Em declarações à agência Lusa, a investigadora da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) e do CINTESIS Irene Carvalho esclareceu hoje que a investigação visava avaliar o impacto das medidas restritivas impostas pela pandemia na autoimagem e prática de exercício físico excessivo, bem como no consumo de substâncias.

Entre as substâncias em avaliação destacam-se os “esteroides anabolizantes, estimulantes sexuais, hormonas de crescimento, vitaminas, suplementos, laxantes, chás, infusões, anfetaminas”.

O estudo internacional, publicado na revista científica Frontiers in Psychiatry e que envolveu investigadores da FMUP e da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação (FPCEUP), recolheu dados de participantes de sete países - Portugal, Reino Unido, Itália, Hungria, Espanha, Lituânia e Japão – através de questionários padronizados.

No total, participaram 3.161 pessoas, das quais 332 portuguesas e com uma média de idades que rondava os 35 anos.

O estudo mostrou que durante o primeiro confinamento provocado pela covid-19 (abril e maio de 2020) os portugueses “foram os que mais iniciaram o consumo destas substâncias”.

“No estudo vê-se que Portugal tem uma taxa de 11,9% de pessoas que começaram a usar estas substâncias com o confinamento. Foi o país que mais começou a utilizar. O país mais próximo é Itália, com 8,6%, e depois a Lituânia, com 6,1%", afirmou Irene Carvalho, acrescentando, contudo, que na Hungria não se verificou qualquer aumento deste tipo de produtos.

Segundo a investigadora, as substâncias mais utilizadas foram as vitaminas, proteínas, cafeína, chás e infusões, seguidas dos ácidos ómega.

“A questão é que são substâncias que, apesar de não causarem efeitos psicotrópicos, as pessoas têm dificuldade em deixar de as usar. Não tem tanto a ver com a substância e as suas propriedades, mas com a utilização que delas é feita, não por questões de saúde, mas por causa da aparência e desempenho”, referiu.

A investigadora salientou que o risco do consumo destas substâncias reside no propósito da sua utilização, especialmente na era da Internet, em que “estes produtos são vendidos como soluções mágicas e rápidas numa publicidade não só enganosa, mas agressiva”.

“Esta é que é a questão: as pessoas lançam-se nesta aventura com a melhor das intenções, sem supervisão médica e sem saber o que está a acontecer. Aqui reside o perigo e o problema”, observou.

O estudo detetou também "níveis consideráveis" de ansiedade relacionada com a aparência, nomeadamente, em Itália (18,1%), no Japão (16,9%) e em Portugal (16,7%).

“É necessário ter atenção às pessoas particularmente vulneráveis, por exemplo, com maior ansiedade relativamente à sua imagem que podem estar mais vulneráveis a este tipo de publicidade e de norma cultural do corpo perfeito”, acrescentou.

Os dados evidenciam ainda que a prática de exercício físico aumentou significativamente a probabilidade de as pessoas recorrem a estes produtos, com o Reino Unido e a Espanha a registarem o maior número de pessoas que praticavam exercício de forma excessiva ou problemática.

“Concluímos que as pessoas que mais praticam exercício físico também mais consomem estas substâncias para melhorar a imagem e o desempenho”, acrescentou a investigadora.