Assinala-se a 15 de Junho o “Dia Mundial da Consciencialização da Violência Contra a Pessoa Idosa”. Este dia era bem dispensável de se assinalar. Mas infelizmente, não é o caso, porque a violência é uma realidade!
Acontecem muitas formas de violência sobre a Pessoa Idosa. Umas no seio da própria Família, outras nas Instituições públicas, privadas e sociais e outras ainda, na Sociedade anónima pública com contornos e formas agressivas e desumanas.
Foi em 2006, que as Nações Unidas criaram e assinalaram esta data, com a “Rede Internacional de Prevenção à Violência Contra a Pessoa Idosa”, concebendo assim, uma reflexão profunda com dimensão social sensível, com o objectivo de acabar com esta violência. Percebemos esta problemática e atribuímos-lhe uma grande importância, conhecendo muitas destas questões, assentes em causas com inúmeras variáveis e que são observáveis em Saúde Comunitária ou vivência Comunitária, praticadas através de agressões, conflitos e até homicídios.
Sabemos que as Sociedades de hoje se apresentam e tendem a ser mais envelhecidas. Estima-se que no Mundo, em 2025, possam haver 1,2 mil milhões de pessoas com mais de 60 anos. Este número representa uma População de faixa etária muito grande e importante na vida das nações e do mundo.
Em Portugal, com base nos indicadores que colhemos do “INE” e da “PORDATA”, em 2022 éramos 10.444.242 habitantes sendo que, 24% destes tinham 65 anos ou mais. Comparando com o número de habitantes em 1974, que eram 8.754.365 e, com 65 ou mais anos, representavam 10% deste universo, concluímos que a População/País mudou de perfil e está mais velha. Em 2022 apenas 13% dos habitantes tem de 0 a 14 anos, enquanto que em 1974 representavam 28%. E dos 15 aos 64 anos, em 2022, eram 63%, e em 1974, representavam 62% da População. Há aqui efectivamente alterações que têm implicações directas nas questões demográficas e da População activa, na Segurança Social, seu financiamento e sustentabilidade, nas despesas da Saúde e no que já descrevemos, o “envelhecimento da Nação”. A pirâmide etária começa a ter características cilíndricas e não, piramidal. Preocupante!
Perante estes indicadores precisamos mesmo de reflectir sobre a importância e protecção da “Pessoa Idosa” na nossa Sociedade. Através de inúmeros relatos, investigação, queixas e registos, concluímos que os idosos são/estão sujeitos muitas vezes a maus-tratos físicos e psicológicos, esquecidos, diminuídos, ignorados e humilhados, quer nas Famílias, quer nas Instituições. A função emocional fica profundamente abalada.
É doloroso ouvir muitos relatos que conhecemos, uns veiculados nos órgãos de Comunicação Social, mas outros (muitos) quando fazemos visitação domiciliária ou quando recorrem às urgências ou internamentos.
Para além das agressões físicas e verbais, é preciso também, perceber e ter em conta que é violência sobre os Idosos:
- Quando estão deitados/acomodados nos seus domicílios, em quartos sem janelas, nem luz solar, onde prevalece a humidade e o “cheiro a mofo”, com a roupa da cama pesadíssima e longas semanas, sem mudar cobertores, com colchões de qualidade sofrível;
- É também, nas inúmeras e longas horas de espera nas urgências, para serem atendidos. Uma violência para todos, mas particularmente para os idosos, depois de horas de tratamento, pelos Enfermeiros e Médicos, permanecerem deitados em macas “abandonadas” durante muito tempo, nos corredores superlotados, sem transitarem para uma cama hospitalar ou de qualquer instituição de retaguarda, estando a sua privacidade e intimidade exposta a terceiros;
- É violência quando sofrem de desnutrição, ao não lhes ser proporcionada uma alimentação digna, uma nutrição equilibrada e não lhes serem proporcionados também, alimentos que gostem;
- É violência, despersonaliza-los e retirar-lhes os seus pertences, os seus bens, os objectos que representam valor afectivo, emocional ou de crenças.
- É “penteá-los” a todos com a mesma forma, padronizando, com risca à dtª. ou à esqdª. É vestir-lhes roupa desajustada às dimensões e talhas do seu corpo. É tratá-los por “Avô ou Avozinha”, quando não há nenhum laço de familiaridade, “retirando-lhes” o nome pelo qual sempre foram tratados e são conhecidos;
- É desviar todos os rendimentos de reformas e/ou outros proventos, não os deixando administrar/gerir os seus próprios recursos, quando lúcidos e capazes;
- É querer que estas Pessoas caminhem, façam actividades físicas ou intelectuais, ao mesmo ritmo, como quando eram jovens, ou tinham menos 20, 30 ou 40 anos. O corpo, a mobilidade e a actividade intelectual, está mais lenta e limitada;
- É tirar-lhes o direito de pensamento, de opinião e de decisão. É retirar-lhes o direito de lazer, de visitar espaços e lugares e de receber a visita dos netos ou de outros Familiares. É privá-los de afecto, de carinho e de amor;
- E, por necessidade, terem que optar, entre os medicamentos a pagar na Farmácia, ou alimentos para as suas refeições;
E não será violência, quando verificamos que os cuidados de saúde não são prestados por Profissionais, nomeadamente Enfermeiros, como o constatado e indesmentível, aquando da “Pandemia”, em muitos lares/centros de dia e ERPIs (Estrutura Resiencial para Pessoas Idosas)?
E não será violência, também, quando intencionalmente, se usa linguagem de difícil percepção, limitada, não clara e muitas vezes não verdadeira, dirigida aos Idosos?
Um sem número de exemplos e factos poderiam ser descritos aqui. Se por um lado é um fenómeno em crescendo, é também um fenómeno invisível e desvalorizado, em muitas situações.
Hoje, vive-se mais anos (H-78,05 anos; M-83,52 anos), é verdade. Mas importa perguntar, com que qualidade de vida? Como se afirma em congressos e fóruns de saúde, não basta trazer “mais anos à vida”, mas sim, “mais vida aos anos”.
Os Idosos são bibliotecas valiosíssimas, cheios de saber, experiência, sacrifícios que fizeram para assegurar melhores condições para as Famílias e para o crescimento de uma Nação. Nesta fase das suas vidas, é altura de todos nós os respeitarmos e de retribuir o seu legado. De perceber que um corpo, com muitos anos de vida e de sacrifícios tem “desgaste” e por isso, comorbilidades, umas mais limitantes, outras menos. Mas independentemente desses graus de dependência e do seu extracto social, merecem o respeito e toda a dignidade nesta fase das suas vidas.
Seremos todos capazes de fazer parar a violência contra a Pessoa Idosa e de denunciar casos que conheçamos?
O desafio é grande, mas qualquer Pessoa Idosa, merece dignidade e respeito de Todos em qualquer sítio ou lugar. Pratiquemos a humanização e o respeito!
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