Vivemos uma fase especialmente difícil em que ao risco da pandemia COVID-19 se soma o risco do medo. Como é sabido, os doentes cardiovasculares e em especial os que têm insuficiência cardíaca apresentam especial fragilidade e por isso a recomendação de se protegerem deve ser tomada à risca, permanecendo em casa sempre que possível, e adotando cuidados de proteção máxima em caso de saírem.

A falta de cuidado, o incumprimento das recomendações, o achar que “não é bem assim porque me sinto bem” ou que “não estou assim tão mal”, as distrações em relação às medidas de proteção, podem ser muito perigosas. Os mais disciplinados e os mais atentos, provavelmente serão mais facilmente vencedores desta verdadeira guerra contra o vírus. Siga algumas recomendações muito práticas:

1. Não abandone nem suspenda a terapêutica

Os fármacos para a insuficiência cardíaca não devem nunca ser suspensos. Atualmente, já existem sistemas de apoio que levam até casa todos os medicamentos necessários, sem que precise de se deslocar à farmácia.

Outro aspeto que deve ser clarificado é que não há nenhuma evidência científica que comprove que algum fármaco utilizado no tratamento da insuficiência cardíaca, na hipertensão ou em qualquer outra situação cardiovascular aumente o risco de infeção por COVID-19. Além disso, também não está comprovado que o vírus atenua a ação de algum dos fármacos que são utilizados para o tratamento da Insuficiência Cardíaca.

Por isso, tome sempre a medicação sem qualquer receio, até porque a alteração de toma por sua iniciativa poderá levar a um agravamento da doença. 

Há por vezes necessidade de ajustes na medicação, mas esses só podem ser determinados ou validados pelo médico ou equipa de saúde.

2. Vigie o peso

O peso nos doentes com IC é particularmente importante. Um aumento significativo de peso, por exemplo 2kg, em dois ou três dias, pode indicar que a pessoa está fazer retenção de líquidos e isso pode significar o início de descompensação.

Assim, pese-se diariamente sempre nas mesmas circunstâncias, isto é, tentando fazê-lo sempre à mesma hora, com o mesmo tipo de roupa ou sem, mas mantendo sempre esse padrão. Se registar alterações significativas, conforme mencionado acima, deverá entrar em contacto, mesmo à distância, com o seu médico assistente ou com a equipa médica que o acompanha.

3. Não tenha medo nem hesitação em pedir ajuda

A pandemia não interrompe as outras doenças que continuam a manifestar-se. A recomendação de permanecer em casa pode inibir as pessoas de pedir ajuda ou atrasar esse pedido de ajuda e ficar “à espera que passe”. Em caso de sintomas suspeitos de situações cardíacas agudas - dor no peito, falta de ar aguda ou perda da consciência - ligue o 112, com o o faria antes da pandemia. O INEM tem equipas que podem atuar de imediato se surgir uma complicação e o levarão para setores seguros dos serviços de urgência. se sentir que algo não está bem consigo.

Preocupa-nos a diminuição que tem havido de urgências cardíacas porque elas não desapareceram: nalguns casos corre mal e a pessoa descompensa e pode mesmo morrer; noutros a situação pode evoluir para crónica mas com sequelas que podem comprometer a qualidade de vida e mesmo a sobrevivência a médio prazo.

Nas situações crónicas é muito importante manter o contacto com o cardiologia ou equipa de saúde, de forma a avaliar a evolução clínica e evitar agravamentos. Nestas, além da vigência de peso e de tomar rigorosamente os medicamentos prescritos, é muito importante uma alimentação saudável, com pouco sal e tentar fazer algum exercício, mesmo em casa.

4. Siga as recomendações gerais da DGS

Não deve sair de casa, mas se por motivos de força maior tiver que o fazer, é obrigatório que use uma máscara. Deve fazer uma lavagem repetida das mãos com gel alcoólico ou com água e sabão, mesmo estando em casa, e obrigatória ao sair e sempre que vem da rua. Quando receber compras é essencial que também lave os alimentos, bem como as embalagens laváveis.

Por fim, e talvez a mais difícil, é fundamental que evite o contacto físico com os seus familiares ou amigos. As crianças, felizmente são pouco afetadas pelo vírus mas podem ser portadores e transmiti-lo, embora se sintam em perfeita saúde. Não esqueçam!

Estas e outras dúvidas foram esclarecidas no webinar da Sociedade Portuguesa de Cardiologia e da Associação de Apoio aos Doentes com Insuficiência Cardíaca no passado dia 23 de abril. Se não teve a oportunidade de assistir à sessão de esclarecimento em direto, pode vê-la em qualquer altura, bastando para tal aceder ao Facebook da AADIC, onde o vídeo da sessão está disponível.

As recomendações são do médico Victor Gil, especialista em Cardiologia e presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia.