Nasceu em Nampula, em Moçambique, mas formou-se em design de moda em Portugal. O seu primeiro ateliê, no Fundão, foi inaugurado em 1998. Anos mais tarde, o estilista abre a sua primeira loja, até hoje o principal ponto de produção e venda das suas criações. Apresenta-se pela primeira vez no Portugal Fashion em 2009 mas é na ModaLisboa que marca, atualmente, presença, apresentando sazonalmente as suas coleções.
A participação nas semanas de moda internacionais, a partir de 2015, traça a sua internacionalização que alcança, este ano, um novo patamar com a presença da marca que criou no Pavilhão de Portugal da Expo Dubai 2020. Entre as 45 marcas portuguesas presentes no certame, Carlos Gil foi o único designer de moda selecionado para representar o nosso país, que decorre entre 1 de outubro de 2021 e 31 de março de 2022.
O criador leva à concept store que desenvolveu para a exposição mundial algumas peças decorativas e também acessórios de moda pertencentes à coleção outono/inverno 2021/2022 que criou e que pode ficar a conhecer de seguida, com aplicações do cobertor de papa, uma peça artesanal, característica da região da serra da Estrela, fabricada integralmente à mão com lã churra, proveniente de ovelhas da raça mondegueira.
Como é que encarou este convite para participar num evento à escala mundial como a Expo Dubai 2020?
Foi com grande orgulho e satisfação que encarei esta seleção num mercado tão rigoroso e exigente. É sempre muito gratificante quando reconhecem o meu trabalho.
Foi o único designer de moda português a ser selecionado para participar neste evento, o que é uma responsabilidade acrescida. Sente esse peso ou encara-o como encararia outro trabalho qualquer?
Encaro-o como todos os trabalhos que realizo. Com dedicação, profissionalismo, qualidade e empenho. Mas representar Portugal com o que há de melhor é, sem dúvida, uma responsabilidade acrescida...
E porquê o cobertor de papa como uma espécie de bandeira da sua presença?
Senti a necessidade de me debruçar sobre algo que remetesse para a história da minha região. Foi cativante esta aprendizagem, pois esta é uma arte que pertence ao passado, mas tem espaço para o presente e uma visão para o futuro. Renovar, criar e sensibilizar são as palavras-chave que pertencem a este projeto.
Esta aposta em objetos decorativos que agora fez é pontual ou é um segmento a explorar mais num futuro próximo?
Este é um segmento que pretendo continuar a explorar. E há ainda tanto que se pode fazer... Crescer e dinamizar fazem parte da linguagem da marca Carlos Gil.
Portugal vai ter o seu pavilhão na área da exposição reservada à sustentabilidade. Como vê a questão ambiental pertencendo a uma das indústrias mais poluentes do planeta?
A Expo Dubai tem um pavilhão de sustentabilidade que se chama Terra. É um dos pavilhões com mais temáticas e onde todos os dias irão decorrer programas dedicados à sustentabilidade. Creio que o setor da indústria têxtil tem de sofrer grandes alterações. É cada vez mais necessário a intervenção do designer para alcançar uma melhor relação entre produto, ambiente e sociedade.
São conhecidas as suas preocupações em relação à necessidade de preservação do património cultural português. As preocupações sustentáveis também já fazem parte do planeamento e produção das suas coleções? A moda que faz já é, de algum modo, sustentável?
A marca Carlos Gil alinha-se na sustentabilidade ambiental pelos conceitos de slow fashion [moda de consumo lento associada a uma maior qualidade e durabilidade das peças] e zero waste [zero desperdício], além dos comuns que consistem em sustentabilidade social, económica e cultural, numa tentativa de dar resposta à situação que vivemos atualmente.
O slow fashion representa-se na marca através do método de criação e de produção em ateliê, que consiste num processo mais lento que representa uma maior qualidade e durabilidade, a fim de se dar sentido ou valor ao que é consumido. O zero waste também acontece em ateliê, onde a modelagem e o corte das peças são pensados e estudados com o maior rigor para evitar desperdício. Também colaboramos com as várias entidades da região, o que se reflete em sustentabilidade social e económica.
São estas uniões que juntam vários negócios da região e que fornecem, depois, uma abordagem completamente diferente daquela que aconteceria se fossem apenas entidades exteriores, pois, para além de estar em maior proximidade com a fonte e de ter uma abordagem mais direta, também é uma forma de dinamizar e de promover a região em que estamos inseridos.
A presença na Expo Dubai 2020 é uma porta aberta para o mundo para a marca Carlos Gil. Já existem projetos concretos no sentido de internacionalizar a etiqueta?
Todas as presenças internacionais são uma oportunidade para a marca Carlos Gil, uma vez que já comecei a minha internacionalização nestes mercados, o asiático e o árabe, há seis anos. A presença neste certame irá complementar a comunicação da marca de uma forma mais globalizada.
Vamos poder, assim, angariar novos clientes. Dar a conhecer o produto que criamos e os serviços que prestamos torna a marca mais credível na venda daquilo que comercializamos, que é a nossa moda. Para a Carlos Gil, a comunicação é o suporte fundamental para o sucesso da marca.
E, em Portugal, em que é que tem estado a trabalhar?
Naquilo que me propus há 23 anos... Trabalhar e corresponder ao desejo dos clientes. Só assim é que faz sentido e só assim é que me sinto realizado.
Enquanto criador de moda, segue sempre as tendências nacionais ou é mais apologista de um conceito de moda de autor? Procura fazer convergir uma coisa e outra ou prefere não se prender a conceitos estéticos que, muitas vezes, são impostos pelas grandes marcas mais comerciais?
Há uma preocupação em estabelecer uma ligação entre tendência de moda e consumidor. A minha globalização proporcionou-me um fluxo de trocas entre diversas culturas e localidades, seguindo sempre as tendências internacionais nos mercados a que me proponho. A marca procura sempre inovar e diferenciar-se mas, claro, nunca perdendo a sua identidade.
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