Escreve no seu livro que “é necessário ser bem preciso na definição de burnout”. Qual a melhor definição que nos pode dar? 

Burnout é uma síndrome, ou seja, um conjunto de queixas [sintomas] e de sinais observáveis que ocorrem juntos que traduz um processo desajustado de interacção do trabalhador com o trabalho, com níveis de sofrimento crescentes por má gestão do stresse.   Na fase final, a que corresponde o diagnóstico mais criterioso, manifesta-se por um conjunto de três características, a tríade Exaustão, ou seja, o esgotamento físico e emocional; Despersonalização, com distanciamento afetivo e perda da Realização Profissional, o que se traduz na insatisfação e quebra no desempenho.

Portugal está entre os países da União Europeia com maior risco de burnout. Encontra razões na organização do trabalho/social/familiar que expliquem esta realidade? 

É verdade que há pesquisas que destacam Portugal como na primeira posição quanto a risco de burnout ao nível da União Europeia, e outros que revelam que estamos também em posições cimeiras quanto ao número de pessoas já afetadas pela condição de burnout. Estes cálculos foram feitos tendo por base o índice de felicidade mundial de cada país, o salário médio anual e as horas de trabalho semanais. Ora, Portugal não está bem classificado, pois os índices de felicidade do seu povo são baixos, tal como o são os salários, e é dos países europeus com jornadas de trabalho semanais mais longas. Contudo, a situação é de muito mais complexo entendimento. Portugal também replica primeiras posições na Europa quanto a queixas de stresse negativo, quanto a prevalência de doença mental, nomeadamente depressão e ansiedade. Questões como equilíbrio entre a vida pessoal e a de trabalho são por cá pouco cuidadas, havendo carência de apoios sociofamiliares a quem trabalha.  Sobretudo, ainda são dominantes culturas de presentismo, de valorizar aquele trabalhador que sempre se submete, acrítico e lisonjeador das chefias.  A nossa mentalidade é o de parecer bem, mais do que ser estruturalmente uma pessoa integra em consonância com a realidade, mas também com os seus valores e necessidades. Há demasiadas queixas de conflitos no trabalho e permissividade para situações de abuso moral no trabalho. O trabalhador português não é suficientemente interventivo na participação social responsável para a promoção de um trabalho e de uma vida boa.  Também se reporta que portugal é um dos países com mais preconceito quanto a doença mental e em que o acesso a serviços terapêuticos efectivos e diversificados é mais difícil e onde se investe menos em prevenção, enquanto a literacia em saúde deixa bastante a desejar.

Se a definição de burnout ainda deixa a desejar, é bem mais difícil medir com rigor o sofrimento, a felicidade e conceitos muito pessoais como bem-estar no trabalho. Deveríamos estar menos focados nestes rankings de quem é o pior classificado, e mais investidos em defendermo-nos do que já está comprovado conduzir ao burnout, tal como promover tudo o que nos defende do mesmo.

Maria Antónia Frasquilho
Maria Antónia Frasquilho Psiquiatra Maria Antónia Frasquilho. créditos: Divulgação

De “enamorado” a “esturrado” face ao trabalho. Estes são os dois “e” nos antípodas do caminho para o burnout, tal como os descreve no seu livro. No total o caminho faz-se de 13 “e”. Em que momento deveríamos perceber que nos aproximamos do precipício? A “fritadeira” como a apelida.

