A doença de Kawasaki (DK) é uma vasculite febril aguda auto-limitada de causa desconhecida, afetando principalmente crianças menores de 5 anos. A DK é atualmente a causa mais frequente de cardiopatia adquirida na criança. Descrita inicialmente no Japão por Tomisaku Kawasaki em 1967, está atualmente identificada em todo o mundo.

A prevalência por 100.000 crianças japonesas é de 300 comparativamente aos EUA com 25, Reino Unido com 4,5. Afeta mais rapazes.

A DK pode ocorrer em algumas famílias o que indica alguma predisposição genética. Estão estudados seis genes que poderão estar na base da referida suscetibilidade genética desta entidade, quer para a formação de aneurismas coronários, quer na suscetibilidade da resposta aos tratamentos.

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A DK em determinadas latitudes tem uma apresentação sazonal (inverno e início da primavera) como nos EUA, comparativamente a zonas tropicais onde não se observa esta sazonalidade.

Apesar de durante estes 50 anos de investigação não se ter encontrado a causa, há uma associação a doença respiratória recente, infeções bacterianas, hospitalização nos primeiros meses de vida, eczema, idade materna avançada, colonização materna com estreptococo do Grupo B, uso de humidificadores, habitações junto a reservatórios de água, ventos troposféricos originados da China que atingem Japão, Hawai e Califórnia. Algumas linhas de investigação descrevem o potencial papel de um vírus RNA novo que infetaria a via aérea enquanto outras defendem a inalação de agentes transportados no meio ambiente e que inalados por suscetíveis desencadeariam a DK.

O tratamento atempado com imunoglobulina endovenosa (IGEV) reduz o risco de aparecimento de aneurismas das artérias coronárias (AAC) de 25% para 4%. O prognóstico a longo prazo está relacionado com o grau de envolvimento patológico inicial das artérias coronárias.

São as manifestações cardiovasculares que estão na base da morbilidade e mortalidade de DK. Cerca de 5% dos enfartes do miocárdio, fatais e não fatais, em adultos jovens, tinham na sua génese lesões cardíacas consistentes com sequelas de DK.

A DK é caracterizada por inflamação de todas as artérias de tamanho pequeno e médio, localizadas em diferentes órgãos explicando os sinais de hepatite, pneumonite intersticial, enterite, meningite assética, pancreatite, linfadenite, miocardite e piúria.

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Na ausência de testes patognomónicos desta entidade são necessários uma constelação de sinais desta doença.

Nos primeiros 10 dias de doença os sinais não aparecem todos aos mesmo tempo, e por serem inespecíficos, o diagnóstico da DK clássica necessita de tempo mas baseia-se na presença de febre remitente (> 39ºC) durante 5 ou mais dias associada a 4 das características principais: conjuntivite bilateral, não exsudativa, rash polimorfo maculo-papular no tronco e extremidades, linfadenite (unilateral > 1,5 cm), enantema com lábios inflamados e gretados associados a língua de framboesa, eritema com edema doloroso das mãos/pés. Se a criança não apresentar os sinais e sintomas característicos da definição de caso clássico de DK, pode ser-lhe diagnosticado um quadro de DK Incompleta (15 a 20% dos casos).

A DK pode cursar com outras infeções em simultâneo e, por isso, a deteção de outros vírus, como co-infeção, não exclui o diagnóstico de DK. Em quadros de amigdalite que não melhoram em 72 horas de antibioticoterapia eficaz o diagnóstico de DK deve ser considerado.

A DK deve ser sempre considerada no diagnóstico diferencial de febre prolongada sem causa.

O diagnóstico de DK é confirmado quando o Ecocardiograma confirma a presença de AAC. Esta dilatação só é detetada após a 1ª semana de doença pelo que um eco normal na 1ª semana de febre não exclui DK.

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O estudo laboratorial com velocidade de sedimentação, proteica C reativa, hemograma completo e sedimento com cultura pode ajudar a aumentar o índice de suspeição.

Durante a pandemia de COVID-19 surgiram crianças gravemente doentes com clínica de DK só que nem todas as crianças eram positivas para SARS-CoV-2. Perante estes achados clínicos deve haver prudência na causalidade destes quadros graves pediátricos pois quer a DK quer a infeção COVID-19 cursam com resposta inflamatória exagerada e por isso difícil de separar estas entidades nas suas formas graves.

Os pediatras devem ajudar as famílias a perceber que a COVID-19 nas crianças tem sido na grande generalidade dos casos, uma doença benigna e ligeira, cuja associação à DK não foi ainda cientificamente confirmada.

Um artigo do médico José M. Aparício, especialista em Pediatria no Hospital Lusíadas Porto e Doutorado em Pediatria pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP).