Crítica da ideia de os bebés ficarem em casa por tempos prolongados, a psicóloga clínica Isabel Leal é uma defensora dos recursos sociais como as creches, infantários, escolas, família, amigos.

O pai e a mãe têm uma adaptação à vida de pais com ritmos distintos?

Sim. Há diferenças de género e há diferenças individuais. E há outras diferenças que têm a ver com determinada fase da vida, com o facto de se ter um primeiro ou um segundo filho, e com o próprio temperamento do bebé. Há bebés mais calmos e há bebés que choram de duas em duas horas, portanto a personalidade dos pais, as expectativas, tudo isso tem a ver com a fase de adaptação.

Porque diferem os ritmos de adaptação do pai e da mãe?

A grande diferença é que a maior parte das mulheres na altura em que o bebé nasce já estão muito conscientes do bebé porque sentiram os movimentos e apaixonaram-se pela ideia, ao passo que muitos homens têm o primeiro momento só quando conhecem o bebé. Mas também é verdade que já há homens que ficam muito «grávidos». De facto, ser homem e ser mulher não representa diferenças tão grandes como gostamos de pensar.

As mães passam geralmente mais tempo com as crianças após o nascimento. É outro fator que influencia a forma como os pais se adaptam ao bebé?

Há todo um trajeto que vem a seguir ao nascimento modelado por tempos sociais. Continua o hábito dos bebés serem das mães, portanto a transição é muito mais forte para as mulheres que ficam em casa com o bebé. Mas acho que esse tempo não é um tempo da mãe nem do pai, mas do bebé.

Que mudanças surgem nos pais a seguir ao nascimento?

Obviamente que continuamos a ser filhos toda a vida, mas ficamos recolocados num outro plano porque começamos a ser pais. É uma enorme responsabilidade do ponto de vista social, e do ponto de vista simbólico há uma modificação no sentido de passagem de geração.

Que conselhos práticos poderão ser dados na reorganização de uma nova dinâmica familiar?

O amor na espécie humana nasce com os cuidados, portanto o primeiro conselho prático pode ser: repartam todo o tempo e todos os cuidados de maneira a serem pais presentes. Defendo que a parentalidade tem de ser partilhada em todos os momentos, embora ainda se privilegie muito a mulher no papel de mãe. Cada vez mais temos de ter uma perspetiva da parentalidade que ajude não só as mulheres, mas também os homens a perceber que os filhos são de ambos.

Em sua opinião, os bebés não devem ficar muito tempo em casa?

Sou uma defensora incondicional dos recursos sociais, tais como as creches e os infantários. Os bebés devem sair, ter contacto com o que os rodeia, porque há uma imunidade física e psicológica aos estímulos. Se colocarmos as crianças numa redoma, pagamos a fatura mais tarde.

Como devem os pais reconstruir a relação e a privacidade a dois após o nascimento?

Do mesmo modo que há a tendência de o trabalho retirar espaço às dimensões pessoais, familiares e conjugais, a entrada de um bebé tende a retirar o espaço de conjugalidade. Os casais passam a ser parceiros de tarefas. Obviamente que passar a ter um filho implica alterações de vida, agora não me parece que seja tão drásticas como algumas pessoas acham. Ter filhos não substitui as relações conjugais!

Mas em muitos casos os bebés retiram muito tempo e espaço às relações conjugais. Porquê?

Algumas pessoas ficam de tal modo centradas naquela tarefa parental, que se esquecem que são um casal. É vulgar encontrarmos pessoas que têm filhos com três anos que nunca tiveram um fim de semana a dois, e que levam o filho para todo o lado.

A que alternativas podem os pais recorrer?

É aí que entram os recursos sociais, que podem igualmente ser os avós, que não têm de estar disponíveis diariamente para ficar com os bebés, mas que de vez em quando gostam de o fazer, o que é importante para os miúdos não ficarem isolados. É muito importante criar redes.

Texto: Ana Margarida Marques

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