É possível detetar indícios desde muito cedo. Em Portugal, costumam passar despercebidos porque a cultura laboral é de muitas horas e cada vez mais exigências sobre quem vai respondendo positivamente. A entrega apaixonada e inteira ao trabalho é incentivada.  Essa é uma cultura que não só devora as vítimas como elogia quem mais tempo resiste ao calvário. Não é que a paixão seja má, ela não pode é durar tanto tempo, com tanta intensidade que consuma o apaixonado. Um cliente meu, perfeccionista, defensor do dar tudo por tudo na profissão, com uma necessidade obsessiva de desafios galopantes, ainda assim resistente ao sofrimento e com excelente êxito laboral, foi recrutado para exercer numa excelente posição na Noruega.  O salário era formidável, tal todas as restantes condições de trabalho e de acolhimento individual e da familia.  Tinha-me consultado por ansiedade e explosões de mau feitio que lhe traziam problemas, estando a evoluir muito favoravelmente.   Ficou exultante com a proposta.  Liga-me ao fim de algum tempo no novo trabalho e diz-me o seguinte: “Sabe o que me aconteceu? Comecei a trabalhar cheio de gana, a querer mostrar que estava totalmente comprometido.  Depois do inbording, ao fim de uma semana fui logo advertido. Ficava no escritório uma ou duas horas para lá do horário de saída que era às 16h00.  Pareceu-me estranho passar a portaria e notar o edificio vazio. Ao sexto dia de trabalho, o meu superior chamou-me e perguntou-me se eu estava a ter dificuldades em realizar a tarefa, ao que respondi que ‘não’”.  – ‘Então qual a razão de estar a sair tão tarde?’ - insistiu.   Eu expliquei que era por estar motivado e que realmente estava totalmente empenhado em fazer a diferença para melhor. – ‘Pois não queremos isso!’ – respondeu o norueguês – ‘Queremos trabalhadores que sejam efetivos no seu horário de trabalho, mas que além disso sejam cidadãos com uma vida pessoal, familiar e social plena, satisfatória. Que preservem o tempo de descanso para que se possam manter ativos produtivos e saudáveis’”.

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Em concreto, no que respeita aos indícios, quais são?

Em termos pessoais há muitas mensagens que o corpo e a mente vão dando e que há que escutar: queixas físicas, palpitações, tensão alta, dificuldades digestivas,  diarreias, boca seca, um aperto na garganta, tensão muscular, dores  em múltiplos locais, um maior e diferente cansaço, perturbações do sono e do apetite, nervosismo,   inquietação, dificuldade  em  desligar do trabalho, falta de vontade de se divertir, perda da libido, falta de paciência para com os outros, isolamento, irritabilidade, sensação de mal-estar, de que se está a exagerar, que coisas simples estão mais custosas de atingir. Problemas de atenção, memória, de decisão. Começo de uso de psicoativos, álcool ou drogas para aguentar. Tudo isto são alertas nas primeiras fases. Escute-se. E seja também uma sentinela para os seus colegas. Há que abrandar ou parar antes de rebentar.

Escreve no seu livro que “o burnout é penoso para as pessoas, mas são tremendos os seus efeitos no sistema de trabalho”. A que efeitos se refere? 

Um ativo em burnout é como um vírus, pode contaminar toda a empresa.  As perdas são possiveis para todos.  Desde questões relacionais com presentismo, menor disposição para trabalhar em equipa, deflagração de tempestades emocionais competitivas e agressivas, de crescente mau ambiente relacional por atitudes de não cooperação, de oposição. Passando por retaliações contra a boa imagem da empresa e até quanto à integridade dos seus membros. Problemas de assédio moral são possiveis, quer contra a vítima de burnout, quer desta contra aqueles que representam a empresa. E ainda diminuição da qualidade do que é produzido, ocorrência de erros, incidentes críticos, acidentes graves. Há perdas sérias de produtividade, perdas por rotatividade, perdas por absentismo quando a doença ganha e em consequência mais despesas de recrutamento, de formação. A insatisfação pega-se realmente. Depois da implosão, a tal triade exaustão, despersonalização e insatisfação, pode ocorrer a “perda do sentido de si” associada ao desespero e a não haver nada a perder. Então, tudo é possivel: atos intempestivos agressivos, destruição de património, entrada em processos de litígio com reclamação de danos, suicídios. Por isso a degradação da saúde mental dos trabalhadores é uma das maiores preocupações dos gestores porque configura uma ameaça ao desenvolvimento dos negócios num horizonte já curto.

Um ativo em burnout é como um vírus, pode contaminar toda a empresa.

No seu livro estabelece a relação entre literacia em saúde e o bem-estar laboral. Quer, sucintamente, explicar aos leitores qual a relação entre estas duas realidades?

