O reinado da rainha Vitória, conhecido por ser um dos mais longos da história britânica, foi uma época de transformações a nível social, político e económico. Foi durante a era vitoriana que apareceu a imprensa ilustrada e a fotografia e quando nasceram muitas das tradições que atualmente continuam a ser seguidas nos casamentos reais.

O casamento de Victoria e Albert, realizado no Palácio de St. James, marcou um ponto de viragem quer para a monarquia, quer para os casamentos. "Todas as pessoas aqui presentes [no dia do enlace] tornaram-se numa peça desta nova máquina, desta máquina de casamentos reais que se vai impor como regra nos próximos séculos. […] E também vai afetar o futuro dos milhares de casamentos que estavam para vir", explicou a historiadora Lucy Worsley à BBC.

A popularização do vestido branco

A rainha Vitória foi responsável por lançar uma moda que, até aos dias de hoje, é seguida por praticamente todas as noivas: a moda do vestido branco.

"O casamento foi tão revolucionário que atualmente ainda sentimos os seus efeitos. Todos os vestidos de casamento modernos descendem daquela que foi usado pela rainha Vitória. Ela foi a primeira a popularizar o branco para as noivas", diz a historiadora e curadora da instituição Historic Royal Palaces, Lucy Worsley, no documentário ‘Victoria & Albert: The Royal Wedding’ que, com a ajuda de diversos especialistas, explora e recria o casamento daquela que se tornou Imperatriz da Índia.

De acordo com Worsley, o esperado seria que no grande dia a monarca apostasse num vestido de cor dourada e num modelo algo elaborado. Em vez disso, a seda e a renda branca foram os materiais escolhidos para subir ao altar, cuja cerimónia teve lugar no dia 10 de abril de 1840.

"Esta foi uma boa escolha estética. Porque Vitória está vestida de um branco imaculado e virginal. Não havia nada limpo e branco em Inglaterra durante 1840. Esse vestido deve ter ficado gravado na retina", adianta o historiador Matthew Sweet no documentário da BBC Two.

O apoio à indústria britânica

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créditos: AFP PHOTO / ODD ANDERSEN

Para além de ter inovado em termos de cor, o mesmo se verificou nos materiais escolhidos para a confeção do vestido e véu de casamento. Apesar de naquela altura estar na moda a renda de Bruxelas, Vitória decidiu apostar num produto nacional. A escolha recaiu sobre a Honiton, um tipo de renda de bilros.

De acordo com o site oficial Royal Collection Trust, a escolha foi propositada, sendo uma forma de “reavivar a debilitada indústria da renda em Honiton, [no condado de] Devon”. Independentemente dos modelos dos vestidos, a verdade é que este tipo de renda acabou por se tornar muito popular entre as noivas vitorianas e futuras noivas reais.

Este apoio à indústria nacional foi-se verificando geração após geração. Para além dos materiais escolhidos, isto foi algo que se fez sentir nos estilistas escolhidos pela Casa Real para desenhar o vestido de casamento. Tirando Meghan Markle, o vestido da rainha Isabel II (Sir Norman Hartnell), de Diana Spencer (David e Elizabeth Emanuel), de Sophie Rhys-Jones (Samantha Shaw), de Camilla Parker-Bowles (Robinson Valentine), de Kate Middleton (Alexander McQueen) e da Princesa Eugenie (Peter Pilotto and Christopher De Vos.) foram todos feitos por designers britânicos.

Segundo o site da Família Real, a incorporação de símbolos reais e patrióticos foi outra das práticas adotadas por diversas noivas reais ao longo dos séculos. Por exemplo, a princesa Vitória – filha mais velha da rainha Vitória que subiu ao altar em 1858 – adicionou os emblemas de Inglaterra, Irlanda e Escócia ao seu vestido de noiva. A sua irmã, a princesa Alexandra da Dinamarca, optou por enfeitar a peça com rosas, trevos ou cardos. Já Meghan Markle adicionou a flor típica de cada um dos 53 países da Commonwealth ao véu de casamento.

As fotografias de casamento oficiais

A fotografia foi uma das grandes invenções do século XIX. A descoberta deste meio de divulgação veio permitir que se abandonassem as habituais pinturas e ilustrações feitas dos noivos durante o enlace em detrimento de fotografias.

O primeiro enlace real a ser fotografado foi o de Eduardo VII com Alexandra da Dinamarca, realizado em 1863 que teve lugar na Abadia de Westminster.

