HealtNews (HN) – Como é que a formação académica tradicional dos profissionais de saúde em Portugal prepara (ou não) para os desafios de gestão e empreendedorismo que enfrentam ao abrir um negócio?

Ana Gonçalves (AG) – Considero que a formação tradicional se centra quase exclusivamente na vertente técnica e clínica, negligenciando competências essenciais, tais como a liderança, gestão financeira, marketing e gestão de equipas. O resultado disso são profissionais que, apesar de serem altamente qualificados tecnicamente, não têm as ferramentas necessárias para gerir um negócio. A Academia Negócios de Saúde nasceu precisamente desta lacuna: para ensinar o que a faculdade não ensina, com uma abordagem prática, descomplicada e orientada para resultados reais.

HN – Quais são os três pilares fundamentais do método “Clínicas de Sucesso” que desenvolveu, e como é que estes se adaptam a realidades distintas dentro do sector da saúde?

AG – O curso Clínicas de Sucesso é composto por seis pilares. São eles a estratégia; finanças; marketing; vendas; equipa; e gestão de tempo e produtividade. Mas, a ter que destacar apenas três, diria:

  • Estrutura/Estratégia: envolve processos claros, gestão financeira e métricas de desempenho. É o alicerce para qualquer negócio, seja uma clínica dentária, de fisioterapia ou uma unidade de medicina estética.
  • Equipa: atrair, formar e reter bons profissionais, criando uma cultura de responsabilidade e foco no cliente. Adaptável a realidades pequenas ou grandes — desde clínicas familiares até grandes grupos.
  • Vendas/Experiência do cliente: trabalhar o atendimento, comunicação e fidelização. A experiência é um diferenciador, especialmente num setor onde o toque humano é central.

HN – O relatório da Deloitte (2025) destacou a IA como tendência disruptiva na saúde. Como é que a Academia está a integrar estas inovações nos seus programas de formação?

AG – Estamos a integrar conteúdos que ajudam os profissionais de saúde a entender o papel prático da IA nos seus vários contextos, desde automação de agendamentos e gestão de dados clínicos, até à análise de dados para planeamento estratégico. Não se trata apenas de falar de tecnologia, mas de ensinar como deve ser aplicada para sermos mais eficientes, melhorar a experiência do cliente e libertar tempo para o que mais importa: cuidar e não ter um negócio que dependa 100% do empreendedor.

HN – A pandemia acelerou a digitalização, mas muitos profissionais ainda resistem a adoptar modelos híbridos. Que estratégias recomenda para superar esta barreira cultural?

AG – Antes de mais, é importante procurar casos reais de sucesso, ou seja, clínicas que aumentaram receita e fidelização com modelos híbridos. Depois, é essencial formar as equipas e lideranças para ganharem confiança nas ferramentas digitais. E finalmente, começar pouco a pouco, um passo de cada vez, como uma consulta online por semana, ou digitalização do processo de marcação. A mudança não se impõe — constrói-se.

HN – Os dados indicam que 68% das falhas em clínicas de saúde derivam de problemas na gestão de equipas. Como é que o Congresso abordou este desafio estrutural?

AG – Este foi, sem dúvida, um dos focos centrais do lll Congresso de Gestão e Empreendedorismo para Profissionais de Saúde, que se realizou no passado mês de abril, em Santarém. Foram vários os palestrantes que partilharam as suas histórias, os seus altos e baixos e abordaram diferentes temas entre eles: a liderança na saúde; como comunicar com clareza e empatia; construir equipas autónomas e comprometidas através de uma boa cultura organizacional.

A principal mensagem que procuramos passar, e acho que conseguimos, foi que uma equipa alinhada e comprometida é o que permite escalar o negócio.

HN – Perante o envelhecimento populacional, que oportunidades únicas vislumbra para empreendedores na área da saúde preventiva?

AG – Estamos perante uma “prata-valiosa” da sociedade: pessoas com mais idade, mais tempo e com maior consciência da importância da saúde e de envelhecer bem e com saúde. Isso abre portas para programas de prevenção personalizados; clínicas especializadas em envelhecimento ativo; serviços domiciliários e digitais com foco no bem-estar ou em cuidados paliativos.

Assim sendo, quem souber comunicar valor – e não apenas vender serviços – terá uma vantagem competitiva enorme.

HN – Com a terceira edição do Congresso a atingir 1.200 participantes, como está a evoluir o perfil do empreendedor de saúde em Portugal?

AG – É notório que está a emergir um novo perfil, em que o profissional de saúde já não se contenta em ser apenas técnico – quer liderar, inovar e deixar a sua marca.

Há mais abertura ao digital, mais curiosidade por modelos de negócio e, sobretudo, uma maior consciência de que gerir bem não é um luxo, mas sim uma necessidade. Isso nota-se no crescimento da comunidade da Academia: mais conectada, mais estratégica e mais empreendedora.

HealthNews

Leia outros conteúdos da revista HealthNews de abril 2025 aqui