Em entrevista à agência Lusa, Graça Freitas explicou que há, de facto, uma sobremortalidade este ano, mas diz que os valores “têm de ser cuidadosamente estudados” e que o processo “é muito mais complexo do que se pensa”.

“Daqui a uns meses nós saberemos. Primeiro teremos que cobrir um espetro grande no número de causas… não serve observar apenas um mês, pois pode ter havido fenómenos atípicos (…). Normalmente fazemos um ano inteiro civil e com desencontro de um ano”, afirmou.

Os últimos dados divulgados pelo INE indicam que, desde a chegada da pandemia a Portugal (inicio de março) até dia 18 de outubro morreram 72.519 pessoas, mais 7.396 mortes do que a média do período homólogo dos cinco anos anteriores, sendo a covid-19 responsável por 2.198 óbitos, ou seja, 27,5% do total do aumento da mortalidade.

Graça Freitas reconhece esse aumento do número de mortes este ano, mas sublinha que a mortalidade tem duas dimensões – a numérica e as causas de morte – e acrescenta que a Direção Geral da Saúde (DGS) está “a fazer essas análises preliminares, com sistemas semiautomáticos de codificação, com codificadoras que estão desviadas para fazerem essa avaliação”.

“São avaliações muito preliminares, muito pouco consolidadas e não nos sentimos à vontade para as divulgar. São apenas pistas, indicações para podermos aprofundar o conhecimento”, acrescentou.

A responsável lembra que o processo “é demorado, requer pessoas muito treinadas” que por vezes “têm de confirmar junto dos médicos a sequência dos acontecimentos que levaram à morte”.

“É um processo sofisticado e complexo. Neste momento temos apenas pistas e indicações que nos levam a aprofundar determinados aspetos. Só saberemos exatamente o que aconteceu no ano de 2020 daqui a uns meses, quando todo o ano de 2020 tiver sido estudado em termos de causas de morte… coisa diferente são os números e a média”.

No mês passado, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) veio dizer que a suspensão dos cuidados de saúde presenciais por causa da covid-19 durou tempo demais e que a demora no reagendamento pode trazer consequências importantes na saúde da população, lembrando o excesso de mortalidade registado sobretudo em março e abril.

Num documento de reflexão em que analisa a resposta de Portugal à pandemia de covid-19, este órgão consultivo do Governo apontou o excesso de mortalidade registado em março e abril, sobretudo associado a pessoas com idade superior a 65 anos, sublinhando que “é três a cinco vezes superior ao explicado pelas mortes por covid-19 reportadas oficialmente”.

“Pressente-se assim que muitas pessoas com doenças agudas ou crónicas graves possam não ter procurado o sistema de saúde por receio de serem contaminadas, ou não terem encontrado nele as respostas necessárias”, afirmou o CNS, defendendo que a suspensão dos cuidados de saúde se justificava numa fase inicial de alarme, mas manteve-se “injustificadamente durante vários meses”.