Estão relacionadas. Por norma, quanto maior a literacia em saúde maior será o bem-estar laboral. Mas há exceções. A literacia em saúde significa que a pessoa está sensibilizada, informada, capacitada e dá valor à construção da melhor saúde.  Compreende o que está em jogo, as decisões que toma em liberdade e as suas consequências, que tem as ferramentas necessárias para ser um construtor do bem-estar pessoal e coletivo.  Nesse sentido, coopera na prevenção de doenças, é participativo na promoção da saúde e tudo o que ela implica. Por princípio poderá gerir melhor o stresse profissional, enfrentar com mais sucesso as dificuldades. Cumprirá e divulgará as medidas de segurança no trabalho, será mais propenso a proteger-se e a cuidar dos seus, reduzindo riscos e acidentes. Selecionará e utilizará melhor os recursos de saúde, nomeadamente os de saúde mental, existentes e pugnará pela sua melhor qualidade. E quando se sente com capacidade e poder para fazer a diferença positiva no seu trabalho tende a estar mais engajado e satisfeito o que é propício ao bem-estar coletivo. Mas há um senão: quando o trabalhador tem toda a vontade, informação e capacitação, mas defronta barreiras externas de falta de condições. Por exemplo, a desvalorização do trabalho saudável, falta de coerência entre o que os líderes dizem e o que fazem, falta de meios para praticar o que sabe dever fazer-se, negacionismo, falta de apoio para que leve a cabo a sua proteção e a promoção da saúde. Então, o trabalhador defronta-se com aquilo a que chamamos dissonância. Nesse caso, um trabalhador com suficiente literacia sofrerá mais do que um com baixa literacia que não percebe como o trabalho contém perigos, ou que nunca sonhou sequer com bem-estar. Nesse caso o que há a fazer é aprofundar mais a literacia emocional, ajudando o individuo que está em crise a regular emoções e expetativas, sem perder o bom propósito de fazer o bom caminho na sociedade.

Médica psiquiatra, Maria Antónia Frasquilho especializou-se em Psiquiatria Forense, com um pezinho em Pedagogia da Saúde, Medicina do Trabalho e Avaliação do Dano Corporal. Consultora em saúde mental no trabalho, dedica-se, desde 1985, ao estudo, ensino e intervenção no burnout. Foi docente na Escola de Saúde Pública da Universidade de Lisboa, diretora clínica do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa e atualmente exerce a sua prática clínica na Alterstatus, em Algés.

O burnout evolui para um vasto número de doenças. Quer enumerar algumas delas?

O stresse negativo, ou distress como se deve dizer, é o responsável neurofisiopatológico pelo desencadear das doenças. São possiveis todos os sintomas por ativação duradoura do sistema nervoso simpático. Enquanto doenças propriamente ditas temos, com expressão ao nível físico, as doenças cardiovasculares (hipertensão, AVC, enfartes); doenças  músculo esqueléticas (dores por tensão nervosa, torcicolo, fadiga, fibromialgia,  algodistrofia);  sistema digestivo (vómitos, esofagite, gastrite, úlceras,  discinesia biliar, cólon irritável);  sistema urinário (bexiga neurogenea, infeções repetidas);  sistema neurológico (tonturas, cefaleias, migraine, perturbações do sono, doenças neurodegenerativas); dermatológicas (urticária, eczemas, psoríase, alopecia); doenças metabólicas (aumento ou perda de peso, diabetes. Tiroidites); sistema imunológico (sensibilidade aumentada a infeções, redução da imunidade, neoplasias.

E no domínio mental?

No domínio mental, e apenas enquanto doenças classificáveis, temos a possibilidade de perturbações da ansiedade, pânico, dissociações, fobias, depressões, perturbações do stresse traumático, agudas e crónicas.  Perturbações alimentares, anorexia, bulimia.  Perturbações cognitivas (défices de atenção). Perturbações do controlo dos impulsos (desregulação quer com tentativa obsessiva do aumento do controlo, quer impulsividade franca).  Perturbações da sexualidade (alterações da líbido, alterações do objeto de desejo sexual).  Abusos e dependências de álcool, tabaco, drogas, jogo, Internet. E até psicoses agudas (paranoias, e outras psicoses delirantes). Como bem percebem a nossa mente cruza o funcionamento de todo o corpo. Somos seres psicossomáticos.

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Há profissões em que o burnout é mais comum? Os sintomas variam de profissão para profissão?  

