O Hospital Santa Maria tem registado elevados picos de procura no serviço de urgência que se refletem em longos tempos de espera para os doentes urgentes (pulseira amarela) serem atendidos.

Questionado pela agência Lusa se os doentes nestes períodos não podiam ser distribuídos por outros hospitais, o diretor do serviço de urgência do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN), João Gouveia, afirmou que, se a rede de referenciação do serviço de urgência funcionasse, “as coisas eram muito mais fáceis”.

“O que acontece é que a rede não funciona porque às vezes os hospitais não conseguem, encerram e depois não são respeitadas as regras da rede. Ainda no fim de semana tivemos doentes do Garcia de Orta [Almada], de Setúbal, etc., que não deviam vir diretamente para o Santa Maria e vieram, quando há outros hospitais no caminho antes de chegarem ao Santa Maria”, criticou.

As redes de referenciação são sistemas através dos quais se pretende regular as relações de complementaridade e de apoio técnico entre as instituições hospitalares, para garantir o acesso de todos os doentes.

Para o médico intensivista, ainda há “muito a fazer” em termos de organização, nomeadamente a nível das corporações de bombeiros e de informação dos próprios utentes.

“Se nós tivéssemos uma urgência hospitalar verdadeira, se calhar muitos dos problemas estavam resolvidos, porque só poderiam vir para a urgência os doentes encaminhados pelo INEM ou referenciados já por um médico. Como isso não acontece, como vem toda a gente, é muito difícil”, lamentou.

“Enquanto não se mudar a referenciação hospitalar, duvido que de alguma maneira se consiga mudar isto”, sustentou.

Sobre se o alargamento dos horários dos centros de saúde pode diminuir a pressão sobre as urgências hospitalares, João Gouveia afirmou: “Eu acho que sim, sem sombra de dúvida, se houver duas coisas que não sei se existem”: Que a medida seja concreta e que os cuidados de saúde primários tenham mais capacidade.

“A informação que eu tenho é que, por exemplo, na área de influência do Hospital de Santa Maria apenas houve o alargamento do horário no ACES [Agrupamento de Centro de Saúde] de Lisboa Norte, mas que já funcionava em horário estendido e que aumentou mais duas horas”, contou, considerando que não é uma grande diferença.

Defendeu ainda que os cuidados de saúde primários tenham “alguma capacidade de realização de meios complementares de diagnóstico e de poder tratar algumas das situações”, porque senão “é apenas mais uma etapa no caminho” que o doente tem de fazer para ir às urgências.

João Gouveia observou que, quando se pensa que “o problema da urgência é um problema da urgência” está-se a “pensar mal”: “Isto é um problema de saúde em geral, mas [a urgência] é a face mais visível e que chama a atenção das pessoas”.

No seu entender, “há muito trabalho” a nível dos cuidados de saúde primários e a nível dos hospitais para ser feito na regulação entre ambos.

“Temos que arranjar soluções para as pessoas não tentarem vir resolver os problemas à urgência e temos que arranjar facilidade de tirar os doentes da urgência”, defendeu.

Sobre a situação vivida hoje no serviço de urgência, João Gouveia disse estar “mais calma” em relação aos últimos dias, enfatizando que, de sábado para domingo o serviço assistiu mais 100 doentes do que normalmente, ultrapassando no total os 500.

O especialista explicou que a situação parece por enquanto estar a voltar à normalidade no Santa Maria, mas disse que o problema não está apenas neste hospital.

“Também vimos [no fim de semana] que vários hospitais da região de Lisboa tiveram que encerrar e esses doentes transbordaram para os outros, inclusive para o Santa Maria, o que tem repercussões” no atendimento.

Segundo o responsável, cerca de 13% dos doentes que se dirigem à urgência são internados, o que também condiciona o escoamento dos doentes no serviço de urgência.