A dermatite atópica (DA) é a doença inflamatória crónica da pele mais comum, pertencendo ao espectro da atopia (que inclui asma, rinite alérgica e alergia alimentar). Cerca de 80% dos casos começam na infância, e os restantes durante a idade adulta. O curso natural da doença é bastante heterogéneo e as trajetórias individuais imprevisíveis, sendo a prevalência na infância entre 2,7% e 20,1% e na idade adulta entre 2,1% a 4,9%*.
A DA é caracterizada por pele sensível, vermelhidão e descamação, acompanhadas de prurido, com frequente perturbação do sono e consequentemente redução da concentração e dificuldade na aprendizagem nos pacientes mais jovens, assim como perturbação da produtividade laboral dos adultos.
Frequentemente desprezada, pela população e mesmo pela comunidade médica fora da dermatologia, a DA tem um impacto significativo na qualidade de vida dos pacientes e dos seus familiares, representando um importante encargo socioeconómico com um custo total médio anual (direto e indireto) por paciente de 15.000 euros*.
Até agora, no entanto, a DA tem sido considerada apenas como uma doença cutânea, na qual a terapia anti-inflamatória local das crises tem sido a abordagem de primeira linha. Os tratamentos tópicos usados incluem habitualmente, além dos emolientes, corticosteróides tópicos nas crises e inibidores da calcineurina na fase de manutenção.
Para as formas mais graves, os tratamentos sistémicos clássicos incluem fototerapia e fármacos que reduzem a resposta imune dos pacientes (imunossupressores) como: a ciclosporina, metotrexato, azatioprina e micofenolato mofetil.
Nos últimos anos assistimos a uma revolução terapêutica no tratamento da DA, semelhante à que assistimos nas décadas anteriores na psoríase. Têm surgido novos tratamentos (alguns já disponíveis e outros em desenvolvimento) que são mais dirigidos, seletivos, seguros e com melhores resultados que os tratamentos convencionais.
As aprovações do anticorpo anti-IL-4Rα dupilumab (2017 FDA/EMA) e dos anticorpos anti-IL-13 tralocinumab (2021 FDA/EMA) e lebricizumab (2023 EMA), assim como dos inibidores da janus quinase (JAKi) baricitinib (2020 EMA), upadacitinib (2021 EMA, 2022 FDA) e abrocitinib (EMA 2021, FDA 2022) forneceram representantes de primeira classe de diferentes estratégias terapêuticas para o tratamento de formas moderadas a graves de DA.
O dupilumab e tralocinumab são exemplos de terapias biológicas direcionadas que abordam especificamente uma via imunológica distinta e suas citocinas ou recetores, com perfil de segurança muito favorável, enquanto os JAKi exemplificam uma abordagem mais ampla usando pequenas moléculas que interagem com múltiplas vias de transdução de sinal ligadas a vários recetores de citocinas e sistemas imunológicos.
Apesar destes desenvolvimentos recentes, o arsenal terapêutico atual permanece limitado e a gestão da doença segue ainda um paradigma de “one size fits all”. Em particular, a elevada incidência de DA na população pediátrica, em que o curso da doença é altamente flutuante e imprevisível e são poucos os medicamentos aprovados com uma relação risco-benefício adequada, representa um grande desafio neste campo.
Assim sendo, é necessária uma melhor compreensão dos mecanismos subjacentes à DA e da multidimensional interação dos fatores ambientais, microbioma cutâneo, disfunção da barreira epidérmica e resposta inflamatória/ imune. Este conhecimento poderá fornecer uma variedade de novos alvos e estratégias, o que idealmente se poderá traduzir no futuro por uma gestão otimizada e modificadora da doença a longo prazo.
Controlo a longo prazo da dermatite atópica: realidade ou utopia?
Rita Travassos, Médica Especialista em Dermatologia e Medicina Estética; Dermatologista na ULS Santa Maria e Hospital CUF Descobertas
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