O burnout é mais comum nas profissões muito apelativas, aquelas que chamam à paixão. Profissões exigentes, que requerem longas horas de trabalho, dedicação intensa, quer cognitiva quer emocional, altaresponsabilidade e forte exposição social, com possível tensão. Será maior o risco se, nessa responsabilidade, há pouca possibilidade de controlo direto sobre os resultados, como é o caso dos médicos, o êxito no tratamento não depende só deles; quando  estamos em presença de forte imprevisibilidade, no caso dos investidores na bolsa perante crises financeiras em cascata; quando há  fraco reconhecimento pelas competências tão dificeis de obter, como na situação dos professores que recebem  mandatos contraditórios  quanto a pedagogia vindos de pessoas leigas mas cheias de si. Cuidado com as profissões nas quais um erro humano conduz a resultados trágicos, como no caso dos controladores de tráfego, juízes, comandantes de aviões, navios, tropas. Atenção às profissões hiperresponsabilizadas, solitárias altamente exigentes emocional e cognitivamente, os investigadores de ponta, os cuidadores, os que trabalham com tecnologia superespecializada em condições de perigo iminente. E também as profissões com forte exposição pública, pouco valorizadas nas funções em que a critica tantas vezes injusta, a humilhação ou mesmo a agressão é imediata, como no caso dos agentes de segurança, profissionais de relação com o público.

Porém, atenção: são as pessoas, com a sua arquitetura psicológica que escolhem as profissões. Daí termos sempre de fazer a pergunta: É a profissão ou são os profissionais que estão “a cozinhar o burnout”?

O burnout é mais comum nas profissões muito apelativas, aquelas que chamam à paixão. Profissões exigentes, que requerem longas horas de trabalho, dedicação intensa

No seguimento das perguntas anteriores, há pessoas mais propensas a desenvolverem o quadro de sintomas associados ao burnout?

Esta é a principal chave de apoio ao diagnóstico:  a maneira de ser da pessoa que desenvolveu burnout. Neste quadro há que falar de Sisifémia. É a fadiga do trabalhador incansável, do viciado em trabalhar. Há um mito grego que conta que Sísifo empurrava como um condenado um bloco gigante de mármore, que devia levar da base da montanha até ao cume.  Claro que a pedra sempre se escapava e rolava encosta abaixo.  Então os ‘Sísifos’ do burnout torturam-se no traçar de metas inalcançáveis. Vivem para algo ideal. São pessoas muito exigentes com elas próprias, que só descansam quanto tudo estiver perfeito, por isso nunca conseguem “baixar os braços”.  São obsessivas com os detalhes, dificilmente aceitam os elogios, acham que poderiam sempre fazer melhor. Têm uma visão normalmente alargada do mundo, que querem melhorar, mas muito restrita das suas necessidades, dos seus limites e pouco se cuidam. Quando alcançam algo não rejubilam, metem-se logo noutro desafio. Começaram a trabalhar cedo na vida. Vêm no esforço denodado um propósito de existência. Enervam-se quando lhes propõem férias ou descanso. Acreditam que não estar a trabalhar é uma falta de respeito, por si ou pela colectividade, que pode ser a empresa. Isto é comum nas culturas japonesa, ou chinesa.

Burnout
Burnout créditos: Manuscrito

Quando se refere a medidas antiburnout sublinha que a competência deve cair sobre as empresas, mas também não destitui de responsabilidades o trabalhador. O que se deve esperar de uns e de outros? E, por extensão havendo também responsabilidade no quadro escolar, o que se espera da escola?

Só esta pergunta dava um livro inteiro. Aliás, para o que se espera da escola recomendo a leitura duma outra obra minha Stresse, Depressão e Suicídio. Gestão de Problemas de saúde em Meio Escolar.

Em resumo, durante longo tempo a saúde mental no local de trabalho era tida como um problema individual. O trabalhador entraria em sofrimento porque era vulnerável biológica ou psicologicamente, ou não estava capacitado para regular as tensões no trabalho ou pior, estaria desinteressado de se ajustar às exigências daquele trabalho. O que havia a fazer era ajustar o trabalhador. Treino, formação, recompensas, reforçar motivação e resiliência, oferecer programas de apoio e tratamento ao colaborador, aconselhamento, psicoterapia, medicação.

