Os bebés podem ou devem usar fraldas até quando?

Enquanto não for realizado o treino da continência de esfíncteres, que começa a acontecer por volta dos 18 meses de idade.

A partir de que idade é que se pode falar em enurese noturna?

A enurese corresponde a episódios noturnos de micções involuntárias numa idade em que o controlo voluntário já deveria existir, ou seja, em crianças com idade superior a 5 anos. Atualmente a enurese é considerada exclusivamente noturna, caindo em desuso o termo enurese diurna (que passou a designar-se por incontinência).

O que pode causar enurese noturna nos primeiros anos de vida? É comum?

A enurese pode afetar cerca de 10% das crianças entre os 5 e os 7 anos. Resulta da combinação de vários fatores, sendo os mais comuns uma tendência para algumas crianças terem poliúria noturna, ou seja, urinarem mais durante a noite. No entanto, o mais importante é, sem dúvida, o facto de haver crianças com sono excessivamente profundo que não acordam quando têm a sensação de bexiga cheia.

Outros fatores possíveis são o aumento da contratilidade no músculo da parede da bexiga; menor capacidade da bexiga; treino inadequado dos esfíncteres das crianças pequenas; obstipação; higiene inadequada; infeção urinária; certas parasitoses; síndrome de apneia obstrutiva do sono com roncopatia; entre outros.

Existem ainda outras causas orgânicas importantes como as malformações urológicas; doenças neurológicas com lesão medular; diabetes mellitus; diabetes insípida e a doença renal crónica.

Deve-se dizer que há familiares que tiveram o mesmo problema e que desaparece com o tempo

A enurese noturna pode estar associada a outras doenças?

Sim, como a hiperatividade e défice de atenção (PHDA), as doenças psiquiátricas infantis e o stresse psicológico.

A enurese noturna é um problema hereditário? É possível preveni-lo?

Em relação à história familiar, é frequente a história parental de enurese. E não, não é possível prevenir.

Existem vários tipos de enurese noturna? Afetam mais meninos ou meninas?

A enurese diz-se monossintomática se ausência de sintomas urinários inferiores e incontinência diurna.

Esta divide-se em primária se nunca houve período de continência durante pelo menos 6 meses ou secundária se ocorreu este período de continência. Na presença de sintomas urinários inferiores designa-se de enurese não-monossintomática. A enurese monossintomática é mais comum no sexo masculino, ocorrendo em cerca de 16% das crianças com 5 anos e 10% com 7 anos.

A que sintomas é que os pais devem estar atentos?

Sobretudo a sintomas que podem estar relacionados com patologias orgânicas: urgência em urinar, jato fraco, esforço para iniciar micção e incontinência diurna.

Como lidar com o problema sem constranger a criança?

Deve-se dizer que há familiares que tiveram o mesmo problema e que desaparece com o tempo. Pode optar-se pela modificação dos hábitos urinários - urinar pelo menos 5-6x dia (pode ajudar ser após as refeições ou pequeno alarme de pulso) - vai ajudar a manter a bexiga menos distendida e reduzir resíduos de urina que persistam e que podem contribuir para a enurese. Fazer-se também um reforço positivo: recompensar as "noites secas"; não punir "noites molhadas" - uso de calendário de registo das "noites secas " e "noites molhadas" que ajuda a criança a sentir-se mais confiante quando há mais noites secas, que podem ser premiadas, além de permitir analisar a resposta às intervenções medicamentosas e não medicamentosas.

Deve-se ainda desaconselhar o uso de proteções (fraldas, plásticos) e o acordar a meio da noite. Isto perturba mais o sono e pouco ajuda na maior parte das situações.

Deve-se ainda promover o treino dos esfíncteres vesicais: em cada micção diurna, tentar reter a urina e não responder à primeira sensação de bexiga cheia para fortalecer musculatura pélvica . Depois urinar completamente e fazer um pequeno esforço final para eliminar qualquer resíduo.

Deve-se ensinar que se tem de evitar comportamentos para reter urina - as crianças têm sempre muito mais que fazer que ir urinar e não podem interromper as suas brincadeiras... os educadores podem ajudar a lembrar.

Outro conselho é o aumento da ingestão hídrica durante o dia, com redução (não forçada) dos líquidos nas três horas antes do deitar (ex. 40% de manhã, 40% à tarde, 20% à noite).

Aconselha-se ainda evitar obstipação para reduzir o resíduo vesical pós-miccional e introduzir algumas modificações da dieta: Desaconselhar (aumentam a atividade do musculo da parede da bexiga): cafeína, chocolate, sumo de laranja, derivados do tomate, comidas picantes, bebidas com gás - evitar a partir do meio da tarde.

Que tratamentos existem?

O alarme de enurese está indicado nas crianças sem resultado com as medidas educacionais e após os seis anos de idade. Não tem efeitos adversos e tem sucesso em 2/3 dos casos. Os aparelhos têm algumas variações, mas habitualmente consistem num alarme na forma de um relógio de pulso ou que se prende ao pijama, com um sensor que se prende na cueca e que à mínima pinga de urina começa a tocar e a vibrar.

A criança acorda e deve ser ajudada nas primeiras semanas de tratamento, em que um dos pais deve ajudar a criança a levantar-se e urinar quando o alarme toca. Deve tentar-se pelo menos 2 a 3 meses de forma consistente, se efeitos o tratamento deve continuar até registo de 14 noites secas consecutivas. Podem verificar-se recaídas mas muitas vezes há boa resposta após novo ciclo terapêutico com o alarme.

A desmopressina é um medicamento análogo de uma hormona natural que reduz a eliminação da água pelo rim, reduzindo a produção da urina. Pode ser útil nas crianças com poliúria noturna. É administrada 30 a 60 minutos antes de deitar, com efeito de 8 horas (redução da produção de urina apenas durante este tempo).

Para prevenir os efeitos adversos, como dor de cabeça por causa da descida de sódio no sangue com a retenção da água no organismo, é importante evitar ingerir líquidos no final do dia e durante a noite. Se efeitos positivos (redução de pelo menos 50% das noites molhadas) manter  durante 6 meses. Nessa altura interromper a terapêutica e verificar se ainda é necessária, nesse caso pode ser mantida. Este processo pode manter-se alguns anos até a criança crescer e deixar de ser enurética. Por outro lado, se não se verificar nenhum efeito positivo ao fim de 2 semanas, o tratamento deve ser interrompido.

A ambos os tratamentos - alarme e desmopressina - podem ser associados em alguns casos.

A médica Sofia Deuchande é nefrologista pediátrica no Hospital de Cascais