As sardas não nasceram comigo, mas resolveram manifestar-se no pior momento possível. A escola primária! Poucas fases se prestam mais à crueldade para alguém se deparar com pintas no rosto. Como se percebe, não gostei delas. Não conhecia ninguém com um problema semelhante e, a julgar pelas observações com que fui brindada, os colegas da sala de aula também não. Pouca gente nasce com sardas.

Ainda para mais em Portugal, país de peles bronzeadas e flagrante escassez de sardas, muito menos comuns por cá do que em alguns países a norte. O tempo passa e muita coisa permanece, mas não necessariamente a minha aversão a sardas. Mais tarde, o problema que me afligiu foi outro. Por que razão não tinha eu mais sardas? Hoje, estão novamente na moda, mas nem sempre foi assim.

Modelos e atrizes sardentas ainda são habitualmente maquilhadas de forma a aparentarem uma pele sem falhas... Um rosto pintalgado, tal como cabelos encaracolados ou sobrancelhas marcadas (e marcantes) são vistos como desvios à norma. E, como tal, são desejados ou disfarçados ciclicamente, conforme a estação em que nos encontramos. Das adoráveis sardas às temidas manchas.

Conheça os sinais que marcam a sua pele e vença este combate com graciosidade. As sardas são fáceis de distinguir dos restantes sinais. São pequenas manchas milimétricas acastanhadas ou alaranjadas que encontramos em grande número espalhadas com abandono pelo corpo ou somente no rosto. Surgem de forma característica em grande número em crianças ruivas ou loiras desde os primeiros anos de vida.

Por que é que a pele muda de tom?

A má notícia para quem, como eu, se habituou a elas e aprendeu a amá-las, é que tendem a desvanecer com a idade. Mas vamos ao que a ciência nos diz. Estas não nascem por capricho nem para satisfazer gostos. As tão desejadas sardas têm, antes de qualquer outra, uma causa genética. Estamos habituados a encontrá-las em pessoas de cabelos ruivos, mas não lhes são exclusivas.

Se é verdade que estão geralmente associadas ao gene que confere essa coloração de cabelo, este pode conter diferentes informações genéticas e nem sempre será ruiva a cor do cabelo. Foi o que aconteceu comigo. De um modo geral, um bom habitat para as sardas é uma pele clara e pouco resistente aos efeitos dos raios ultravioletas. Se tem ou já teve sardas, saberá que é no verão que elas ganham protagonismo.

São o primeiro sinal de que o inverno acabou e o melhor souvenir que levamos daquela semana de férias na praia. Apesar da genética ter um papel determinante na predisposição da nossa pele para ter ou não sardas (e em que quantidade), é a exposição solar que as descobre. Como? A melanina, produzida pelas células, é o pigmento que dá cor à pele e cabelo. É distribuída na camada externa da pele (a epiderme) para a proteger.

O problema da pigmentação excessiva

O que acontece é que, quando um raio solar ultravioleta atinge a melanina presente na nossa pele, o pigmento é ativado (criando uma espécie de sombra que protege o nosso ADN desta exposição) e conseguimos o tão desejado bronze. Mas não só. Sempre que ocorre uma excessiva pigmentação, o depósito é formado, criando manchas mais escuras do que a pele que as rodeia.

A hiperpigmentação, que dá origem às manchas, sinais e, claro, também às nossas sardas. Perguntei a David Serra, dermatologista na Idealmed Unidade Hospitalar de Coimbra, se isso quer dizer que as sardas simbolizam lesões cutâneas. Do ponto de vista científico e semiológico, sim, são lesões cutâneas. No entanto, não são patológicas. Não são uma doença.

Assim, no caso de peles muito claras que procuravam tão somente um bronzeado dourado, o resultado atingido (para além de um valente escaldão) poderá ser simplesmente mais sardas, manchas ou, no pior cenário, desencadear algo bem mais grave, como o melanoma, o tipo mais perigoso de cancro cutâneo.

