A Perturbação do Espectro Autista (PEA) é uma perturbação do neurodesenvolvimento, caracterizada por défice global grave em diversas áreas do desenvolvimento, designadamente, competências sociais e da comunicação, ou pela presença de comportamentos, interesses e atividades restritivos e repetitivos. Pessoas diagnosticadas com PEA apresentam comprometimento da atividade amorosa, social, laboral ou de outras áreas importantes das suas vidas.

A Perturbação de Asperger, em contraste com a Perturbação Autística (igualmente integrante na Perturbação do Espetro Autista), não apresenta atrasos clinicamente significativos na linguagem, no desenvolvimento cognitivo (inteligência) ou na capacidade de autoajuda adequada a cada idade. A capacidade de memorização e velocidade de raciocínio relacionados com atividades repetitivas e boas aptidões verbais, são, igualmente, características diferenciais deste quadro clínico.

De referir que o diagnóstico para a Perturbação de Asperger (tal como para a Perturbação Autística) foi extinto, tendo a nova entidade proposta assumido a designação de Perturbação do Espetro Autista. De acordo com os especialistas neste domínio, herda, basicamente, os mesmos critérios de diagnóstico anterior, razão pela qual a atual designação gera alguma discordância. Com base nesta ressalva e no pressuposto de que continua a representar maior familiaridade para muitas pessoas, esta perturbação clínica será referida neste texto como Perturbação de Asperger.

Dentro da Perturbação de Asperger há pessoas com capacidades cognitivas superiores à média, comparativamente com outras com a mesma condição clínica. Elon Musk, CEO da Tesla, ou a jovem ativista Greta Thunberg têm sido apontados como exemplos de figuras notáveis diagnosticadas com Perturbação de Asperger. Detentores de aptidões e talentos de elevada funcionalidade na realização de tarefas e atividades, os portadores desta perturbação podem mascarar os sintomas da doença e impedir, inclusive, a realização do respetivo diagnóstico.  Não será, portanto, de estranhar diagnósticos de Perturbação de Asperger em idade adulta.

Embora o diagnóstico não mude necessariamente o curso da doença, pode ser uma informação extremamente útil para o entendimento dos relacionamentos, da vida social, do contexto de trabalho e da comunicação terem sido tão desafiantes ao longo da vida. Mas também pode ser perturbador conhecer e aceitar a sua “nova” condição psiquiátrica e/ou decidir se deve contar ao parceiro, à família, ao chefe ou aos amigos.

Estas decisões devem caber ao próprio, com base na premissa que ofereça o maior bem-estar possível ao decisor. É natural que possa querer partilhar o diagnóstico com as pessoas mais próximas (como por exemplo, pais, parceiro[a] ou filhos[as]), com quem lhe mereça confiança, ou com qualquer outra pessoa que entenda querer dar conhecimento.

A experiência da partilha pode ser muito gratificante, de fortalecimento relacional e geradora de maior suporte familiar e/ou social, assim como da implementação de um ambiente estruturado. Falar da condição psiquiátrica perante um interlocutor, capaz de escutar e compreender, pode traduzir-se numa excelente catarse psíquica, facilitando estados emocionais mais positivos, motivadores e empreendedores. Igualmente válida, por necessidade ou utilidade, será a decisão de dar conhecimento a chefias ou colegas, no âmbito do contexto profissional, identificando, assim, a causa de dificuldades enfrentadas e, tantas vezes, incompreendidas por terceiros e, mesmo, pelo próprio.

Conhecedor da sua própria experiência, a pessoa com Perturbação de Asperger pode entender as suas dificuldades como perfeitamente legítimas, com ou sem o reconhecimento de terceiros. De modo geral, conta-se com o apoio e compreensão do(a) parceiro(a), familiares, amigos e professores, entre demais pessoas com quem possa relacionar-se.

Acima de tudo, é importante que o doente com Perturbação de Asperger (ou com qualquer outra Perturbação do Espectro do Autismo) sinta que não está obrigado a expor-se, contando aos outros, independentemente de quem se trate, ou que pode adiar o momento até que se sinta preparado para o fazer.

Perante o diagnóstico de doença mental é compreensível que precise de tempo para si próprio para processar, integrar e aceitar o que o profissional de saúde lhe transmitiu.

Decidir o que fazer, quais os destinatários ou em que circunstâncias envolve ponderar sobre os prós e os contras e o que considera ser a melhor escolha. Decidir o que fazer é ter a liberdade para contar… Ou para nada dizer.

Um artigo da psicóloga clínica Lina Raimundo, da MIND | Psicologia Clínica e Forense.