“Quando vamos a casa das pessoas, às vezes [o que as preocupa] já nem é o facto de estar positivo, nem ter o vírus incomoda, mas sim o medo e o receio das repercussões da doença no futuro dos conviventes e das pessoas de quem gostamos”, disse a profissional de saúde à agência Lusa, que acompanhou uma visita da equipa.

Rita Costa, especialista em saúde mental, integra em Almada uma das equipas multidisciplinares criadas pela Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT) para combater a COVID-19 na região.

“Todas as semanas chega-nos uma lista com as pessoas potencialmente infetadas e há um trabalho prévio de planeamento e organização, para perceber em que fase e em que percurso da doença é que se encontram e depois preparar a visita, no sentido de pensar quem beneficia e precisa dela”, explicou.

A enfermeira falava à Lusa antes de partir para este trabalho, que acontece uma vez por semana em Almada, para “perceber como é que está a acontecer o isolamento, como é que as pessoas estão a viver o processo, se têm sintomas ou se já fizeram teste de cura”.

Foi uma manhã de visitas tranquila em que a equipa se focou na freguesia da Charneca de Caparica e Sobreda, avisando da chegada apenas minutos antes por contacto telefónico.

Ao aperceberem-se da presença da Lusa, vários utentes demonstraram constrangimento e optaram por não falar nem revelar a sua identidade, mas um homem de 40 anos, que está em isolamento desde 07 de agosto, aceitou contar como tem sido o processo.

“Graças a Deus estou bem, foi tranquilo, foi leve. Tive os cuidados iniciais, procurei logo o Serviço Nacional de Saúde (SNS), fui ao médico e identifiquei logo no início, não tive nada mais sério, só mesmo dor no corpo”, adiantou.

O utente vive com a mulher, pelo que a enfermeira teve que questionar sobre o distanciamento, mas o homem não hesitou em indicar que ficam em ambientes “separados” e que não prescindem da utilização de máscara.

Além disso, explicou que a doença não mudou muito as suas rotinas, porque continua a trabalhar em ‘home office’ e “já fazia compras ‘online'”.

Pelo contrário, uma jovem de 14 anos, em confinamento desde 29 de julho, revelou que tem sido uma fase difícil, porque tem de ficar sempre no quarto a ver televisão ou no telemóvel, não pode frequentar a mesma divisão que os pais nem aproveitar as férias.

“Costumava estar sempre com a família e depois de repente tenho que ficar fechada num quarto, ainda para mais numa altura em que íamos todos de férias, íamos estar com os avós na terra e tudo isso”, lamentou.

Devido a estas circunstâncias em que surgem desânimos e anseios, além da verificação das condições, a enfermeira explicou que é muito importante “tranquilizar as pessoas”, até porque o medo de contagiar amigos e familiares “tem sido uma nota que as preocupa”.

“Recordo numa das primeiras visitas que fiz, uma senhora jovem na casa dos 30 anos, positiva, estava particularmente com receios face ao contacto que tinha tido com a mãe e a possibilidade de a ter infetado”, relatou.

Este tipo de visitas ao domicílio já não é uma novidade para Rita Costa, que já o fazia por outras questões de saúde, mas, no caso da COVID-19, assumiu que “é um desafio suplementar porque requer toda uma panóplia de cuidados e recursos a que não estavam habituados”.

“Tenho ideia de que as pessoas gostam de receber a nossa visita, mas o fator desestabilizador são os Equipamentos de Proteção Individual (EPI). Naturalmente que é constrangedor ou parece constrangedor para algumas famílias. Às vezes equipamo-nos na rua, à porta de casa das pessoas e, de alguma forma, isto atenta sempre um bocadinho contra a intimidade e privacidade”, apontou.

As visitas deste dia foram positivas neste sentido, porque a equipa não encontrou motivos para vestir o EPI, nem de averiguar o interior das habitações, uma vez que foi possível perceber pelo exterior a existência de boas condições, de um contexto socioeconómico favorável e também tendo em conta o conhecimento demonstrado sobre a necessidade de isolamento social.

Ainda assim, a enfermeira Rita Costa esteve sempre disponível para esclarecer qualquer dúvida e informar que a Câmara Municipal de Almada dispõe de vários mecanismos para apoiar os utentes infetados, como entrega de compras, alimentação ou medicamentos.

A ARSLVT tem equipas nos concelhos da Amadora, Lisboa, Loures, Odivelas, Sintra, Almada, Seixal, Barreiro, Moita e Setúbal, tendo contactado com mais de 10.300 pessoas entre 30 de junho e 25 de agosto.