Tivemos no passado domingo um enorme feito para a nossa Nação que passou ao lado de várias pessoas. A conquista do primeiro Mundial de Futsal FIFA por parte da Seleção Portuguesa (isto após a conquista do Europeu há dois anos).

O que também passa ao lado frequentemente, é o que está envolvido para que tal se suceda, sem contar com o talento, com as capacidades físicas, e com as fantásticas qualidades técnico-táticas de uma equipa deste calibre.

E é sobre esses elementos de trabalho, particularmente a nível psicológico, que se debruçará esta crónica, assumindo esta um cariz mais especulatório.

O que certamente não “passa ao lado” na equipa das Quinas, são os passes para o lado que frequentemente executam e conduzem a equipa a belíssimos golos. Passando o pequeno trocadilho em jeito de brincadeira, de facto, o Futsal tem maravilhas desportivas que importam ser mencionadas primeiro para que, porventura, suscitem alguma admiração e interesse a quem não conheça ou não ligue à modalidade. Vou brevemente enumerar 3.

Foco tremendo (cada segundo conta!)

É um desporto de equipa, disputado num espaço pequeno e a um ritmo muito rápido. Tem constantemente muita coisa a acontecer. Consiste em duas partes de 20 minutos mas em que o relógio pára quando a bola está fora (ou quando é pedida pausa técnica para ajustes táticos e estratégicos). E mesmo nesses momentos os jogadores devem manter as suas capacidades atencionais em alta, de modo a não falharem marcações e leituras de lances dos adversários e colegas, que possam levar ao golo. Uma jogada pode fazer-se em 2 segundos, pelo que nunca se deve dar um lance como perdido ou ganho.

Disponibilidade Física

No seguimento do ponto anterior, o ritmo alucinante que o jogo tem, implica que cada jogador esteja constantemente ocupado com uma ou mais funções. Isto é bastante exigente a nível mental e físico. Duelos físicos, sprints, remates e bloqueios, só para enumerar alguns, são momentos que surgem a qualquer momento e que exigem muita entrega dos atletas. É de recordar que devido a isso, as substituições são volantes e infinitas entre jogadores.

Capacidade Decisional

Decorrendo dos anteriores, entende-se que cada segundo pode estar repleto de tomadas de decisões. Rematar? Passar? Conter na pressão exercida sobre o portador da bola ou arriscar o corte? Interceptar? Mover para aqui ou para ali? É extenuante. Cabe ao atleta estar totalmente envolvido no jogo, ter um conhecimento sólido do mesmo, das táticas, e dos adversários, para que as decisões sejam tomadas com a melhor sensatez e estratégia possíveis.

Isto tudo, e mais descrições sobre a modalidade que podiam merecer mais umas extensas linhas, sustêm-se bastante, lá está, nas capacidades e habilidades mentais dos atletas.

Posto isto, embora todas as outras modalidades desportivas requeiram também grande foco naquilo que está a acontecer, existem sempre alguns momentos “mortos”*. E o Futsal demonstra-se como um exemplo supremo desta necessidade solene em ter os atletas em sintonia e concentrados no momento presente.

E é aqui que importa realçar que o mínimo deslize atencional pode significar um golo sofrido. Torna-se ainda mais “perigoso” o atleta estar com a sua mente em algum acontecimento do passado ou preocupado com algum outro no futuro. Importa “não dar ouvidos” ao que já NÃO faz parte do lance actual, nem a constrangimentos internos que prejudiquem o desejado rendimento óptimo pessoal e da equipa, importa sim focar naquilo que mais importa “Agora” sobre o jogo.

A propósito, lembro a sugestão que recebemos do Dr. Eddie O’Connor (Psicólogo Clínico e do Desporto, especialista na ajuda em ultrapassar obstáculos para uma performance óptima) em entrevista para a “EWS - Efficiently Work Sport” sobre perguntarmo-nos, como Atletas, “W-I-N to win?” (“What’s Important Now to win?”) - sendo que esta “win” pode ter múltiplas definições (ouvir aqui a ideia).

Voltando à Seleção Portuguesa. Notou-se que muito disto manteve-se presente aquando de todas as suas exibições. Recordo alguns momentos críticos que podiam levar a alguma destabilização, e a um deixar que o adversário se superiorizasse no jogo. Links oficiais para osHighlightsda Meia-final e da Final no fim do texto.

Momentos estes que refletem lances infortuitos e que muitas vezes abalam os jogadores que os sofrem.

O primeiro golo do Cazaquistão, nas meias, que faz 1-1 na partida, teve o nosso João Matos a colocar-se bem e a defender bem a zona para cortar a bola que seria encostada pelo adversário para a baliza. Por algum motivo, e por uma margem de meros milímetros, a bola não é aliviada, e assim o adversário marca o golo.

O segundo golo, que os deixa em vantagem (1-2), foi um remate de longe que passa a milímetros do nosso jogador na barreira, e passa da única forma possível por entre as pernas do nosso GR ‘Bebé’. Lances em que foi muitíssimo importante a equipa limpar o seu impacto emocional o máximo possível para que não prejudicasse a performance, e seguirem fortes na busca pela recuperação do resultado. Algo que felizmente aconteceu, fechando a vitória nos penáltis.

Algo que se verificou nestas circunstâncias adversas, e que custa a sua execução a nível mental, é o acreditar que é possível. O despertar da Raça. A manutenção de algum equilíbrio interno. Uma neutralidade face aos eventos, e a alocação do foco e recursos técnicos naquilo que interessa. Recordo aqui um outro exemplo exímio disto neste trecho - o Treinador foca-se principalmente no Processo, não se envolvendo/preocupando propriamente com o Resultado.

No fundo, quando o máximo esforço é assegurado, e a manifestação dos melhores processos que podem levar ao sucesso são assegurados... por que não focar absolutamente nisso?

É de louvar a confiança robusta do grupo, a entreajuda, a entrega em cada pedaço de lance (mesmo quando a bola está longe do raio de ação!), e a sua visível fome de vencer e de defender impecavelmente (pegando e acrescentando ao slogan recente de apoio à Seleção de Futebol).

Já a Final, representou tudo o que se pode exultar de ideais a este nível de uma equipa vencedora.

Houve lances de sorte para Portugal nestes dois jogos (como 3 bolas no poste por parte do Cazaquistão, e 2 bolas ao poste - uma delas a 3segundos do fim! - e um falhanço de baliza aberta a 1m da baliza por parte dos Argentinos na final).

Bem, este tipo de coisas “fazem parte”, como muitos costumam dizer (numa óptica de aceitação ou de preparação para as mesmas). Contudo, estar de facto bem preparado, e saber lidar eficazmente e eficientemente durante os momentos mais tremidos da prática desportiva de competição requer bastante a nível mental e de regulação emocional por parte de cada Atleta, de modo a contribuir com o seu melhor rendimento possível, e contribuir o melhor possível para a equipa.

Este trabalho consegue-se tanto melhor, quanto melhor for a qualidade de vida e Saúde Mental dos Atletas, bem como a qualidade grupal da equipa (ajuda dos colegas e Treinadores num trabalho cooperativo).

Muitas vezes é difícil saber como concretizar tantas destas coisas aqui expressas. Incentivos motivacionais, moralistas, e manifestações de apoio por vezes não chegam para que o Atleta supere as suas dificuldades e torne o seu desempenho mais consistente a um nível alto de competição.

É por isso que na descoberta dos fatores que possam estar a prejudicar/bloquear uma performance óptima, e dos factores que possam facilitar/desbloquear uma performance óptima, o Psicólogo do Desporto (ou Clínico) pode ajudar. O PIN - Em Todas as Fases da Vida começa a receber pessoas nestas áreas, de modo a expandir a ajuda que pretende dar aos utentes, de forma personalizada e especializada.

Da nossa parte, no PIN, deixamos os nossos exultados parabéns a toda a Comitiva da Seleção Nacional que os levou a esta soberba conquista, e agradecemos o que de bom e bonito há para mostrar a partir do Desporto, da união, do sacrifício e disciplina, e tantos outros valores que transmitiram nesta jornada heróica.

Texto: Gonçalo Marques, Psicólogo Clínico