Ligando 516 metros de distância entre as margens de Canelas e Alvarenga, o novo equipamento do distrito de Aveiro está seguro por estruturas de betão e aço dispostas 175 metros acima dos rápidos do rio Paiva e integra um tabuleiro em gradil metálico que, além de permeável ao vento, também permite observar em profundidade o cenário sob os pés dos visitantes.

Para Verónica Bernardo, técnica municipal de turismo que foi testando a experiência na nova ponte com pequenas visitas-guiadas prévias, é o ângulo vertical da visão proporcionada através desse quadriculado que mais torna a estrutura “assustadoramente bela”.

“Fruto do meu trabalho [de preparação], já fiz várias vezes a travessia – em condições de chuva miudinha, em condições de nevoeiro, em condições de sol – e é quase como os Passadiços do Paiva: cada um destes momentos é único e vale a pena. Quanto ao nervoso miudinho, existe sempre, ao início, mas depois passa com a espetacularidade da paisagem”, disse à Lusa.

Nesse tour pré-inaugural, Verónica começou por realçar que toda a paisagem em torno da Ponte 516 Arouca está classificada como geoparque e integra a Rede Natura 2000. A estrutura atravessa o vale da Garganta do Paiva e localiza-se junto à Cascata das Aguieiras, cujas águas se abatem sobre um leito fluvial que, por ser granítico, obriga o rio a desvios e curvas particularmente revolutos.

Fernando Vieira ouviu essas explicações ansioso. Mesmo antes de atravessar a ponte, já defendia que a experiência ia ser “espetacular” e anunciava que não havia nervos que o retivessem. “Qualquer pessoa vai gostar de fazer a travessia, pela paisagem e por toda a envolvência”, declarou, antecipando que a esperada afluência de visitantes ao local constituirá “uma mais-valia pra a freguesia de Alvarenga”, onde tem residência.

Quando Verónica autorizou que se iniciasse então a travessia, ninguém pareceu lembrar-se do distanciamento físico a que a pandemia vem obrigando: uns oito visitantes lançaram-se logo para a entrada e Fernando ia na frente, como numa corrida de marcha em que o prémio era ser-se o primeiro a pisar o chão perfurado da ponte.

Adriano Santos ficou na retaguarda do grupo, mas foi o atleta mais esforçado. Com problemas de locomoção, fez de bengala o percurso até meio do tabuleiro, sempre muito devagarinho e cansando-se bem mais do que os outros, já que não apoiava totalmente a cana no chão para evitar que a ponta de borracha, apenas um pouco mais larga do que o quadriculado do gradil, ficasse retida nos orifícios do piso.

Antes de voltar para trás, parou a meio da estrutura, a saborear o silêncio da serra e tentou revelar o que se sentia. “Olhar para baixo faz um bocadinho de… Mete um bocadinho de… Mas não é nada de mais. É uma brincadeira muito gira. Não tem nada de muito complicado”, contou, sereno, a rasgar o silêncio.

Márcio Soares ia mais à frente, mas também se distanciou do grupo para apreciar melhor as águas que fluíam 175 metros abaixo dos seus pés. Confessou então que em 2017, quando pela primeira vez ouviu falar no projeto, pensou que esse “se ia ficar só pelo boato” e não passaria disso.

“O certo é que agora é uma realidade e esperamos todos que traga bons frutos para o concelho. Foi uma ótima aposta da Câmara Municipal e toda a equipa que se envolveu nesta obra está de parabéns. Esperamos que seja uma mais-valia para o concelho, que nos traga mais turismo – principalmente numa altura destas, em que é preciso – e que todos os arouquenses possam aproveitar ao máximo esta exclusividade”, admitiu.

A presidente da autarquia não lhe ouviu os elogios porque só chegou mais tarde. Quando veio cumprimentar o grupo, que então já se encontrava na margem oposta àquela onde a visita começara, todos a viram atravessar a estrutura metálica sobre a Garganta do Paiva em saltos altos, como se nada fosse, de tão habituada que estava ao trajeto após várias visitas técnicas ao local nos últimos meses.

Margarida Belém arfava um pouco após a caminhada ascendente sob 24 graus de sol, mas vinha contente. “Estarmos hoje a atravessar esta ponte e tê-la concluída é um orgulho enorme. Representa o trabalho de uma larga equipa e só foi possível porque estivemos sempre todos muito concertados e fomos ultrapassando juntos todos os obstáculos”, afirmou.

Recordando que o Município avançou com a empreitada de 2,3 milhões de euros antes de saber se essa obteria a devida comparticipação comunitária, como se verificou só mais tarde através do Programa de Valorização Económica dos Recursos Endógenos, a autarca socialista atribui o projeto à audácia local – diz que “Arouca é um município de interior já habituado a ser arrojado – e justifica-o também com boas contas – porque iniciar a obra sem financiamento “revela a capacidade financeira do município”.

Inovadora a nível de engenharia e arquitetura por ter recorrido a técnicas concebidas de origem para a especificidade do próprio terreno, a ponte materializada pelo instituto ITeCons e pela construtora Conduril é assim “uma obra icónica, diferenciadora”, que já vem motivando solicitações diversas enquanto “atração não só a nível nacional, mas também internacional”.

A jovem Mariana Duarte já antecipava essa procura e quis garantir um primeiro lugar. Deitada no chão da 516 Arouca, com todo o corpo disposto sobre o gradil, pediu que a fotografassem, fez a devida pose e proclamou: “Assim sou a primeira pessoa a tirar uma foto deitada na ponte. Já que fotos destas não vão faltar, há que ser a primeira!”.