“O tempo em que durmo é o momento mais inútil do meu dia”

O sono é um momento fundamental para o nosso organismo e durante o qual se desenvolvem actividades muito importantes, como a regulação do nosso metabolismo e do sistema imunitário, a secreção de hormonas importantes para o funcionamento do corpo e a consolidação da nossa memória e emoções. Por isso, o sono é essencial à nossa saúde física e mental. Um dos hábitos essenciais para uma vida longa e saudável é dormir bem!

“Durmo mal há muito tempo, já perdi a esperança de dormir bem”

Dormir mal é um sintoma tão importante como a dor ou a falta de ar. Muitas pessoas dormem mal há muito tempo e isso vai ter repercussões importantes para a sua saúde. Não devem adiar a procura de ajuda já que isso leva ao agravamento do problema de sono e das suas consequências. Doenças tão importantes como a demência, depressão, hipertensão arterial, diabetes, AVC, enfarte cardíaco estão de uma forma directa relacionados a um mau sono.

“Durmo mal... Será que tenho uma doença do sono?”

Ter problemas com o sono não implica ter uma doença do sono, mas sim maus hábitos em relação ao mesmo. A higiene do sono, ou seja, os cuidados ou rotinas que temos com o sono no momento de dormir, mas também ao longo do dia, determinam a qualidade do nosso sono.

“Dormir 7 horas por noite é suficiente para todas as pessoas”

A necessidade de sono varia com a idade e de pessoa para pessoa. As crianças necessitam de mais horas de sono, para sedimentar todas as novas actividades e aprendizagens durante o dia, mas na idade adulta habitualmente são necessárias pelo menos 7 horas de sono. Ainda assim, muitas pessoas precisam de mais tempo de sono (8-9h) para se sentirem recuperadas no dia seguinte. Além da duração, é também importante manter horários de sono regulares.

“O Sr. Presidente da República diz que só dorme 5 horas por dia. É normal?”

O Professor Marcelo Rebelo de Sousa é o que chamamos um “Short Sleeper”, ou seja, alguém que consegue dormir menos de 6 horas por dia e sentir-se bem. Este fenómeno é uma variante do normal rara e que, mesmo sendo normal, tem vindo a ser associada a algum risco cardiovascular acrescido. A maioria das pessoas que dizem que dormem pouco e acham que ficam bem são, na sua maioria, indivíduos com privação crónica de sono e que vão progressivamente sofrere consequências graves para a saúde.

“Pratico exercício físico à noite para ficar mais cansado e dormir melhor”

A prática de exercício físico tem inúmeros benefícios para a saúde e, também, para o sono. É importante escolher praticar o exercício pela manhã ou durante o início da tarde, já que ao final da tarde devem ser evitadas actividades muito estimulantes, de forma a iniciar a preparação do sono. A libertação de hormonas que acontece durante o exercício físico e o aumento da temperatura deixam-nos demasiado activos e são prejudiciais ao sono. Devem preferir-se actividades calmas, como uma leitura ligeira ou a prática de meditação e o convívio familiar ou com amigos.

“A televisão no quarto ajuda-me a adormecer”

Existem pistas importantes para o nosso cérebro perceber que nos preparamos para dormir: como vestir o pijama, lavar os doentes e irmos para o quarto. Devemos ir para o quarto quando já temos sono e com o intuito de dormir. Neste sentido, não devemos ter televisão no quarto e evitar o uso de dispositivos electrónicos ou muita luz neste momento. O impacto da televisão não é apenas a luz, que interfere claramente na produção de melatonina, mas também o conteúdo do que vemos ou ouvimos e o impacto disso na nossa actividade cerebral e nas nossas emoções, alterando o padrão de sono e aumentando, por exemplo, o bruxismo.

“ Se tenho problemas de insónia devo fazer medicação”

As pessoas com dificuldade em adormecer ou em manter o sono durante a noite têm frequentemente consequências diurnas importantes, como falta de atenção, dificuldades de concentração com risco de acidentes ou maior irritabilidade. A auto-medicação, mesmo que seja “natural”, é muito frequente mas acarreta riscos importantes já que, muitas vezes, não corrige os principais problemas na origem da insónia e causa efeitos adversos importantes aos doentes. Quem tem problemas de insónia deve procurar ajuda médica numa Consulta de Sono para que possa ser tratado, quer com medicação de forma pontual, quer com o recurso a terapia cognitivo-comportamental, que permite a correcção de hábitos errados de sono e a desmistificação de algumas ideias. Não se esqueçam que somos animais de hábitos. Mas somos os únicos animais que contrariamos os nossos hábitos e que nos forçamos a não dormir.

