A saúde visual herda-se. Legitimada pela ciência ao longo dos últimos séculos, esta ideia é fundamentada por problemas como a miopia, o astigmatismo e a hipermetropia. Nessas patologias, a componente hereditária é determinante, mas deixa de fora o papel do meio ambiente e do estilo de vida para potenciar ou atenuar a expressão genética das doenças oculares, que não pode ser menosprezada. Apesar dessa influência, não faltam comportamentos preventivos que devemos adotar no quotidiano.

Neste artigo, centramo-nos naquilo que cada um pode fazer para preservar a qualidade da sua visão, já que, como afirma o médico oftalmologista Luís Gouveia Andrade, "vale a pena tudo fazer para poupar os nossos olhos, estimá-los e utilizá-los nas melhores condições possíveis". Até porque, sem eles, não veria o mundo da mesma forma. Numa época em que não vivemos sem ecrãs de telemóveis, tablets, computadores e televisões, a luz azul emitida por estes dispositivos também nos impacta.

Cuidados a ter no trabalho

Os computadores, os televisores, os tablets, os telemóveis e até os eletrodomésticos com ecrãs eletrónicos têm fama de serem inimigos dos olhos mas, com conta, peso e medida, "não está demonstrada uma relação direta entre esse uso e algum tipo de doença ocular", afirma Luís Gouveia Andrade, médico oftalmologista. De acordo com a organiação americana American Academy of Ophtalmology (AAO), o uso prolongado destes equipamentos "não causa danos permanentes nos olhos".

"Mas pode secá-los e cansá-los", alerta, contudo, este organismo. O descanso é, por isso, uma das chaves para a saúde visual, antes, durante e depois do trabalho. "É útil não manter os olhos muito tempo focados à mesma distância, sobretudo para o perto, de modo a não sobrecarregar os músculos que executam a focagem", refere Luís Gouveia Andrade. "Focar ao perto e ao longe ao longo do dia minimiza o cansaço visual e garante um melhor funcionamento desses músculos", recomenda.

Cuidados a ter em casa

Para além de fazer pausas regulares quando lê, escreve ou trabalha com dispositivos eletrónicos, dormir o suficiente é essencial para salvaguardar a sua saúde ocular. "Quando se dorme menos do que o necessário, os olhos podem ficar irritados. A irritação continuada pode causar inchaço e infeção dos olhos, sobretudo se usa lentes de contacto", alerta a AAO. Os cuidados cosméticos dos olhos são também determinantes. As glândulas sebáceas das pálpebras segregam gordura que protege o olho.

Para evitar que bloqueiem, nunca deve aplicar maquilhagem abaixo da linha das pestanas, um erro que muitas mulheres cometem. Muitos oftalmologistas aconselham ainda os que os usam a não partilharem produtos de maquilhagem, a remover a pintura (sobretudo a máscara) antes de dormir, a evitar o contacto do desmaquilhante com o interior dos olhos e a introduzir apenas um novo produto de cada vez para que, em caso de reação alérgica, o elemento causador seja mais fácil de identificar.

Cuidados a ter à mesa

Não é toa que se ouvimos desde pequenos que a cenoura faz bem aos olhos. Uma alimentação variada não devolve capacidade de visão a quem a perdeu nem cura problemas oculares, mas a ciência sugere que reduz o risco de problemas associados à idade, como a degenerescência macular, as cataratas e a secura ocular. Pode ser também decisiva para afastar a diabetes, a hipertensão arterial e os problemas cardiovasculares, três dos fatores de risco mais importantes para problemas visuais.

"As vitaminas A, C e E, a fruta e os vegetais são os componentes-chave de uma boa função visual", refere Luís Gouveia Andrade. Citrinos, óleos vegetais, nozes, grãos integrais, vegetais de folha verde e peixes de água fria são algumas das opções mais benéficas, tal como o zinco, a luteína, a zeaxantina e o ómega-3. A saúde visual pode ainda ser protegida com recurso a suplementos de ácido fólico e de vitaminas B6 e B12. Informe-se previamente acerca de possíveis riscos e contraindicações.

Cuidados a ter ao ar livre

Em excesso, a exposição solar também afeta a visão. "Pode causar lesões mais superficiais como uma conjuntivite, uma queratite ou uma alergia, mas também mais profundas, como as cataratas e a degenerescência da mácula, pelo que é importante utilizar óculos de sol com a proteção adequada para que a radiação ultravioleta não possa lesar as células dos olhos", recomenda Luís Gouveia Andrade. "O impacto será tanto maior quanto mais prolongada e intensa for a exposição", adverte.

Use sempre óculos polarizados quando praticar desportos náuticos. Nas aventuras aquáticas, é útil recorrer a óculos de natação, pois o sal e o cloro "podem causar irritações ou fenómenos alérgicos e o cloro pode secar os olhos", alerta ainda o especialista, que desaconselha o uso de lentes de contacto na praia. "A sua superfície porosa facilita a aderência de impurezas e de microrganismos presentes na água, que são capazes de provocar uma infeção grave", alerta ainda o médico.

Cuidados a ter no oculista

Os óculos ideais devem ter sempre armações leves e lentes orgânicas. Apesar de parecer insignificante aos leigos, há uma explicação plausível para esta recomendação. "O vidro é mais pesado e pode partir-se, danificando os olhos", avisa o oftalmologista. Nas lentes dos óculos de sol, "a cor castanha é a mais confortável e a proteção contra a radiação ultravioleta [UV] deve ser próxima dos 100%. Uma armação generosa permite uma proteção melhor", explica Luís Gouveia Andrade.

"As lentes com tratamento anti-reflexo são úteis para quem trabalha em espaços fechados, com luz artificial. Serem anti-risco é pouco importante, uma vez que não substituem a utilização cuidadosa dos óculos", esclarece o médico. O material de que são feitas as lentes de contacto é, por norma, muito frágil. "Permite facilmente a implantação de bactérias e de outros microrganismos que podem causar infeções, sendo esse risco tanto maior quanto menos cuidado se tiver na utilização", diz.

Por minimizarem estes fatores, as lentes de contacto diárias são, na opinião do oftalmologista, "a opção ideal, desde que usadas no máximo entre oito a dez horas por dia e respeitando os prazos de validade", ressalva, todavia, Luís Gouveia Andrade. Se tem antecedentes de alergias ou costuma ter pouca lágrima, não deve usar lentes de contacto. Consultar regularmente um oftamologista para uma avaliação é outra dos conselhos do especialista. Em Portugal, são, todavia, poucos os que o fazem.

Texto: Rita Miguel com Luís Gouveia Andrade (médico oftalmologista)