Por duas vezes, Tâmara Castelo abriu um sorriso ao perceber que os seus livros tinham vencido os Gourmand World Cookbook Awards, competição internacional que anuncia anualmente os melhores na área da edição livreira dedicada à gastronomia. Em 2018, Tâmara triunfou na categoria “Best Health & Nutrition Book” com o seu livro Curar sem Medicamentos. Em 2019, a autora bisou na mesma categoria com o título Equilíbrio Pleno (edições IN). Pretexto para uma conversa com esta lisboeta, nascida em 1984 e que estudou cinco anos na Escola Superior de Medicina Chinesa. Atualmente, dirige uma clínica dedicada a especialidades dentro da Medicina Chinesa e Homeopatia.

Alimentação saudável, ioga, exercício físico, bom sono, meditação e cristais cabem, entre outros elementos, na prática a que, com algum humor, Tâmara apelida de “tamarismo”: “um estilo de vida saudável onde a alimentação é a base do bem-estar do nosso corpo e da nossa mente”.

Está dado o mote para uma conversa que “viaja” por temas como a medicina tradicional chinesa, a utilização terapêutica de cristais, a alimentação equilibrada e caminhos para evitar ou minorar transtornos da saúde física e emocional: ansiedade, desequilíbrio intestinal, tensão pré-menstrual, menopausa, gripe e constipação.

Não obstante admitir que tem nas mulheres de diferentes idades o seu público maior, Tâmara não deixa de chamar os homens a envolverem-se nos temas que visa, nomeadamente a tensão pré-menstrual e menopausa: “acho que é fundamental o homem compreender estas fases da mulher”.

Para Tâmara, o caminho que percorremos deve fazer-se de harmonia, sem menosprezo pelo passado e as lições que nos traz. A autora olha com atenção e carinho para as “mezinhas das avós” e vê nos ingredientes que a natureza nos oferece a oportunidade para evitarmos males maiores na nossa saúde: “temos de dar oportunidade ao nosso corpo de se curar de forma natural”.

Nas palavras da autora baila um pedido para desacelerarmos, não exigirmos tudo no imediato, cuidarmo-nos sem que percamos o desequilíbrio das nossas emoções. “O corpo feminino é incrível”, confidencia Tâmara Castelo.

A Tâmara venceu pela segunda vez um prémio internacional com os seus livros. Quer partilhar com os leitores esta sua aventura ganhadora além-fronteiras?

É muito bom quando o nosso trabalho é reconhecido também internacionalmente. São muitos países a participar no Gourmand World Cookbook Awards e também diversas categorias.  Quando escrevo um livro, a minha base é escrever de forma que os leitores se identifiquem com o conteúdo e, se isto acontecer, é a melhor recompensa. Claro que receber um prémio internacional é bastante importante e faz-me perceber que estou no caminho certo.

Tâmara Castelo
créditos: Teresa Aires - @the_lightplace

Estudou medicina tradicional chinesa e estagiou num hospital estatal daquele país asiático. Quer partilhar com os leitores esta experiência? É comum na China esta ligação entre a prática da medicina tradicional e a moderna?

Foi uma das maiores aventuras da minha vida e tenho a certeza de que esta experiência teve um grande impacto no meu desenvolvimento profissional e também pessoal. Saí da minha zona de conforto à descoberta nem eu sabia bem de quê. Nestes países asiáticos, a medicina é uma cultura. Penso que não há nada melhor do que sermos confrontados com culturas diferentes e formas diferentes de vida.

Em Portugal, as pessoas estão cada vez mais recetivas à medicina tradicional chinesa. Por exemplo, no Médio Oriente isto já acontece há séculos.

Em Portugal, as pessoas estão cada vez mais recetivas à medicina tradicional chinesa.

Ainda no que toca à medicina tradicional chinesa, o que encontrou nesta que não encontra na prática da medicina ocidental?

Para mim a medicina tradicional chinesa expressa a forma como eu vejo o ser humano: holisticamente, integrando a sua biologia com as suas emoções, o que mais valorizo na minha prática.

O que é o “tamarismo”? A referência ao termo é feita pela jornalista Patrícia Matos, no prefácio que faz ao seu livro.

O “tamarismo” começou por ser uma piada entre amigos para caracterizar aquilo que defendo e acredito. Na altura, era uma piada, mas hoje em dia é um termo que gosto de utilizar e também gosto de ouvir os meus seguidores e leitores dizerem que são “tamaristas” ou adeptos do “tamarismo”.

O “tamarismo” é, nada mais nada menos, do que a prática de um estilo de vida saudável onde a alimentação é a base do bem-estar do nosso corpo e da nossa mente. É um movimento que pretende consciencializar as pessoas para a importância da saúde do organismo, mas também da saúde mental.

Para o seu livro Equilíbrio Pleno, selecionou dez distúrbios vividos pelas mulheres. Que distúrbios aborda e o que orientou a sua escolha?

