A esmagadora maioria dos profissionais e investigadores do setor da saúde auscultados por um inquérito, incluindo médicos, enfermeiros e psicólogos, concorda que devem existir critérios éticos para a admissão de doentes com COVID-19 em unidades de cuidados intensivos, caso venha a ocorrer uma situação de escassez de recursos materiais e/ou humanos.

Este é um dos resultados preliminares de um inquérito realizado na Faculdade de Medicina da Universidade o Porto (FMUP) e no CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde, mas que será estendido a todas as Escolas Médicas nacionais, durante os próximos dias.

Coordenado por Rui Nunes, professor da FMUP e especialista em Bioética, e por Altamiro Costa-Pereira, diretor da FMUP, o estudo foi realizado em tempo recorde. O objetivo é dar resposta a uma série de perguntas que já foram colocadas noutros países, como Espanha e Itália, face à desproporção de doentes graves e muito graves com COVID-19 a necessitarem de cuidados intensivos face aos meios disponíveis para os tratar.

Dos mais de 350 profissionais e investigadores de saúde que responderam ao inquérito online, 91% consideram que, para além dos critérios clínicos, devem existir “critérios éticos universais, explícitos, transparentes e consensualizados para admissão em cuidados intensivos”. Apenas 6% não veem necessidade da sua existência e 3% não têm opinião sobre o tema.

Quase 90% dos inquiridos concorda também que a decisão deve ser partilhada entre a equipa de saúde, o doente e a família, no sentido de promover “uma comunicação franca e transparente”. Apenas 8% dizem que não e 3% não têm uma opinião formada.

Quanto aos critérios que deverão presidir à decisão de internar um determinado doente com COVID-19 em detrimento de outro, a grande maioria entende que a idade não deve ser decisiva. Feitas as contas, 93% dos profissionais concordam que a idade não pode ser considerada como o único elemento de decisão. Apenas 4% dos inquiridos acha que a idade serve para decidir quais os doentes prioritários, sendo que 3% confessam não ter opinião.

Cerca de 80% dos profissionais entendem que, face à impossibilidade de admitir em simultâneo todos os doentes com COVID-19, “deve valorizar-se a maximização da sobrevivência até à alta hospitalar”. O mesmo é dizer que a maioria dos profissionais admite que, se for necessário escolher, deve ser dada prioridade a doentes com mais hipóteses de sobreviverem. Apenas 7% discordam e 13% não têm opinião.

O consenso não é tão grande no que respeita a outro critério possível na priorização de doentes a admitir em cuidados intensivos: o número de anos salvados. Cerca de 66% dos profissionais entendem que se deve valorizar “a maximização do número de anos de vida salvados”, enquanto 18% dizem que não e 16% admitem não ter opinião.

As opiniões dividem-se ainda mais no que se refere à aplicação do chamado “princípio do custo de oportunidade”, evitando como regra absoluta o critério “primeiro a chegar primeiro a admitir”. Ao todo, 56% dos inquiridos respondem que sim, que se deve ter em conta o “custo de oportunidade”, o que implica que nem sempre a admissão deve ser feita por ordem de chegada. Porém, 27% discordam e 17% não têm opinião.

Neste inquérito, realizado entre os dias 6 e 11 de abril, 51% dos inquiridos são médicos, sendo que 73% têm menos de 50 anos de idade.