A dose certa de inocência infantil e atrevimento adolescente

As sardas contêm a dose certa de inocência infantil e atrevimento adolescente, talvez por isso não durem para sempre. Na idade adulta, e depois de tantos verões passados na praia, as sardas tendem a desaparecer e a pele começa a ganhar outras manchas de maiores dimensões. Também é comum durante a gravidez, por razões hormonais, surgirem no rosto da mulher manchas acastanhadas difusas.

Surgem, sobretudo, na testa, nas maçãs do rosto e na pele do lábio superior, o melasma. Como posso livrar-me destas manchas sem comprometer as poucas sardas que me restam? É este o meu mais recente problema e sei que não estou sozinha. David Serra explica que as sardas não são obrigatoriamente afetadas pelo tratamento de manchas do rosto. Tudo depende do tipo de manchas a atacar e também do tratamento escolhido.

A melhor defesa

A redução da exposição solar e o uso de um FPS elevado é a melhor defesa, mas há muito mais que podemos fazer.  "O uso de cosméticos aclaradores à base de vitamina C, ácido azelaico, ácido kójico, entre outros, é uma forma simples de complementar os cuidados de fotoproteção e permite obter resultados mais rápidos", diz o dermatologista, assegurando que, neste caso, as sardas são preservadas.

Com indicação dermatológica, poderemos recorrer a medicamentos despigmentantes, como a hidroquinona (cujos efeitos secundários e contra indicações exigem supervisão médica) ou a peelings que resolvem muitos casos resistentes aos tratamentos tópicos convencionais. O laser (peso pesado do tratamento de manchas) poderá ser uma opção a considerar, se for caso disso.

Neste caso, acrescenta o dermatologista, "é essencial identificar correctamente o tipo de mancha, porque vai condicionar o tipo de laser a selecionar", refere. "Manchas como lentigos solares e queratoses seborreicas planas são geralmente boas candidatas a laser. Enquanto que, no caso do melasma, são menos eficazes", diz. Opções não faltam. Parece que o importante para o sucesso desta batalha é uma vigilância periódica e um aconselhamento profissional.

Moral da história? Há muito mais nas sardas do que vemos a olho nu. No meu caso, as sardas começaram por ser descontentamento e ostracização, tornaram- se anseio e celebração estival e, hoje, dão lugar a tranquilidade e conhecimento. Parecem apenas sardas, mas cabe lá uma vida inteira, com muitas das pistas que procuramos para cuidarmos melhor de nós.

5 bons hábitos para uma pele uniforme

1. Faça chuva ou faça sol, use sempre protetor solar

2. Siga uma alimentação rica em antioxidantes

3. Não esprema borbulhas ou pontos negros

4. Visite regularmente o dermatologista

5. Evite a exposição prolongada ao sol

5 outras marcas que se podem confundir com as sardas

Nem tudo o que reluz é ouro. Por vezes, as sardas não são sardas, mas algo mais. Esteja atento ao seu corpo e recorra à avaliação de um dermatologista para uma correta distinção:

1. Lentigo solar

São manchas acastanhadas e lisas em grande número nas áreas mais expostas ao sol. Surgem na idade adulta e tendem a crescer. A sua presença revela que a pele está danificada pelo sol, pelo que o risco de cancro cutâneo poderá estar aumentado.

2. Queratoses seborreicas

Surgem na idade adulta e são um sinal de envelhecimento cutâneo. No rosto, podem ser múltiplas e planas mas não tão lisas como as sardas. Podem crescer bastante e ficar rugosas, requerendo tratamento médico.

3. Nevo melanocítico

Os verdadeiros sinais com cores, formas e tamanhos diversos constituídos por melanócitos, o tipo de célula responsável pela produção da melanina. Podem estar presentes no nascimento, mas a maioria surge ao longo da vida.

4. Basalioma

É o tipo de cancro de pele mais frequente e menos perigoso. Geralmente, começa como uma mancha ou uma pápula, confundível com um sinal benigno, que pode ter diferentes cores e que cresce até formar um nódulo ou uma ferida persistente.

5. Melanoma

É o tipo de cancro de pele mais perigoso. Pode desenvolver-se a partir de um nevo melanocítico e, nas fases iniciais, é muito parecido com um sinal benigno. Um reconhecimento clínico precoce é determinante.

Texto: Maria João Marques