“Ressonar é normal e não me devo preocupar”

O ressonar é muito frequente e pode ser, muitas vezes, o primeiro sinal de uma apneia do sono. Mas mesmo na ausência de apneia, a roncopatia simples causa importante disrupção do seu sono e do sono do parceiro e deve, por isso, ser avaliada e tratada. Sabemos que o ressonar pode ser o início de uma cadeia de eventos que leva à doença da apneia do sono e, consequentemente, à redução da esperança de vida, pelo que é importante estar atento.

"Não posso fazer nada para parar de ressonar?"

Para o tratamento do ressonar temos várias hipóteses, dependendo da causa, mas os tratamentos podem ser tão simples (e normalmente combinados) como perder peso, usar um aparelho intra-oral ( dispositivo de avanço mandibular ) ou avaliação e gestão da forma como respiram durante o sono.

"O meu filho ressona, mas disseram-me que ia passar"

Não é normal ressonar, nem nos adultos, nem nas crianças. O ressonar perturba o sono da criança, sendo um sinal de que o sono não é recuperador, interferindo na

aprendizagem e comportamento da criança. Em casos mais graves (mas relativamente frequentes), o ressonar pode significar uma apneia de sono, que é altamente prejudicial para o desenvolvimento social, emocial e cognitivo da criança.

"Os homens ressonam mais que as mulheres"

Neste momento, pelo que sabemos esta afirmação é verdade em idades mais jovens, dependendo de algumas situações como o peso ou mesmo a forma da via área, mas esbate-se na altura da menopausa. A partir daí, e em relação com as alterações hormonais, as mulheres igualam os homens no ressonar e na apneia do sono. Por isso, se nunca ressonou e começou agora, consulte um médico de sono para avaliar.

“Se tenho uma apneia de sono tenho de fazer oxigénio”

A apneia do sono consiste no colapso repetido da via aérea superior causando paragens respiratórias e não se trata com oxigénio. Os principais riscos desta doença são cardio e cerebrovasculares, como a hipertensão mal controlada, o enfarte agudo do miocárdio ou o acidente vascular cerebral (AVC). O tratamento da apneia do sono grave consiste num ventilador (CPAP) durante a noite, que envia pressão para a via aérea do doente através de uma máscara na face e, assim, previne as paragens respiratórias. Nos doentes que não consigam usar o CPAP ou em casos menos graves de apneia está recomendado usar um dispositivo de avanço mandibular (aparelho nos dentes removível em cima e em baixo), feito à medida de cada doente pelo seu médico dentista, e que aumenta o espaço da via aérea e diminui as paragens respiratórias.

“Se eu não sinto nada durante o sono não posso ter nenhum problema”

Alguns sinais podem ser detectados apenas pelo parceiro do doente, como o ressonar e o parar de respirar (no caso da apneia do sono), o ranger os dentes durante a noite (no caso do bruxismo) ou os comportamentos estranhos durante o sono (como no sonambulismo). Nestes casos é importante marcar uma Consulta de Sono e ir acompanhado pelo parceiro. Não imaginam o que fazem à noite e não sabem!

“O bruxismo não tem de ser tratado”

O bruxismo (ranger e ou apertar os dentes durante o sono ou mesmo durante o dia) tem inúmeras consequências como a sensibilidade dentária excessiva e o desgaste prematuro dos dentes, a dor e inflamação dos músculos envolvidos na mastigação, dores de cabeça e problemas na articulação temporomandibular (ATM), como estalidos ou bloqueios da boca resultantes da falta de lubrificação da ATM. O bruxismo pode ainda significar apneia de sono ou refluxo gastroesofágico ou, ainda, algum nível de ansiedade ou depressão. Por isso, é importante procurar ajuda em consulta de Medicina Dentária com um especialista em bruxismo para uma correcta avaliação e tratamento com goteiras (dispositivos intra-orais) que evitam o contacto entre os dentes e o seu desgaste ou dispositivos de avanço mandibular.

Um artigo da médica Vânia Caldeira, Pneumologista e especialista em Medicina Sono, e do médico dentista André Mariz de Almeida, do Departamento de Sono da Clínica Hugo Madeira.

Veja ainda: Dormir a sesta? 15 razões científicas para fazê-lo