“Não há um mapa para a construção de masculinidades saudáveis e cuidadoras. Como não há um mapa, estes jovens regulam-se por mapas antigos e o que resulta disso é uma frustração por não conseguir alcançar tudo aquilo que os mapas antigos ditavam – ser provedor, ter uma esposa, ser bem-sucedido”, nota a investigadora Tatiana Moura, que coordena o observatório em conjunto com Rosa Monteiro.

Num momento em que é “palpável” a frustração dos homens e do crescimento de fenómenos nas redes sociais de figuras como Andrew Tate ou Jordan B. Peterson que promovem uma ideia de “masculinidade dominante”, para Tatiana Moura é fundamental criarem-se ferramentas que permitam promover “masculinidades saudáveis”.

Segundo a investigadora, esse tipo de masculinidades promove “um homem equitativo, que acredita na igualdade, respeitador e empático, que se auto cuida, que cresce habituado a expressar os seus sentimentos”.

Neste momento, nota Tatania Moura, há mais homens a morrer por mortes preveníveis, têm uma maior taxa de suicídio em comparação com as mulheres, e assumem-se “revoltados” e “deprimidos” pela possibilidade de perda de privilégios a que estavam habituados.

Para isso, o Observatório, formalmente constituído há cerca de um ano, e que vai ser apresentado a 30 e 31 de outubro, aquando de um curso de formação avançada sobre a construção social das masculinidades, pretende agregar conhecimento científico resultante da investigação na área e monitorizar as políticas e ações que possam ser transformadoras naquele domínio.

Nesse sentido, esta nova estrutura pretende trabalhar junto de profissionais de educação e da saúde para promover masculinidades saudáveis, cujo trabalho tem de ser iniciado de forma precoce.

“Entre os três e os cinco anos é quando as crianças estão a definir os estereótipos e aos cinco anos já estão absolutamente marcadas. Há um estudo, com quatro mil crianças, que conclui que os meninos já sabem o que não podem fazer: não podem chorar e não podem mostrar sensibilidade”, realçou Tatiana Moura.

Segundo a investigadora, a sociedade tem conseguido “explicar às meninas que conseguem ser o que quiserem”, mas, ao mesmo tempo, tem-se fracassado “em dizer aos meninos que eles também podem ser o que quiserem, que podem chorar, ser sensíveis e que devem cuidar”, notando que os profissionais de educação têm muito interesse na matéria, mas pouco material e formação na área.

Tatiana Moura recorda um inquérito realizado num projeto de investigação recente do CES em que se perguntou aos pais quais eram as qualidades que consideravam que a sociedade valorizava no filho (rapaz).

"No cimo, o sucesso profissional, os estudos, e, em último, a empatia”, constatou.

Sobre a necessidade de intervenção precoce, Tatiana Moura realça ainda a mudança abrupta que acontece entre o jardim-de-infância e a escola primária.

“Até aos cinco anos, as crianças brincam entre elas, abraçam-se, manifestam sentimentos e emoções. Aos seis, há um corte abrupto, estão sentados numa cadeira com mesa à frente e parece que deixa de ser permitida a transmissão de afeto e, no recreio, a parte central do espaço público é ocupada por meninos a jogar à bola e as meninas ficam num cantinho”, refere.

O Observatório das Masculinidades (que terá um ‘site’ disponível a partir de dia 30 de outubro), irá disponibilizar recursos, promover debates sobre o tema, comunicar o conhecimento que vai saindo dos vários projetos de investigação sobre o assunto, assim como recomendar a alteração de políticas públicas e monitorizar aquelas que estão a ser implementadas.