Compostos químicos libertados durante o processo de degradação do plástico podem reprogramar as células da próstata durante o desenvolvimento fetal e neonatal, aumentando o risco dos filhos de mães expostas de desenvolver cancro da próstata quando envelhecerem. É o que mostra um estudo feito com roedores no Instituto de Biociências de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (IBB-Unesp), no Brasil.

O trabalho foi conduzido pela doutoranda Ariana Musa de Aquinobolsista da FAPESP no Programa de Pós-Graduação em Biologia Geral e Aplicada, sob a orientação do professor Wellerson Rodrigo Scarano. Os resultados foram divulgados na revista científica Chemosphere.

Com base em dados já disponíveis na literatura científica, a experiência teve o objetivo de mimetizar a exposição humana aos chamados ftalatos – compostos químicos usados para dar maleabilidade ao plástico. Para isso, ratos fêmea gestantes foram expostos a uma mistura de seis diferentes ftalatos, preparada de acordo com a proporção observada no sangue e na urina de mulheres grávidas. Segundo os autores, a concentração usada no estudo assemelha-se à existente no ambiente doméstico.

“Os ftalatos têm a capacidade de desregular o sistema endócrino e o desenvolvimento normal de órgãos como a mama e a próstata. Com isso, a nossa hipótese era de que a influência dessas substâncias num momento tão importante como a gestação e a lactação, no qual a próstata está a desenvolver-se, poderia aumentar a chance de os indivíduos desenvolverem doenças prostáticas durante o envelhecimento. Tal hipótese surgiu a partir de estudos anteriores feitos pelo grupo que mostravam que a próstata dos animais tratados era menos desenvolvida ao nascimento e na pré-puberdade”, explicou o professor Scarano à Assessoria de Imprensa do IBB.

Aproximadamente 38% dos descendentes machos expostos aos resíduos químicos através do organismo materno desenvolveram tumores quando envelheceram, em diferentes graus de comprometimento. Os resultados mostraram que houve reprogramação molecular por meio de mecanismos epigenéticos durante o desenvolvimento da próstata dos roedores, o que aumentou a suscetibilidade ao adenocarcinoma in situ, um tipo de tumor maligno ainda localizado (fase inicial).

Cientistas do mundo inteiro têm estudado as repercussões que alterações nutricionais, farmacológicas e de exposição ambiental durante a gestação e a infância podem ter sobre o indivíduo quando ele se torna adulto.

“O estudo foi desenvolvido em ratos, mas acende a luz vermelha sobre um dos maiores problemas de saúde pública mundial, que é a acumulação de lixo plástico nos rios, oceanos e no solo. Parte desse lixo plástico se decompõe para formar os micro e nanoplásticos e todos os aditivos usados na sua fabricação são libertados nesses ambientes, incluindo os ftalatos. Com isso, os seres humanos são expostos pelo ar, pela água e pelos alimentos ingeridos contendo partículas derivadas dos plásticos. A investigação sobre os efeitos dos resíduos plásticos sobre a saúde continua em andamento e com certeza trará mais resultados”, acrescentou Scarano.

A investigação contou com colaboradores da Universidade de Illinois e da Universidade Harvard, ambas nos Estados Unidos.

O artigo Integrated transcriptome and proteome analysis indicates potential biomarkers of prostate cancer in offspring of pregnant rats exposed to a phthalate mixture during gestation and lactation pode ser lido em: www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0045653523022890.