O corpo feminino é incrível em todas as fases do seu ciclo. A mulher desempenha, em simultâneo, inúmeros papéis ao longo dos seus dias, da sua vida. Por vezes, esquece-se de cuidar dela própria e perde-se no desequilíbrio das suas emoções.

Ansiedade, desequilíbrio intestinal, tensão pré-menstrual, menopausa, azia e refluxo, gripe e constipação, candidíase vaginal, enxaqueca e cefaleia, insónia e falta de energia são algumas das queixas mais comuns que me chegam em consulta e, por isso, achei que seria importante escrever um livro que abordasse todos estes temas e ajudasse as mulheres a compreenderem melhor o porquê de acontecerem e como com o recurso a formas naturais, poderão enfrentar e superar estes desafios.

Encontra uma razão para o seu público ser maioritariamente feminino?

Hoje, os homens também já se estão a tornar adeptos deste “tamarismo”. As pessoas procuram, cada vez mais, tratar as suas queixas e desconforto da forma mais natural possível. A razão de ter um público maioritariamente feminino, julgo que se prende com o facto das mulheres se identificarem comigo e com a forma natural com que abordo temas que, por vezes, são vistos como um bicho de sete cabeças. É importante falar abertamente e descomplicar.

Tâmara Castelo
créditos: Teresa Aires - @the_lightplace

A Tâmara afirma que é possível lidar com os distúrbios que lista no seu livro sem medicamentos. Por que razão não nos é apresentada mais vezes essa via?

Isso é possível se, desde sempre, existir uma prevenção. A alimentação é a maior forma de prevenção de qualquer doença. É aos alimentos que vamos buscar as vitaminas, os minerais e os nutrientes que precisamos para o nosso organismo funcionar harmoniosamente.  Julgo que na maior parte das vezes as pessoas escolhem o caminho mais fácil: “doí-me a cabeça, vou tomar um anti-inflamatório”. Parece-me que é assim que a maioria das pessoas pensa e vive. Mas, atenção, não é errado porque até agora, provavelmente, não conheciam outra forma de suavizar o desconforto.

Por exemplo, para a dor de cabeça, que é uma queixa muito comum, água com sementes de girassol torradas pode ser uma verdadeira maravilha.

Temos de dar a oportunidade ao nosso corpo de se curar de forma natural.

As pessoas procuram, cada vez mais, tratar as suas queixas e desconforto da forma mais natural possível.

Diz-nos que as mezinhas do tempo das nossas avós ainda curam. Pode dar-nos alguns exemplos?

As avós sempre foram mestras em ajudar a tratar sem medicamentos. O xarope de rabanetes para a tosse, o xarope de cebola e gengibre para a dor de garganta, as gotas de álcool e vinagre para suavizar uma otite, as flores de malva para diminuir a comichão na pele, o chá de gengibre e erva-doce para ajudar a digestão, o chá de urtigas para a rinite, as meias com sal grosso para as amigdalites, enfim, uma lista infinita.

Continuando de olhos postos no passado, considera que vivemos hoje pior do que há algumas décadas?

Considero que hoje queremos que tudo aconteça muito rápido. As pessoas não têm muita paciência e procuram soluções mais imediatas, mesmo que sejam escolhas menos boas.  Antes vivia-se com mais calma e também não havia tanta oferta como a que existe agora.

Julgo que as pessoas não se preocupam com os meios que utilizam para atingir os fins, apenas querem atingir rapidamente o fim independentemente das consequências.

Antes vivia-se com mais calma e também não havia tanta oferta como a que existe agora.

Para a Tâmara, a expressão “harmonia” tem um peso muito especial. Que fatores concorrem para esta harmonia?

A harmonia e o equilíbrio são pilares fundamentais na nossa vida. Se estivermos em harmonia connosco, alcançamos facilmente o nosso equilíbrio. Se mantivermos o nosso equilíbrio, sentimo-nos bem e por isso vivemos em harmonia com o nosso organismo, com a nossa mente e com o que nos rodeia.

Usa cristais em tudo na sua vida, como nos revela no livro. Que uso lhes dá?

As energias dos cristais são ótimas para nos ajudarem a manter o nosso equilíbrio. Cada cristal tem as suas características e com cada um sentimos uma conexão diferente. Eu utilizo cristais para tudo, são como um amuleto de sorte, de proteção.

Os cristais podem elevar a nossa autoconfiança, o nosso amor próprio, podem ajudar a termos uma boa noite de sono ou até mesmo a aliviar aquela dor de cabeça chata. Os cristais são portadores de energias únicas que, em contacto com a nossa própria energia, têm a capacidade de equilibrar os nossos chakras e de nos proteger de energias indesejadas e pensamentos tóxicos.

Tudo é vibração, tudo é energia ao nosso redor.

É urgente aprender que somos nós que controlamos a nossa mente.

Admite no livro que, no início, olhava para os cristais com algum ceticismo. Porquê?