Depois, colocou-se o foco nas organizações de trabalho. Os seus líderes, e pessoal de topo teriam de garantir condições favoráveis à boa higiene mental, bem-estar e felicidade de todos os ativos.  Aí se incluem as políticas empresariais, os valores que imbuem a empresa, as condições de trabalho, a organização do trabalho, o ambiente físico e a segurança, tal como o ambiente relacional.  Um bom planeamento e uma adequada liderança, o cumprimento das normativas internacionais e nacionais, e dos regulamentos da empresa acerca dos riscos psicossociais seria a boa medida.  Em termos médicos diremos que seria o mundo do trabalho que deveria fazer a profilaxia do burnout.

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E mais recentemente?

Mais recentemente o paradigma é:  para problemas complexos e multisistémicos como o burnout há que haver soluções globais a variados níveis e transversais uns aos outros. São esses: políticos, culturais, económicos, educacionais, sociais, ambientais, de saúde a par de responsabilidades das organizações de trabalho na garantia de um trabalho digno e que não constitua risco de sofrimento para o trabalhador, e ainda individuais na escolha dum estilo de vida saudável e do acolhimento à inevitável imprevisibilidade e perigo para o que a aposta na flexibilidade mental e na criatividade é essencial. Como observam, isto é bem mais alargado do que a visão redutora trabalhador-trabalho.  E nisto integra-se também o depor duma resposta mecanicista a uma vicissitude, ou mesmo dum entendimento orgânico da situação de risco, e passar a acolher um entendimento multiorgânico e situacional: global, holístico, dialético sempre em ajuste aos incomensuráveis perigos recorrentes na contemporaneidade. Nesta têm de ser destacados os valores humanísticos e a justiça social no local de trabalho, e importantes questões intrínsecas ao meta-conhecimento, à filosofia da saúde que acolhem conceitos como auto-conhecimento, propósito e sentido de vida inerentes a cada trabalhador.

Há medidas simples que podemos tomar para evitar cairmos no burnout?

Muito simples, reveja as suas expetativas. Medite nestas frases: “o ótimo é inimigo do bom”;  “a felicidade não é um estado, é uma procura”; “o mundo não é justo, embora exista justiça no mundo”; “todos temos valor mesmo se não ficarmos em primeiro lugar”;  “devemos esforçarmo-nos por progredir mas todos temos limites ao esforço”; “é possível errar, há outras oportunidades a cada dia”; “comprometimento é  mais sustentável que paixão”;  “os autocuidados são um dever”, “as palavras SIM e NÃO são para serem ditas nas ocasiões próprias”; “o sofrimento mental não é indigno, não é de fracos”.

Também é simples estar atento às mensagens que o corpo dá. Ele avisa se nos estamos a esticar em demasia.  Ouça os mais próximos e mais confiáveis. Se lhe dizem que está em perda alinhe logo em fazer mudanças. Reconheça o problema. Faça ajustes simples de maior proteção: diminuição dos ritmos de trabalho, evitar sobrecargas, aliviar as suas próprias exigências, tornar-se o seu melhor amigo, tomar medidas gerais de vida saudável, com boa alimentação e atividade física, reconetar-se com os outros, ter melhor vida relacional e alargar interesses de vida.  Se se percebe perto do colapso escolha a ajuda profissional correta. Será um profissional de saúde mental, psicólogo ou psiquiatra.  Liberte-se do estigma.

Uma medida mais dificil é investir e manter-se no aprofundar do autoconhecimento. Só assim se pode genuinamente transformar: lidar melhor com o desapontamento, ser tolerante à dúvida, à incerteza, aceitar a imperfeição e compreender que alguma dor mental é inevitável, por exemplo no trabalho há sempre algum nivel de sofrimento.  E, principalmente, que tem valor por aquilo que é enquanto pessoa, e não só pelo que faz de espetacular e de acordo com os pedidos dos outros. Importante é também aprender a lidar com os vampiros de energia, sempre críticos e com os invejosos. É quase sempre na rutura que se começa a construção de algo melhor.

Imagem de abertura do artigo cedida por Freepik.