“Arrumámos uma vida em meia hora. Trouxemos o mínimo, mas o máximo que conseguimos para as crianças, para conseguirmos ter espaço para seis pessoas no carro”, contou à agência Lusa Viktoria Forostiana, de 29 anos.

Com ela, desde Shargorod, seguiram o filho, de 06 anos, e a filha de nove meses. E também a irmã Alina Moskaliuk, de 26 anos, e a filha desta, de um ano.

Até à Moldova foram sozinhas com os filhos. E, junto à fronteira, foram 24 as horas que tiveram de esperar para a atravessar.

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Nessa fila, houve um momento em que começaram a ouvir sirenes, um sinal que antecipa bombardeamentos, e ainda ponderaram sair do carro e encetar outra fuga.

Eram cinco, num carro que só pode transportar cinco pessoas, mas na Moldova passaram a ser seis os deslocados de guerra, quando se juntou o marido de Alina, Andrei, motorista de profissão.

Depois, a viagem de cerca de 4.100 quilómetros prosseguiu pela Roménia, Hungria, Eslováquia, Áustria, Itália, França e Espanha, até chegarem a Portugal. Saíram em 25 de fevereiro, chegaram no dia 03 de março.

Em Ourém, no distrito de Santarém, esperavam o grupo Karina, irmã de Viktoria e de Alina, e o marido, Artem Ratushnyy, que tem uma empresa de transportes e ajudou na tradução das entrevistas.

Foi num dos camiões da empresa que, no dia seguinte à chegada, na sexta-feira, dia 04, Andrei partiu para a fronteira da Polónia com a Ucrânia com um carregamento de bens, “roupa, medicamentos, alimentos, água”, fruto da solidariedade de Ourém.

Já instaladas temporariamente no apartamento de Karina e Artem, no centro da cidade de Ourém (a Câmara tem em curso o apoio às duas famílias, incluindo o realojamento), Viktoria e Alina explicaram que a fuga foi para “salvar os filhos”, quando crescia o medo de que a guerra se aproximasse de Shargorod e depois de a contabilidade das mortes do lado ucraniano do conflito já somar dezenas de crianças.

Perto da cidade onde deixaram parte da vida, “os russos atingiram uma base militar” e o bombardeamento foi audível.

“[A guerra] estava lá perto”, notou Viktoria Forostiana, descrevendo também “aldeias sem comida, sem dinheiro, lojas vazias e um país que parou”.

Alina, cujo marido se encontra na Polónia, está agora dividida, ela que há três anos esteve três meses de férias em Portugal.

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“De férias, estava feliz, sabia que podia voltar a qualquer momento para a Ucrânia. Agora, não sei o que sinto, para onde voltar. É muito difícil começar tudo do zero”, afirmou Alina, ainda incrédula porque “ninguém estava à espera disto”, mas confiante de que a situação “vai normalizar e vai poder voltar algum dia”.

O que a jovem mãe quer é que “não morra mais gente”.

Viktoria, por seu turno, já decidiu: “Quero muito ir para casa, porque a minha vida ficou lá”.

Desta guerra, a jovem questiona como uma pessoa, o presidente russo, Vladimir Putin, “embrulha o mundo todo nisto”, agradece o facto de “toda a gente ajudar a Ucrânia”, mas lembrando que “ninguém consegue parar Putin”.

A jovem vai ainda ao baú da História para recordar outras guerras, quando “russos e ucranianos lutaram juntos na II Guerra Mundial”.

“Os nossos avós, bisavós, lutaram juntos e agora eles querem matar os ucranianos. Éramos irmãos”, lamentou Viktoria, que carrega o nome e também a esperança que vai alimentando a sua vida de que este episódio na História se vai escrever com vitória para a Ucrânia.

A Rússia lançou na madrugada de 24 de fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que causou pelo menos 516 mortos e mais de 900 feridos entre a população civil e provocou a fuga de mais de 2,3 milhões de pessoas para os países vizinhos, segundo os mais recentes dados das Nações Unidas.

A invasão russa foi condenada pela generalidade da comunidade internacional que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e o reforço de sanções económicas a Moscovo.