É verdade. É difícil compreendermos o poder dos cristais se não soubermos nada sobre eles. Comecei apenas por ler um artigo aqui outro artigo ali, mas depois comecei a investigar mais a fundo e acabei por me render às energias. Acho que o mais importante é deixarmo-nos ir, experimentarmos e percebermos se realmente faz ou não sentido. Não podemos dizer que não a algo que não sabemos o que nos vai trazer. Desde que percebi o bem que fazem à minha energia e à minha mente, utilizo cristais para tudo na minha vida e tento incutir esta minha paixão às pessoas que me estão próximas.

Gostaria de abordar com a Tâmara o caminho que apresenta para mitigar ou evitar alguns dos distúrbios que inclui no seu livro. Comecemos pela ansiedade, tão presente no nosso quotidiano. Os nossos hábitos do dia a dia podem, por si só, “domesticar” a ansiedade?

Obviamente. É urgente aprender que somos nós que controlamos a nossa mente. Pensamos no que queremos pensar, nós sentimos o que queremos sentir e este poder está na nossa mente. A ansiedade é um assunto muito sério e que, em alguns casos, condiciona mesmo a vida das pessoas. É uma emoção natural do organismo que, se estiver em desequilíbrio, é grave para a saúde.

A ansiedade, como explico no livro, é um mecanismo autónomo do organismo e é muito difícil mudar o chip da mente e controlar esta emoção. É preciso inserirmos nas nossas rotinas, pequenos rituais que ajudem a mente e o corpo a relaxarem. E a alimentação também tem um papel fundamental no combate à ansiedade.

No que toca à saúde do intestino, quais são os sinais que nos devem preocupar?

O intestino é o nosso segundo cérebro por isso devemos nutri-lo da melhor forma. Se tivermos um intestino doente automaticamente se traduz em falta de energia, tristeza, obstipação, insónias, dor abdominal, sensação constante de barriga pesada, inchaço abdominal e até mesmo, dores de cabeça. Precisamos de ter e manter um intestino saudável e feliz para que tudo o resto possa funcionar e fluir da melhor forma.

Diz-nos que devemos fazer um “reset intestinal”. É o mesmo que falar de jejum intermitente?

Um reset ou detox intestinal tem como objetivo desintoxicar, desinflamar, desinchar e dar ao nosso organismo, algum descanso. É importante de vez em quando oferecermos saúde ao nosso intestino.

Devido às nossas rotinas, nem sempre nos alimentamos de forma correta e nem conseguimos manter hábitos alimentares, que são fundamentais para ajudarem o intestino a funcionar corretamente.

É muito importante que, de vez em quando, possamos dar umas ‘feriazinhas’ ao nosso intestino.

Reset ou Detox intestinal e Jejum intermitente, no meu ponto de vista são conceitos diferentes.

A ansiedade, como explico no livro, é um mecanismo autónomo do organismo e é muito difícil mudar o chip da mente e controlar esta emoção.

No capítulo que dedica à tensão pré-menstrual (TPM) e menopausa, chama à conversa os homens. Porquê?

Porque acho que é fundamental o homem compreender esta fase da mulher. Ambas as fases são bastante delicadas para a mulher e muitas vezes, os sintomas destes dois distúrbios femininos não são levados a sério. A mulher é uma força de natureza com um organismo incrível para suportar imensa coisa. Nestas fases, a mulher transforma-se em outra pessoa e a meu ver, é importante que os homens compreendam os sintomas para que possam compreender que, por vezes, a variação de humor, a falta de paciência, a irritabilidade por tudo e por nada, têm uma razão de ser.

A compreensão e a tolerância por parte do sexo oposto, pode atenuar tanto os efeitos da TPM como os efeitos da Menopausa.

canja de cogumelos Shitake
créditos: Teresa Aires - @the_lightplace

Um aspeto muito abordado nos dias que correm prende-se com a imunidade. A Tâmara chama-a ao seu livro, ao associá-la à prevenção da gripe e da constipação. Há uma fórmula mágica para fortalecer o sistema imunitário?

A melhor fórmula mágica é uma alimentação consciente, equilibrada e saudável. A alimentação é a base de tudo. Temos que escolher os ingredientes certos, cozinhá-los de forma correta e ajudar o nosso corpo a funcionar bem.

Não há nada melhor do que uma alimentação rica em vitaminas e minerais para reforçar o sistema imunitário.

A isto podemos juntar alguma suplementação e fitoterapia mas que só irão ajudar a produzir resultados se mantivermos hábitos equilibrados.

O seu livro conta com inúmeras receitas. O que orientou as escolhas que nos apresenta?

O primeiro passo é percebermos que alimentos são bons para o nosso organismo e que alimentos queremos excluir dos nossos hábitos.  Existem alimentos que nos fazem sempre bem como os verdes e as frutas e depois existem alimentos que nos fazem sempre mal como o sal, os lacticínios, a charcutaria, os açúcares, os processados entre tantos outros.

O segredo está em descobrimos novas combinações de sabores e de texturas. Quando aceitamos isto, as escolhas e o caminho tornam-se muito mais fáceis.

Entrevista cedida por escrito em janeiro de 2022.