
A atriz Lia Gama mostrou-se hoje surpreendida mas "muito gratificada e honrada" por ser a homenageada do 42.º Festival de Almada, a decorrer nesta cidade e em Lisboa de 04 a 18 de julho.
"Para mim, foi muito inesperado, não estava a contar com nada disso. Mas é o que eu digo: tenho uma idade e tantos anos, tantos anos de trabalho que não me chamam para trabalhar, homenageiam-me", afirmou Lia Gama à agência Lusa, à margem da apresentação da programação da edição deste ano do festival, no Convento dos Capuchos, em Almada.
A atriz, que completou 81 anos na última semana de maio e que se estreou nos palcos em 1963, saudou a homenagem. "Ainda bem", acrescentou, foi "uma surpresa muito grande", mas "não podia, de maneira nenhuma, dizer que não".
"Sinto-me muito feliz, muito gratificada e muito honrada - e aquelas coisas todas, que são lugares comuns [dizer nestas alturas], mas são verdade, porque é uma vida".
"No fundo é a homenagem também a uma vida. Eu sinto mais que é ao teatro e ao que eu represento e com muita honra. Porque eu represento o teatro aqui e com um festival destes que homenageia de tal maneira o teatro, com tanta qualidade", concluiu a atriz, insistindo que, apesar do ato inesperado, está "muito contente".
Lia Gama lembrou ainda Jorge Silva Melo, de quem diz "sentir muitas saudades", e pela mão de quem participou "pela primeira e única vez" no Festival de Almada. Foi em 1998, na peça "Aos que nascerem depois de nós", um texto de Bertolt Brecht com música de Kurt Weill, encenado pelo fundador dos Artistas Unidos, que a atriz partilhou em cena com o músico Jorge Palma (piano e guitarra elétrica) e com os atores Manuel Wiborg, Miguel Borges, Pedro Assis, Bruno Bravo e João Meireles.
"Aos que nascerem depois de nós" estreou-se em 17 de julho de 1998, como "espetáculo de honra" do festival. Na interpretação musical estiveram ainda Carlos Barretto, Rui Alves, Paulo Gaspar, Jacinto Santos e o mentor dos Ena Pá 2000 Manuel João Vieira.
Lia Gama formou-se na Escola René Simon, em Paris, em 1965-66, depois de um início de carreira ao lado de Raul Solnado, com quem se estreou, em 1963, marcado por comédias nos antigos teatros Avenida e Monumental, em Lisboa.
No regresso à capital portuguesa, fez parte do elenco do Teatro Estúdio de Lisboa, de Luzia Maria Martins, onde interpretou autores como Jean Anouilh e Peter Shaeffer. De seguida trabalhou com o Teatro Experimental de Cascais, em Witold Gombrowicz, Natália Correia, Bernardo Santareno, e com a Casa da Comédia, em obras de Arthur Kopit e Nelson Rodrigues.
Na profissão de atriz, Lia Gama insistiu no teatro independente, que então se afirmava no país. Trabalhou com os principais encenadores, de Fernando Gusmão e Osório Mateus, a Jorge Listopad, Luis Miguel Cintra e Ricardo Pais, Carlos Avilez, João Lourenço e João Mota.
O seu nome esteve nos elencos de companhias como Os Cómicos, o Teatro da Cornucópia, A Comuna, o Teatro da Graça. Interpretou os grandes dramaturgos, de Shakespeare a Jean Racine, de Jean Genet a Bertolt Brecht, Rainer Werner Fassbinder e Tennessee Williams. Fez peças de Beniamino Joppolo, Maximo Gorki, J. Jourdheuil, Odon von Horvath, José Cardoso Pires. No Teatro Nacional D. Maria II, esteve em "As Fúrias", de Agustina Bessa-Luís.
Lia Gama estreou-se no cinema em "Sete Balas para Selma", de António de Macedo, em 1967, tendo trabalhado depois com António Cunha Telles ("O Cerco" e "Meus Amigos"), Eduardo Geada ("O Funeral do Patrão", "A Santa Aliança" e "Mariana Alcoforado"), Fernando Lopes ("Nós por Cá Todos Bem" e "Crónica dos Bons Malandros"), Solveig Nordlund ("Nem Pássaro Nem Peixe" e "Viagem para a Felicidade"), Manoel de Oliveira ("Amor de Perdição" e "Francisca"), António-Pedro Vasconcelos ("Oxalá"), João Botelho ("Tempos Difícieis").
Com José Fonseca e Costa entrou em "Sem Sombra de Pecado" e "Kilas, o Mau da Fita", onde cantou "Balada da Rita", de Sérgio Godinho.
Na televisão, muito antes das telenovelas, entrou em "O Caso Rosenberg", de A. Ducaux, por Oliveira e Costa, "A Senhora do Cãozinho". de Tchékhov, por Jorge Listopad, "Os Maias", de Ferrão Katzenstein, "Por Mares Nunca Dantes Navegados", de Zita Rocha, entre outras produções, como "Grande Noite" e "Cabaré", de Filipe La Féria.
Lia Gama recebeu o prémio da Casa da Imprensa pela interpretação no filme "Kilas, o Mau da Fita", a Medalha 25 de Abril da Associação Portuguesa dos Críticos de Teatro, a Medalha de Mérito Cultural do Ministério da Cultura, em 2006. Em 2019, recebeu o Prémio Sophia de Carreira da Academia Portuguesa de Cinema e o grau de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique.
A 42.º Festival de Almada, a decorrer nesta cidade de 04 a 18 de julho, numa organização da Companhia de Teatro de Almada (CTA) e da Câmara Municipal, contabiliza um total de 46 espetáculos de teatro e dança, 16 concertos ao ar livre, além de iniciativas paralelas como colóquios, debates e exposições, de acordo com a programação hoje anunciada.
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