“Na altura do seu casamento [rainha Vitória] em 1840, as técnicas fotográficas não estavam totalmente desenvolvidas e ainda requeriam um excessivo tempo de exposição. Contudo, a fotografia depressa se tornou num meio popular e acessível tendo sido usado nos casamentos dos seus nove filhos”, explica o site oficial da Royal Collection Trust.

Atualmente sempre que se casa um membro da realeza, a Casa Real divulga fotografias oficiais do noivado e do enlace.

O uso da flor de laranjeira e da murta no bouquet

A tradição de incorporar a flor de laranjeira nos casamentos reais foi iniciada pela rainha Vitória aquando do seu enlace. Para ocasião foram colocadas aplicações no seu vestido e foi ainda criada uma grinalda. A escolha pode ser justificada pelo significado especial que esta planta tinha para o jovem casal. “Entre 1839 e 1846, o príncipe Alberto ofereceu à rainha Vitória diversos conjuntos de joias de flor de laranjeira para assinalar momentos importantes das suas vidas”, refere o site oficial da Família Real.

Recorde-se que esta planta - que está geralmente associada à castidade - foi o único adorno floral usado pela rainha Vitória no dia em que subiu ao altar. À semelhança da moda do vestido branco, esta flor tornou-se extremamente popular entre as noivas da época, “criando-se a moda de joias em forma de flor de laranjeira”, adianta o site da Royal Collection Trust. Daí em diante foram muitas as noivas reais que encontraram diferentes formas de a incorporar no grande dia.

Outra tradição que apesar de não ter sido iniciada propriamente por Vitória mas que começou durante o seu reinado foi a utilização de um ramo de murta no bouquet de casamento. De acordo com o site oficial da Família Real esta flor – que simboliza amor, fertilidade e inocência - foi utilizada pela primeira vez no casamento da filha mais velha da monarca, a princesa Vitória, em 1858. Esta é uma tradição que se mantém até aos dias de hoje. Exemplo disso foram os enlaces de Kate Middleton e da princesa Eugenie, onde as noivas optaram por um bouquet composto por diversas flores, entre elas as murtas. De acordo com o site oficial da Família Real, a murta utilizada nos bouquets reais é colhida de um arbusto existente na Osborne House, residência de férias da rainha Vitóra, e que provém de um ramo oferecido pela avó de Alberto a Vitória.

O bolo de casamento

Outra das tradições que remonta ao enlace de rainha Vitória e do príncipe Alberto são os bolos de casamento. “Acredita-se que após o enlace da rainha Vitória com o príncipe Alberto, os bolos de casamento tornaram-se banais em receções oficiais pelo país fora”, pode ler-se no site oficial da Família Real. Para a ocasião, o confeiteiro do Palácio de Buckingham apostou num bolo de três andares que pesava 140 kgs.

Outro facto interessante referido pela historiadora Lucy Worsley é que foi durante esta época que se tornaram populares os bolos de casamento feitos com frutas secas. “Uma tradição quebrada recentemente por Meghan e Harry com o seu bolo de limão”, adianta.

O casamento enquanto espetáculo

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créditos: AFP and licensors

Sempre que há um casamento real, a Casa Real vai divulgando diversas informações sobre o enlace que vão desde o dia, hora e local à ordem do serviço religioso. Outra estratégia habitual passa por, por exemplo, convidar membros do público a participar na cerimónia e a festejar este acontecimento nas ruas. Mas isto nem sempre foi assim.

“[O Lord] Melbourne insistiu que o casamento devia ter lugar durante o dia. Era um evento novo. No passado os casamentos reais tinham lugar em palácios e durante a noite. Eram muito privados. Este era um casamento real para as pessoas”, explicou a historiadora e professora Jane Ridley no documentário ‘Victoria & Albert: The Royal Wedding’.

Lord Melbourne, primeiro-ministro e conselheiro pessoal da rainha Vitória, foi a pessoa responsável pela organização do casamento da monarca. Os laços que veio a estabelecer com a imprensa foram preciosos para o êxito deste enlace que quebrou convenções face aos anteriores e se tornou num modelo a seguir para as futuras gerações.

“Isto foi muito mais do que um mero casamento entre dois jovens. Foi visto como um grande drama que foi o desenvolvimento da monarquia constitucional moderna”, rematou o biógrafo e romancista A. N. Wilson.