Ainda que o papel de pai e mãe se comece a desenvolver na imaginação dos pais, bem antes do parto, não há dúvidas de que o momento do nascimento de uma criança é verdadeiramente importante e esperado com anseio.
Esta experiência, apesar de considerada transcendente e o melhor momento da vida de muitos pais, integra inúmeros medos e inseguranças, particularmente no nascimento do primeiro filho, uma experiência totalmente desconhecida e, em parte, assustadora.
Até então, os receios tendiam a ser colmatados pela segurança providenciada pela certeza de que os pais iriam estar lado a lado, juntos a explorar o momento do nascimento. Em período de COVID-19, esta segurança foi recentemente roubada pelo contexto pandémico instaurado, juntando-se ainda novos medos (por exemplo, o medo do contágio), questões repetitivas (por exemplo, “serei capaz?”), pensamentos negativos (por exemplo, “vou estar sozinha”) e uma sensação de revolta e injustiça (por exemplo, “o vírus estragou tudo”).
A impossibilidade noticiada de os pais acompanharem as mães durante o nascimento do bebé conduz ao risco de as mães se sentirem sozinhas, absortas em pensamentos do “quanto seria diferente” se o parceiro estivesse presente, podendo prejudicar a concentração e o diálogo com os profissionais de saúde que a acompanham.
Quanto aos pais, impedidos de estar presentes, ainda que para a segurança do bebé, podem vivenciar sentimentos de impotência, tristeza e exclusão, sentindo-se como uma personagem secundária na sua própria história. No fundo, foi perdido um dos momentos mais importantes da sua narrativa de vida.
As investigações apontam a presença do parceiro, quando desejada por ambos, como o principal fator para o parto ser uma experiência positiva. Os pais partilham um momento único que os transforma individualmente e enquanto casal. Ambos reconhecem e assumem, em simultâneo, o papel de pais. A singularidade e a intensidade emocional deste momento aproximam o casal, dada a sensação mútua de partilha, vivida como indescritível e irreplicável.
Um exemplo representativo do impacto da presença do parceiro é a redução do consumo de medicação, da duração do trabalho de parto e do recurso a intervenções médicas, como a cesariana ou a extração do bebé com fórceps. Segundo as investigações, quando desejada, a presença do companheiro reduz a ansiedade da mulher e é gerado um maior relaxamento do corpo. Haverá maior prova da importância da presença do companheiro que a redução das dores e a plenitude do parto? Por conseguinte, é provocada uma redução da rigidez muscular, como do útero e é facilitado o parto. A ciência psicológica aponta também para uma redução do risco de depressão pós-parto, dada a relação entre uma experiência de parto positiva e um maior investimento dos pais na parentalidade.
Mas porque é a presença do parceiro tão importante?
O parceiro funciona como uma figura que inspira e encoraja a mulher a sentir-se capaz de suportar as dores físicas e gerir os medos que a dominam, alcançando uma sensação de segurança e proteção. A presença integra três funções:
- Apoio emocional;
- Suporte na gestão da dor;
- Facilitação da comunicação e tomada de decisão.
Quanto ao apoio emocional, destacam-se as expressões de preocupação e de carinho, como os abraços, acompanhadas pela disponibilidade para ouvir os medos e providenciar encorajamento verbal.
A gestão da dor física é facilitada pelo apoio considerado mais prático, como ajudar na respiração, na monitorização das contrações e no auxílio durante a utilização da bola de pilates.
No concernente à comunicação, aquando do cansaço físico e desgaste emocional, o companheiro, de total confiança da mulher, pode ajudar a expressar os seus pedidos, bem como a reformular decisões, como o recurso à epidural.
No que diz respeito aos pais, a sua presença transmite a sensação de um papel ativo e de uma maior sensação de controlo no nascimento do filho. Simultaneamente, sentem que são importantes, necessários e apreciados pela parceira. É providenciada a oportunidade de, imediatamente, dar colo ao bebé, facilitando a conexão emocional e o despertar do papel de cuidador, em particular a sensação de ser importante e responsável pelo bem-estar do ser humano que tem nos braços.
Em resumo, uma experiência de parto positiva tem impacto no bem-estar da mulher e do homem, no bebé, no relacionamento entre a mãe e o descendente e na relação conjugal. A partilha desta experiência tende a acentuar a perceção das mulheres de um maior investimento emocional na relação, pelo respetivo parceiro.
Apesar de distantes, existem algumas estratégias a ponderar para alcançar uma maior proximidade entre o casal e, por sua vez, uma atenuação da ansiedade. Tomem-se como exemplos:
- Videochamada durante o parto;
- Um exercício que denominamos de evocação de memórias positivas, em que apesar da distância imposta, o casal procura estar próximo num momento desejado pelos dois. Primeiramente, a questão que se coloca ao pai passa por “O que gostaria de dizer à sua companheira se estivesse presente?». Posteriormente, durante o parto, a mãe tenta recorrer às frases referidas e imagens doces deste momento de partilha e encorajamento.
- Aproveitar a quarentena para um maior envolvimento nos exercícios pré-parto (e.g. relaxamento, cursos online de parentalidade como este do SAPO Lifestyle), como forma de atenuar o desconforto de não poder estar presente no parto.
- Procurar surpreender a mãe para quando regressar a casa se sentir particularmente acolhida e confortável. Por exemplo, emoldurar fotografias de momentos e circunstâncias especiais que tenham acontecido durante a gravidez.
É importante referir que, se com o aproximar do parto a ansiedade estiver a aumentar, tornando-se mais difícil de gerir a lamentável notícia de que o casal não poderá estar junto nesse momento especial, é possível beneficiar de consulta psicológica de casal. Esta permitirá, em conjunto, partilhar os pensamentos e sentimentos considerados importantes, de modo a que estes não assumam um papel central num momento de tamanha felicidade e importância para a vida do casal.
As explicações são de Mauro Paulino e Sofia Gabriel, da MIND – Psicologia Clínica e Forense.
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