Um equipa de neurologistas do Reino Unido divulgou esta quarta-feira detalhes sobre um conjunto de 43 pacientes com COVID-19 cujas complicações variaram de inflamação e delírio cerebral a lesões nervosas e acidentes vasculares cerebrais (AVC). Em alguns casos, o problema neurológico foi o primeiro e principal sintoma do paciente.

Publicado na revista Brain, a equipa identificou uma condição inflamatória rara e às vezes fatal, conhecida como encefalomielite disseminada aguda (ADEM), cuja prevalência parece estar a aumentar por causa da pandemia. Alguns pacientes do estudo não apresentaram sintomas respiratórios graves decorrentes da COVID-19, os sinais mais comuns desta doença respiratória.

"Identificámos um número maior do que o esperado de pessoas com condições neurológicas, como inflamação no cérebro, que nem sempre se correlacionam com a gravidade dos sintomas respiratórios", comentou um dos autores, o médico Michael Zandi, do Hospital Nacional de Neurologia e Neurocirurgia (UCLH) Queen Square da Universidade College Londres.

"Devemos estar atentos e atentar para essas complicações em pessoas que tiveram a COVID-19. Ainda não se sabe se veremos uma epidemia em larga escala de danos cerebrais ligada à pandemia - talvez semelhante ao surto de encefalite letárgica nas décadas de 1920 e 1930 após a pandemia de influenza de 1918", comentou numa nota da universidade.

O estudo fornece um relato detalhado de sintomas neurológicos em 43 pessoas, entre os 16 e 85 anos, tratadas no UCLH e com infeção pelo vírus causador da COVID-19. Os investigadores identificaram 10 casos de encefalopatias transitórias (disfunção cerebral temporária) com delirium. Houve também 12 casos de inflamação no cérebro (nove destes com ADEM), oito casos de AVC e oito de lesões nervosas associadas à síndrome de Guillain-Barré.

A equipa em causa adianta que normalmente atende cerca de um paciente adulto com ADEM por mês, mas esse número aumentou para pelo menos um por semana durante o período do estudo.

O vírus causador da COVID-19, o SARS-CoV-2, não foi detetado no líquido cefalorraquidiano de nenhum dos pacientes testados, sugerindo que o vírus não atacou diretamente o cérebro para causar a doença neurológica. Em alguns pacientes, os cientistas encontraram evidências de que a inflamação cerebral provavelmente foi causada por uma resposta imune à doença, sugerindo que algumas complicações neurológicas do COVID-19 podem vir da resposta imunitária e não do próprio vírus.

A pandemia de COVID-19 já provocou mais de 539 mil mortos e infetou mais de 11,69 milhões de pessoas em 196 países e territórios, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP.

Em Portugal, morreram 1.629 pessoas das 44.416 confirmadas como infetadas, de acordo com o boletim mais recente da Direção-Geral da Saúde.

A doença é transmitida por um novo coronavírus detetado no final de dezembro, em Wuhan, uma cidade do centro da China.

Depois de a Europa ter sucedido à China como centro da pandemia em fevereiro, o continente americano é agora o que tem mais casos confirmados e mais mortes.