadas por características sociodemográficas, como a idade, região ou local de trabalho”, acrescentou, salientando a importância deste segmento para que o trabalho seja “mais direcionado” aos veterinários.