Stephan Ray Sansom nasceu numa quinta perdida no interior dos EUA, em Ottumwa, no Iowa, em 1955. Aos 16 anos, sempre que conseguia, fugia para Chicago. Foi lá que começou a trabalhar como DJ com o coletivo musical The Devil Dogs. Tinha acabado de concluir o ensino secundário quando os pais, desconfiados, o confrontaram com a sua sexualidade. Depois de lhes confirmar que era homossexual, puseram-no fora de casa. Stephan Ray Sansom pegou no que podia e apanhou um autocarro para Nova Iorque.

Na carteira, levava apenas 300 dólares, menos de 240 euros. O cabelo ruivo, os olhos cor de avelã e as sardas na cara a contrastar com a pele clara faziam muitos dos que se cruzavam com ele nas ruas de West Village desviar os olhos. Para sobreviver, entregava encomendas de bicicleta e estudava contabilidade durante o dia e traficava droga durante a noite. No fim do curso, começou a trabalhar como contabilista e, numa altura em que a sida ainda era tabu, foi voluntário numa associação que apoiava infetados.

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No dia 1 de dezembro de 1989, depois de participar numa vigília de alerta contra a doença, regressou a casa, de mãos dadas, com o namorado, Kendel Smith. "Falámos de amor, do bem que estávamos e da vontade que tínhamos de envelhecer juntos. Nessa altura, olhámo-nos nos olhos e ele começou a chorar. Baixou a cara e revelou-me que tinha acabado de saber que tinha testado positivo e que estava infetado com o vírus da imunodeficiência humana (VIH)", recorda o ex-companheiro de Stephan Ray Sansom. Três anos depois, em dezembro de 1992, morria em casa, nos braços de Kendel Smith, sem saber que o tinha infetado. "Nunca lho disse. Não queria que se sentisse culpado", revelaria mais tarde.

"Cheguei a 1995 com sete linfócitos T. Por norma, temos entre 400 e 1.500", refere o norte-americano. A história de Stephan Ray Sansom não difere muito das de Ritchie Tozer, Colin Morris-Jones, Henry Coltrane e David Carlyle, personagens que, em "It's a sin", a nova produção da plataforma digital HBO, uma das séries de grande sucesso da atualidade, estreada em Portugal no final de janeiro, se veem, de repente, no Reino Unido, confrontados com uma doença misteriosa sobre a qual pouco ou nada se sabia.

Nas redes sociais, no perfil The Aids Memorial, antigos companheiros, familiares e amigos recordam vítimas que a sida matou. Ao contrário do que muita gente julga, não foram só homossexuais que morreram na sequência de problemas de saúde agravados pela patologia viral. As irmãs gémeas Ginger e Tracy Foster, nascidas em 1989, foram infetadas pelos pais e abandonadas pouco depois dos progenitores saberem que tinham VIH. Uma morreu com cinco anos. A outra ainda não tinha feito os 11 quando faleceu.

Rachel Humphreys, transgénero que namorou com Lou Reed e que surge na capa do disco "Walk on the wild side: The best of Lou Reed", que o cantor, compositor, músico e poeta lançou em 1977, é outra das figuras recordadas no The Aids Memorial. A causa da morte nunca foi revelada mas os amigos próximos nunca tiveram dúvidas. O Saint Clare's Hospital, em Hell's Kitchen, em Manhattan, em Nova Iorque, onde morreu no dia 30 de janeiro de 1990, era um dos locais para onde os doentes com sida eram enviados.

Debbie Lynn Kellner foi outra das vítimas da doença. Nascida no seio de uma família que vivia em condições de extrema pobreza, tinha 21 anos quando foi infetada pelo homem, que tinha acabado de sair da prisão e vivia na rua, pelo qual se apaixonou e que depois a violentava. Graeme McEwen teve mais sorte ao amor. Enamorou-se por Gregory Graveline, com quem viveu sete anos. "Fomos muito felizes, tirando os últimos seis meses de vida dele, doente numa cama de hospital", recorda, hoje, o ex-companheiro.

O ativista Bill Kraus e o ator Joel Crothers, que nunca assumiu a homossexualidade, são outras das (muitas) vítimas da sida, tal como James Harning. "Ele foi um dos poucos norte-americanos que conheci que gostava de beber chá", recorda Mark Mitchinson, o colega britânico que se transformaria, pouco depois, num dos seus maiores amigos. Tal como alguns dos infetados que surgem nos cinco episódios de "It's a sin", também ele sofreu com as marcas do sarcoma de Kaposi, uma das manifestações da patologia viral.