Foram Cary Grant e Randolph Scott um dos casais gay de Hollywood? Ainda há menos de um ano a revista canadiana Zoomer voltava a lançar a interrogação! Os dois populares atores norte-americanos viveram juntos durante mais de 11 anos, partilhando o quotidiano entre uma casa de praia em Santa Monica e uma mansão no bairro de Los Feliz, em Los Angeles, nos EUA, na década de 1930, mas, por causa do período opressor, conservador e moralista, em que viviam, nunca assumiram a relação amorosa.

Não podiam. Os estúdios nunca lhes perdoariam e a opinião pública também não. Ao contrário do que "Hollywood", a nova série de êxito da plataforma digital Netflix mostra, ser gay ou lésbica naquela altura era tudo menos fácil e, nesta indústria, que vivia muito das aparências, essa dificuldade era ainda maior. A descoberta desse segredo representava, à partida, o fim de todas as ambições artísticas, pelo que, à semelhança de Cary Grant e Randolph Scott, inúmeros artistas tiveram de viver uma mentira.

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A lista inclui celebridades como Marlene Dietrich, Janet Gaynor, Anthony Perkins, Montgomery Clift ou ainda Tab Hunter, que se conseguiram resguardar, ao contrário do que sucedeu com os três protagnistas dos escândalos sexuais em 1931. Os mais puritanos ficaram chocados com as revelações sobre as vidas íntimas das atrizes Clara Bow e Mary Astor, tornadas públicas no ano que o realizador alemão F. W. Murnau, que tinha emigrado para os EUA, morreu, com 42 anos, num aparatoso acidente de automóvel que viria a fazer correr muita tinta.

Segundo a imprensa local, no momento do embate, o carro em que seguia estaria a ser conduzido pelo assistente do alemão, um filipino de apenas 14 anos. F. W. Murnau estaria a fazer-lhe sexo oral. Nas semanas seguintes, vários grupos religiosos manifestaram-se publicamente contra o ambiente libertino que se vivia em Hollywood e ameaçaram mesmo boicotar os novos lançamentos cinematográficos em preparação. Em 1934, para acalmar os ânimos, foi criado um código de conduta.

De acordo com as novas regras, os artistas tinham de passar a ser modelos de conduta não apenas dentro mas também fora do grande ecrã. Para além de virilidades exacerbadas, passaram também a ser (muito) comuns as feminilidades extremas. O agente de Roy Fitzgerald, um camionista que se converteria numa das estrelas maiores de Hollywood, obrigou-o a adotar Rock Hudson como nome artístico, porque era mais viril. Para calar os rumores de homossexualidade, forçou-o a casar-se.

O matrimónio com a sua secretária, Phyllis Gates, duraria apenas um ano e foi o único casamento do ator. Durante a rodagem de "O gigante", estreado em 1956, Rock Hudson e a atriz Elizabeth Taylor terão chegado a apostar qual deles é que conseguiria levar James Dean, outro dos protagonistas, para a cama. Marlene Dietrich usava, segundo as próprias palavras da filha Maria Riva, o sexo como instrumento de poder para controlar os homens mas eram as mulheres que a realizavam sexualmente.

No momento em que decidiu ser ator, Archibald Leach percebeu que não podia ser como era. Para isso, criou Cary Grant, o alter ego com uma masculinidade forçada que apaixonava as mulheres. Namorou nove anos com o estilista Orry Kelly antes de se envolver com Randolph Scott, como pode (re)ver de seguida. O ator negou sempre os rumores de homossexualidade mas chegou a fazer uma produção para uma revista com o alegado colega. Casou cinco vezes para disfarçar. O amigo duas.

O italiano Rodolfo Valentino, o primeiro símbolo sexual masculino, personalizava a figura do amante latino mas, segundo os rumores, era homossexual e o casamento com a atriz Jean Acker, que seria lésbica, apenas um acordo de conveniência. Montgomery Clift, atormentado pelos seus demónios, também foi incapaz de assumir a sua homossexualidade. Apesar dos vários romances que lhe foram conhecido, nunca se deu sequer ao trabalho de casar para manter as aparências.

Já depois da sua morte, a amiga Elizabeth Taylor confirmaria publicamente, em 2000, que Montgomery Clift, que durante a rodagem de "Freud" teria tido relações sexuais com outro homem no castelo que o realizador John Huston possuía na Irlanda, era gay. Idolatrado pelas mulheres, Tab Hunter também viveu uma relação de fachada. Um dos estúdios com quem tinha assinado contrato obrigou-o a assumir um relacionamento amoroso com Natalie Wood, uma atriz em ascenção.

Numa primeira fase, o ator anuiu mas, depois, preferiu romper com o empregador e emigrar para a Europa, onde viria a viver um romance com o bailarino russo Rudolf Nureyev. Anos mais tarde, na rodagem de um filme, conheceria Allan Glaser, com quem estaria 35 anos, até morrer, em 2018. Anthony Perkins, outro dos gays de Hollywood, lidava mal com a homossexualidade, ao ponto de ter sido submetido a tratamentos agressivos que alegam conseguir curá-lo.

Enquanto namorou com Tab Hunter, a Warner Bros. pediu-lhe(s) apenas recato e discreção mas a Paramount Pictures não foi tão indulgente, exigindo a Anthony Perkins que pusesse fim à relação. Cansado de lutar contra aquela que era a sua natureza, o ator perdeu a virgindade com mulheres aos 39 anos, com a atriz Victoria Principal, que viria depois a brilhar na série de televisão "Dallas". Dois anos depois, casou com a sua melhor amiga de infância, Berry Berenson.

Viriam a ter dois filhos mas a morte do ator, vítima de sida em 1992, deixa supor que nunca teria deixado de se relacionar intimamente com outros homens. Berry Berenson morreria em 2001. Seria uma das vítimas dos atentados de 11 de setembro em Nova Iorque. Depois da morte do marido, perguntaram-lhe se sabia(m) como é que tinha sido infetado com VIH, a neta da estilista Elsa Schiaparelli e sobrinha do historiador e negociante de arte Bernard Berenson, foi evasiva.

Janet Gaynor, a primeira mulher a ganhar um Óscar de Melhor Atriz, com apenas 22 anos, preferiu abandonar a carreira 10 anos depois a ter de ver a homossexualidade exposta. Em 1938, apenas um ano depois de ter participado na versão original de "Assim nasce uma estrela", que Bradley Cooper recuperou com Lady Gaga como protagonista, largou tudo para casar com um figurinista gay. Mais tarde, comprou uma fazenda ao lado da da atriz Mary Martin, com quem namorava.