HealthNews (HN)- Avizinham-se reformas estruturais no funcionamento e organização da Saúde em Portugal. É “Tempo para Agir”?

Ana Escoval (AE)- Sim. Há muitas mudanças que são necessárias e urgentes. Temos um novo enquadramento geral – com a nova Direção Executiva – e, no nosso entender, as mudanças orgânicas do Ministério da Saúde vão implicar uma restruturação das organizações.

HN- Reforçando assim a importância deste congresso…

AE- Este tipo de eventos não vem trazer as soluções, mas sim vem obrigar a uma reflexão sobre temas de grande pertinência. Ao juntarmos pessoas com pensamentos mais “académicos” e pessoas com visões mais técnicas e políticas iremos promover uma discussão aprofundada sobre a Saúde e organização dos cuidados em Portugal.

É preciso evitar que as pessoas quando adoeçam sintam medo de recorrer às unidades de saúde.

HN- Quando diz “medo” está a referir-se à possibilidade de verem encerrados alguns serviços de prestação de cuidados?

AE- O que eu acho é que a mensagem que passa, por vezes, é muito desconexa. Aquilo que circula nas redes sociais e na comunicação social faz com que as pessoas sintam medo… Sabemos que os recursos são finitos e, portanto, é preciso ter muito cuidado partimos do princípio que podemos ter tudo a qualquer preço. Pelo contrário, devemos ter um sistema que responda de forma adequada, e com qualidade, às necessidades dos doentes. É preciso que haja um bom nível de referenciação e que as pessoas saibam onde se devem dirigir. Acho que isso é que é importante… Mais do que começarmos a falar sobre o encerramento dos serviços.

É preciso que estas organizações tenham tempo para poder definir e reorganizar aquilo que é sistema de saúde – uma boa rede de referenciação.

HN- A necessidade de maior investimento no setor da saúde é um dos temas em destaque do programa. O reforço previsto no Orçamento de Estado para 2023 é suficiente para responder às necessidades dos doentes e dos hospitais?

AE- Se não tivermos foco e estratégia os orçamentos podem duplicar ou, até, triplicar e nunca serão suficientes. É importante que o cidadão seja colocado no centro das decisões. Uma das áreas que me preocupa é aumentarmos a literacia e a competência dos doentes e dos cuidadores para poder participar nesses processos. Todos seremos poucos para podermos alinhar as necessidades e os recursos disponíveis.

HN- O capital humano é um outro tema que não foi esquecido pela APDH. O que é preciso ser feito para pôr fim à falta de profissionais de saúde nas unidades hospitalares?

AE- É preciso acarinhar os profissionais de saúde. É preciso que sejam considerados no sistema e que sejam adequadamente pagos de acordo com o seu esforço, disponibilidade e desempenho. A falta de profissionais assenta no facto de não termos conseguido motivá-los, reconhecer as suas competências, as suas carreiras e colocá-los como elementos fundamentais para o nosso SNS.

HN- E sobre a discussão da “Descentralização de Competências na Saúde”, a maior autonomia prevista para os hospitais, com o novo Estatuto do SNS, não é um sinal “descentralização”?

AE- A autonomia dos hospitais é uma realidade que está escrita na lei há décadas, falta é que seja concretizada. Não podemos dizer que os hospitais vão ter mais autonomia se depois, por exemplo, para gerir os recursos humanos são obrigados a aguardar tempo sem fim por uma autorização do ministério. Portanto, não interessa que tenhamos escrito que vamos ter mais autonomia, o que é preciso é que essa autonomia se concretize.

HN- O congresso irá juntar peritos e profissionais das mais diversas áreas. Qual a mensagem que esperam transmitir e quais as reflexões esperam ser tidas em contas por parte dos “comandantes” da Saúde em Portugal?

AE- As conclusões são sempre colocadas à disposição dos órgãos decisores. Convidamos esses elementos, quer a ACSS e o ministro da Saúde, para estarem connosco em momentos que consideramos importantes. Esperamos que estes debates contribuam para definir uma estratégia concertada.

Entrevista de Vaishaly Camões