A maioria de nós recorda-se de qual foi o seu “primeiro livro”, pois os livros têm esse poder: fazer parte da nossa história de vida, da nossa memória autobiográfica (por exemplo, pensar “ainda me lembro quando o meu avô me ofereceu O Principezinho e passei o verão a tentar entender a verdadeira mensagem daquele livro”).

Outro poder da leitura é o de potenciar o nosso desenvolvimento pessoal, enquanto seres humanos, dada a riqueza e conhecimento que pode estar presente em cada página.

Neste sentido, ao longo dos anos, a ciência psicológica tem vindo a identificar os benefícios da leitura para o desenvolvimento das crianças, particularmente em termos cognitivos, emocionais e sociais.

No domínio cognitivo, sabe-se que a leitura:

  • Fomenta a capacidade de atenção e concentração;
  • Aumenta o vocabulário;
  • Desenvolve as capacidades de compreensão e de interpretação;
  • Promove a criatividade, a capacidade de imaginação e o pensamento crítico;
  • Facilita o desenvolvimento da capacidade de argumentação.

No domínio emocional, os hábitos de leitura facilitam o desenvolvimento de sentimentos de empatia (pelas personagens da história e, por sua vez, pelas pessoas que rodeiam a criança), bem como o contacto com as emoções e respetiva expressão emocional (por exemplo, pensar e dizer “a personagem está triste, eu já senti isso”). Através da leitura, é ainda possível conhecer novas estratégias de resolução de conflitos (que as crianças podem aplicar na vida real) e ter acesso a aprendizagens e “lições de vida” tipicamente presentes nos contos e histórias infantis (por exemplo, o ditado “devagar se vai ao longe” do Conto A Lebre e a Tartaruga).

Naturalmente que as maiores capacidades de comunicação, aliadas à maior empatia e capacidade de resolução de conflitos, beneficiam as relações sociais e a capacidade de socialização da criança.

As vantagens para a evolução da criança nos diferentes domínios referidos não se encontram apenas associados a um maior desempenho escolar (por exemplo, dada a maior facilidade em ler e a tendência a dar menos erros ortográficos devido ao maior vocabulário), mas também a uma maior qualidade de vida na idade adulta. Antes de dar um aparelho digital ao seu filho, retenha isto que lhe vamos dizer com suporte em conhecimento científico: uma criança leitora é, no futuro, um adulto com um vocabulário diferenciado e, não raras vezes, com uma visão mais humana e empática sobre o mundo e a vida; com mais conhecimentos sobre diferentes assuntos de interesse.

Todos estes benefícios acentuam a necessidade de introduzir o objeto livro na vida da criança desde muito cedo. Sabe-se que, por exemplo, o ritual de ler para as crianças tende a ser o seu primeiro contacto com a leitura e que este ritual facilita a aquisição da linguagem.

Numa fase mais avançada, quando se inicia o período escolar e início da alfabetização, a maioria das crianças aprecia ler histórias em voz alta para as figuras de referência. Este comportamento não só facilita a aquisição da linguagem, como favorece o desenvolvimento da própria destreza na oralidade (por exemplo, dizer corretamente as palavras, dialogar com mais calma e clareza).

Mas como incentivar as crianças a ler? Eis algumas estratégias orientadoras, em função da faixa etária, para cultivar os interesses da sua criança no que remete para a leitura.

Até aos 03 anos

  • Leia histórias de interesse da criança.
  • Faça diferentes entoações de voz, mímicas e gesticule para que a criança perceba a história e as diferentes personagens.
  • Permita à criança observar as ilustrações do livro, aponte as personagens e os seus diferentes nomes.

Dos 03 aos 06 anos

  • Estabeleça uma rotina de leitura (por exemplo, contar uma história antes de ir dormir).
  • Peça à criança para recontar a história, promovendo a imaginação.
  • Permita que seja a criança a escolher o livro, promovendo o interesse da mesma.

Dos 06 aos 10 anos

  • Encoraje a criança partilhar as aprendizagens das leituras e a ler para os adultos.
  • Aproveite o tema da leitura e das histórias para dialogar sobre outros temas mais importantes (por exemplo, divórcio, chegada de um irmão, discussões).
  • No quarto da criança ou sala, construa um “cantinho da leitura”.

É importante acrescentar que os momentos de leitura partilhados entre cuidadores e crianças promovem o desenvolvimento dos laços afetivos, o que reforça a sua importância e o papel ativo dos adultos em promover estes hábitos. Inclusivamente, algumas mães fazem leituras para os filhos durante a gestão com o intuito de aumentar o contacto e familiaridade.

Uma vez que as crianças aprendem com a observação do comportamento das figuras de referência, o interesse e gosto pela leitura é facilitado pelos hábitos e rotinas dos adultos, como por exemplo observar um dos cuidadores a ler um livro.

Sendo assim, que livro vamos escolher?

As explicações são de Sofia Gabriel e de Mauro Paulino, da MIND | Instituto de Psicologia Clínica e Forense.