“Coronavírus_oficial” podia ser o Instagram do fenómeno do momento porque, quando alguém se torna uma figura pública, os nomes das redes sociais fazem parecer que se alistou no exército. Quer gostássemos, quer não, iríamos lá espreitar. É da condição humana a curiosidade pela desgraça. Como nos velórios. Há uma parte de nós que vai lá pela comparação. O que fomos, como ficamos, o que éramos e o que somos, onde estamos e ao que voltamos.
Teria milhões de seguidores, mesmo que os comentários fossem carregados da ira de quem desabafa com quem os força à quarentena. Sejamos sinceros: o vírus tem feito tudo bem e subido a pulso. Tem mérito, caramba. É aquele imigrante que se conseguiu afirmar e ter um impacto à escala mundial. Sem escrúpulos, é certo, com a velha máxima de “falem bem ou falem mal, mas falem de mim”. É aquele egrégio por quem não conseguimos nutrir simpatia, talvez pela sua sede desenfreada de sucesso que, convenhamos, é relativa. Essa antipatia não se refletiria em seguidores nem nos likes de cada publicação. Teria fãs que interpretariam toda e qualquer corrente solidária da forma que mais lhe aprouvesse. “Vai correr tudo bem!” seria lido com graves erros de pontuação e tornar-se-ia num “Vai correr? Tudo bem.”, dando origem a movimentos em massa em direção a uma qualquer marginal, por forma a aproveitarem o bom tempo em pleno estado de emergência.
A conta do “Coronavírus_oficial” faria stories de um unboxing de máscaras, viseiras e luvas provenientes de um sítio qualquer que estaria a lucrar com a calamidade. Faria tutoriais a ensinar como metade do mundo pode trabalhar a partir de casa e a outra metade pode fazer o trabalho que fazia em metade da carga horária. É que unir o mundo através da desgraça, não deixa de constituir um vínculo.
Um dos problemas das ascensões rápidas são as quedas vertiginosas. O vírus teve o azar de se meter com alguém de Rio Tinto, coitado. E, sem saber, foi o princípio do seu fim. Infectou o Rocha, com o intuito de se tentar aproveitar da projecção para chegar mais longe. Cedo se apercebeu que optou pelo pior caminho. Podem ser coincidências, mas o que é certo é que, depois do mundo tomar conhecimento que o Rocha ficou infectado, Portugal começou a ver desacelerar a curva dos novos contágios, houve pouco mais portugueses nos cuidados intensivos e também de doentes internados. Até nisto foi pioneiro e, ou muito me engano, ou também fez parte da sua imposição do Norte.
O vírus vive como nós, de interacções e morre quando está sozinho. O Rocha só está em isolamento para castigar o vírus e fazê-lo entender que ninguém, de forma solitária, consegue vencer uma guerra. É que, se em algum momento julgou ter encontrado o corpo certo, enganou-se. Encontrou alguém com o coração no sítio certo, isso sim, já que os pulmões ainda não sabemos.
Experienciar uma pandemia torna-nos num tipo de pessoa. Lutar contra uma pandemia torna-nos noutro tipo de pessoa. Ter um amigo que a sofre, tornar-nos-á ainda noutro. Sucumbir-lhe o físico não imagino, mas faz-me respeitar algo pelo qual sentia asco.
Este surto, em breve, fará parte de uma história que se quererá longínqua e as pessoas serão quem a escreverá. O Rocha será uma delas. Deste lado da vida.
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