Na paisagem ondulante do Douro vinhateiro, entre socalcos centenários e a serenidade da primavera, a literatura “come-se” à mesa. Não, não é engano. Explicamos: de 18 a 30 de abril, o Terraçu’s Winery Restaurant, na Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo, propõe um menu temático com raízes literárias. Inspirado na obra queirosiana, este menu exclusivo acaba por evocar o imaginário gastronómico do século XIX, da mesa aristocrática d’ “Os Maias” aos banquetes de Jacinto em “A Cidade e as Serras”.

Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro
Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro Chef André Carvalho créditos: Divulgação

O projeto, assinado pelo chef André Carvalho, tem o objetivo de assinalar dois marcos: por um lado, os 180 anos do nascimento de Eça de Queiroz e por outro, dá o arranque nas celebrações dos 20 anos da Quinta Nova enquanto primeiro enoturismo do Douro. Esta iniciativa faz parte das 20 previstas ao longo do ano, começando desta forma com um tributo à literatura e à cultura de uma época, em que a comida era símbolo de status. E na companhia de um copo de vinho.

Um jantar em cinco capítulos

O menu é composto por cinco momentos num convite para se sentar à mesa com Eça de Queiroz. Ou, pelo menos, com os seus personagens, os seus banquetes e o seu olhar crítico, mas cheio de prazer, sobre a gastronomia portuguesa. Quase que podemos dizer que estamos a degustar uma história por capítulos. Afinal, não é todos os dias que se “lê” Eça através do paladar.

Capítulo I – A frugalidade ilustrada

Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro
Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro Caldeirada Escassa de Sardinha e uma côdea de broa créditos: Divulgação

A refeição começa com uma evocação que parece simples: uma caldeirada escassa de sardinha com côdea de broa, inspirada numa imagem irónica presente em “Uma Campanha Alegre”, onde Eça de Queiroz retrata a frugalidade portuguesa com a sua mordaz crítica social. É a cozinha da escassez elevada a um certo requinte, aqui acompanhada pelo Quinta Nova Rosé 2024.

Capítulo II – A abundância da romaria

Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro
Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro Fava Rica créditos: Divulgação

Segue-se a Fava Rica, prato de romaria, fiel à memória coletiva da cozinha popular portuguesa que encontramos descrita n’“Os Maias”. Servida como homenagem à abundância festiva, surge acompanhada pelo tinto Quinta Nova Reserva Touriga Nacional 2022, numa ordem pouco comum se pensarmos em harmonizações vínicas.

Capítulo III – A elegância da elite

Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro
Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro Pregado com molho holandês e espargos créditos: Divulgação

Do campo para a cidade, o terceiro momento transporta-nos ao ambiente cosmopolita d’”A Capital”, evocando o ambiente sofisticado que poderia habitar o salão do Hotel Universal: pregado com molho holandês e espargos. Uma reinterpretação da elegância pretendida pela elite lisboeta, acompanhada pelo Grainha Branco 2023.

Capítulo IV – O excesso burguês

Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro
Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro Codorniz trufada com creme de alcachofras créditos: Divulgação

Como sátira aos vícios da alta sociedade, a codorniz trufada com creme de alcachofras remete para as descrições de “Ecos de Paris” onde o luxo se repete e banaliza. O Quinta Nova Reserva Terroir 2023 acompanha.

Capítulo V – Uma sobremesa narrativa

Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro
Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro Arroz-doce em pirâmide com caldo de cereja e frutos secos créditos: Divulgação

Para terminar, uma sobremesa que é quase uma personagem: o arroz-doce em pirâmide, com caldo de cereja e frutos secos, como descrito n’ “A Cidade e as Serras”. Uma imagem da fartura portuguesa, do orgulho pela mesa e da estética do exagero bem-humorado, aqui reinterpretada pelo chef num outro formato. Ao lado, um Quinta Nova Vintage Porto 2022 para ajudar a terminar esta história.

O menu tem um valor de 135€ por pessoa (com harmonização de vinhos incluída) e parece refletir a identidade do Terraçu’s como nos é apresentada: uma cozinha que privilegia produtos locais, sazonais e sustentáveis.

Na programação das 20 celebrações do enoturismo da Quinta Nova, está previsto que o “momento Eça” regresse nos meses de verão. Entre outras iniciativas, destaque para provas verticais de vinhos icónicos da casa, como o reconhecido Mirabilis, bem como jantares vínicos a quatro mãos, que irão juntar o chef residente a chefs convidados, em encontros que celebram o vinho e a criatividade à mesa.

Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro
Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro O interior do Terraçu's. créditos: Divulgação

As experiências também ganham pelo lugar onde acontece. A Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo é, por si só, um cenário de literatura. Referenciada desde a primeira demarcação pombalina em 1756, foi propriedade da Casa Real Portuguesa até 1725, assumindo o nome atual após a união de duas quintas.

A adega data de 1764 e é uma das mais antigas da região. Os edifícios que a compõem mantêm a traça original, incluindo as portas largas de madeira por onde passavam as pipas de Vinho do Porto nos carros de bois. A casa senhorial do século XIX, com capela datada de 1765, foi adaptada à atual Winery House, unidade de enoturismo com 11 quartos, hoje integrante da Relais & Châteaux, a única do Douro a integrar esta rede internacional.

Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro
Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro A esplanada do restaurante. créditos: Divulgação

Aqui, tudo se resume à natureza e ao canto dos pássaros. A propriedade poderia ser facilmente descrita por Eça de Queirós — e talvez até habitada por uma das suas personagens — num daqueles momentos de deslumbramento pela grandeza da serra, da vinha e da mesa, como acontece em “A Cidade e as Serras”, e que ajuda a contextualizar o menu, aproximando-o do universo onde algumas das suas histórias ganham forma.

Experiências vínicas para todos os perfis

Mas nem só à mesa se vive a experiência de enoturismo. O Wine Museum Centre Fernanda Ramos Amorim, que reúne 500 peças ligadas à história do Vinho do Porto entre os séculos XIX e XX é um dos pontos disponível para visita. Com a duração aproximada de 45 minutos, o museu dá a conhecer a vinha, a adega e todo o processo produtivo dos vinhos da Quinta. O valor é de 18€ por pessoa.

O Patamar Wine Shop & Bar, espaço de entrada e receção da Quinta Nova, convida a uma primeira aproximação ao vinho e à paisagem. O terraço exterior oferece uma vista ampla sobre o Vale do Douro, com o muro de xisto tradicional integrado na fachada, criando um ponto de observação privilegiado para o pôr do sol sobre as vinhas e o rio.

Num ambiente descontraído, é possível provar vinhos a copo acompanhados por tapas regionais, ou simplesmente usufruir da paisagem. A loja garrafeira, aberta ao público todo o ano, disponibiliza todas as referências da Quinta Nova e vinhos da Taboadella, região do Dão, também do grupo, com serviço de entrega ao domicílio. As provas vínicas no Patamar estão disponíveis a partir de 30€ por pessoa, mediante marcação (mínimo de duas e máximo de 14 pessoas), e procuram dar a conhecer a diversidade do portefólio vínico da casa num formato informal.

Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro
Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro créditos: Divulgação

Mas a proposta de enoturismo da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo vai muito além da prova de vinhos tradicional. No renovado Quinta Nova Winery Lounge, os visitantes podem escolher entre experiências exclusivas, que combinam degustação, educação vínica e, claro, o contacto com a paisagem e a história do Douro.

O projeto de arquitetura e design de interiores tem a assinatura da arquiteta Inês Rodrigues, que procurou conciliar elegância, conforto e sofisticação, adaptando cada área a diferentes funções.

Entre os elementos que marcam o espaço, destaca-se uma escultura de cortiça de grandes dimensões, projetada pela própria arquiteta e produzida pela Amorim Cork Composites. Um painel artístico dedicado a Baco, assinado pelos criativos Gezo Marques e José Aparício, recebe os visitantes com um convite claro: desfrutar dos prazeres da vida com tempo e atenção.

Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro
Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro Quinta Nova Winery Lounge créditos: Divulgação

Para quem procura um momento gastronómico informal, o Bachus’ Table (95€ por pessoa) propõe um almoço buffet regional, servido com vinhos Quinta Nova (branco e tinto), numa seleção que inclui entradas, prato principal, sobremesas, bebidas não alcoólicas e café.

As provas vínicas orientadas incluem opções como a Barra Iconic Terroir Tasting (210€), com vinhos Taboadella Grande Villae e Mirabilis, acompanhados de criações regionais gourmet, ou a Barra Iconic Tasting (230€), focada em referências premium da Quinta Nova, como os vinhos das parcelas Vinha Centenária. Para quem deseja estender a experiência ao universo dos vinhos do Porto, a Barra Iconic Tasting Douro & Port (250€) inclui também o Vintage da casa.

Entre as experiências mais imersivas, destaca-se a The Blender’s Table (290€), que desafia os visitantes a criar o seu próprio lote de vinho, com garrafa personalizada incluída, e prova de três vinhos icónicos da Quinta Nova. Já a Winemaker’s Selection — disponível em duas versões — oferece uma degustação orientada que inclui os vinhos Vinha Centenária, Mirabilis e Porto Vintage (340€), podendo ser ampliada com o Aeternus (440€).

Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro
Sabores com ponto final. Quando Eça de Queiroz inspira uma refeição literária no Douro Painel artístico dedicado a Baco, assinado pelos criativos Gezo Marques e José Aparício. créditos: Divulgação

Para os “wine lovers”, a Prova Especial com Visita Técnica Completa (450€) inclui uma passagem aprofundada pela adega, garrafeira histórica e sala das barricas, terminando, mas uma vez, com uma seleção de vinhos icónicos da propriedade.

Todas estas experiências incluem acesso ao Wine Museum Centre Fernanda Ramos Amorim, bem como a visita às vinhas e aos edifícios históricos da quinta. Acompanhadas por uma equipa de Wine Educators especializados, as provas são conduzidas com o objetivo de tornar o vinho acessível, sem perder a profundidade técnica ou a ligação ao terroir.

Há ainda experiências que se podem reservar como "Do Douro ao Dão", que inclui uma visita à cidade de Lamego, assim como uma passagem pelo Dão, à Taboadella, com almoço, visita à adega e prova de vinhos.

No fim, percebe-se que este “menu Eça” é mais do que um exercício temático: é um pretexto para olhar o Douro com mais atenção e saboreá-lo com tempo. Entre pratos que nascem da literatura e vinhos que contam a história deste lugar, a experiência mostra como a gastronomia e a cultura podem cruzar-se. Porque há histórias que se leem, outras que se vivem e, logicamente, há algumas que se saboreiam.

O SAPO Lifestyle esteve na Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo a convite.