Houve um aumento considerável no número de pessoas que decidiram alterar a sua dieta para uma que não inclua produtos de origem animal ou derivados nos últimos dez anos. Com as preocupações sobre o impacto da pecuária no meio ambiente, combinadas com as alegações de que o veganismo pode ser benéfico para a saúde, o número de veganos duplicou na Europa e nos Estados Unidos da América na última década.

Contudo, existe um fator que parece aumentar significativamente as hipóteses de abandonar completamente a dieta omnívora. E é ser mulher.

Mas porquê?

Os psicólogos mostram-se muito atentos a este fator. Uma das possibilidades está relacionada com a “masculinidade precária”, isto quer dizer que os homens estão constantemente preocupados em manter a virilidade, portanto, sentem a necessidade de provar isso em todas as oportunidades. Por exemplo, quando os homens são ‘obrigados’ a fazer algo mais ‘feminino’, como fazer uma trança no cabelo de uma boneca, tendem a querer exibir a sua virilidade depois.

Steven Heine, psicólogo da University of British Columbia, sugere que este ‘obstáculo’ se deve, em grande parte, à História.

“A carne sempre foi associada ao perigo e ao desafio, porque era necessário caçar para obtê-la. Além do estatuto, porque era um alimento valorizado nas nossas sociedades patriarcais, então os homens queriam a carne para eles”, disse, em declarações à BBC.

Também se acredita que foi perpetuado pelo marketing. A partir do século XIX, quando se tornou socialmente aceitável que existissem ‘jantares de mulheres, os responsáveis de marketing e publicidade tiveram que distinguir os alimentos para um público feminino outro para o masculino. Resultado: sobremesas requintadas e saladas deliciosas para mulheres, enquanto o bife era para homens.

Se analisarmos o atual período, vai observar que as mesmas visões são passadas de gerações em gerações. Milhares de gerações levam-nos a associar carne à masculinidade, por isso é expetável que os homens sejam mais relutantes ao veganismo, com receio de obter uma reação intimidante ao seu redor.

O Dr. Michael J. Richardson, professor de Estudos Humanos na Universidade de Newcastle, está a fazer um estudo sobre a relação entre carne e masculinidade, referindo que a maneira como as pessoas reagem a este ‘desafio à masculinidade’ pode variar.

O mistério por detrás da razão pela qual existem mais mulheres veganas do que homens
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“Como qualquer outro desafio às estruturas da masculinidade hegemônicas, quando existe uma ‘transformação vegana’, as acusações imediatas de fraqueza e homossexualidade vêm à tona.”

Insultos como soy boy [menino de soja na tradução literal], servem para descrever “homens com uma carência completa de todas as qualidades masculinas necessárias”. Isto está ainda relacionado com a ligação (cientificamente não comprovada) entre o consumo excessivo de produtos de soja e os danos ao físico e à libido masculina.

Durante a sua pesquisa, Heine descobriu que apenas listar os alimentos vegetarianos de que uma pessoa gosta pode ser o suficiente para fazê-los parecer menos masculinos. Sabendo disso, “talvez alguns homens estejam preocupados com o que pensarão se pedirem uma salada num restaurante”, diz o professor.

Margaret Thomas, psicóloga do Earlham College, no estado de Indiana, EUA, descobriu que os veganos são vistos como menos masculinos - mas apenas se for esta a perspetiva que querem ter deles próprios.

A razão pela qual há mais mulheres veganas não se resume apenas à virilidade do homem. Estudos mostram que as mulheres são mais compassivas no geral e particularmente quando se trata de animais. É mais provável que o sexo feminino tenha mais sensibilidade quanto aos abusos e preferência na aquisição de animais de estimação.

Por fim, há a "teoria da dominância social", em que é mais apelativo para os homens comerem carne porque os lembra da dominância da espécie sobre os animais, reforçando assim o sentimento de superioridade.

Em Portugal, existem poucas pesquisas credíveis sobre o veganismo, muito menos quanto à diferenciação de género. Porém, um estudo da consultora Nielsen, divulgado em 2018, mostrou que nos últimos dez anos o número de vegetarianos [diferente de veganismo] quadruplicou. Estima-se serem cerca de 120 mil portugueses, o que corresponde a 1,2% da população.