Qual é o panorama nacional no que diz respeito aos cancros ginecológicos?

Os cancros com origem no trato ginecológico representam, em Portugal e na maioria dos países ocidentais, o terceiro grupo de neoplasias com maior incidência no sexo feminino, a seguir ao cancro da mama e ao cancro colorretal. São, por isso, um problema de saúde pública no nosso país, com importante impacto social e económico.

Quais são os mais frequentes e os que causam maior impacto na vida das doentes?

Em Portugal o cancro de origem ginecológica com maior incidência é o carcinoma do endométrio (cancro do corpo do útero), mais frequente em mulheres pós-menopausa com mais de 50 anos. Apesar de ser o mais frequente é também o que tem o melhor prognóstico, facto explicado por sintomatologia precoce (habitualmente hemorragia vaginal), sendo a maioria dos diagnósticos feitos em fases iniciais da doença. Por outro lado, o cancro do ovário é, de entre as neoplasias ginecológicas, o que provoca sintomas mais tardiamente e é por isso diagnosticado muitas vezes já em fases avançadas da doença, em que o tratamento curativo já não é possível.

O que está ao alcance das mulheres para poder evitá-los?

Prevenção, rastreio e diagnóstico precoce são palavras-chave para diminuir a mortalidade e morbilidade associadas a estas doenças. A adoção de estilos de vida saudáveis, como a alimentação cuidada que possibilite mantermos um peso adequado à nossa estatura e idade, deixar de fumar e o exercício físico regular, são fundamentais para a prevenção de cancros ginecológicos, bem como de outras doenças oncológicas.

A avaliação ginecológica regular pelo Médico de Família ou por um Ginecologista é fundamental para o diagnóstico precoce. No caso do cancro do colo do útero existe um método de rastreio altamente eficaz (citologia ou Papanicolau, e teste de pesquisa de HPV) que quando realizado de forma regular previne o aparecimento desta doença, detetando lesões pré-cancerígenas. Nos últimos 50 anos a introdução do rastreio do cancro do colo do útero reduziu em mais de 70% a sua mortalidade.

Mafalda Casa-Nova, médica oncologista no Hospital Beatriz Ângelo e no Hospital da Luz Oeiras
Mafalda Casa-Nova, médica oncologista no Hospital Beatriz Ângelo e no Hospital da Luz Oeiras Mafalda Casa-Nova, médica oncologista no Hospital Beatriz Ângelo e no Hospital da Luz Oeiras

A vacina contra o HPV já faz parte do plano nacional de vacinação para meninas e meninos com 10 anos de idade, e prevê-se que num futuro próximo reduza a incidência de cancro do colo do útero em Portugal de forma muito significativa, como já aconteceu em outros países da Europa.

O acesso a tratamentos inovadores ainda continua a ser um grande desafio para as doentes oncológicas?

A oncologia é uma ciência em constante evolução e todos os anos são publicados muitos estudos que validam a introdução de novos fármacos e novas estratégias terapêuticas na prática clínica. Muitas vezes as sociedades e economias de cada país não conseguem acompanhar a crescente onda de evolução científica, e os estudos de impacto económico são cada vez mais relevantes, para validarem a utilização de novos fármacos.

Qual é a realidade do nosso país por comparação ao resto da Europa?

O nosso Sistema Nacional de Saúde está bastante bem posicionado no ranking Europeu, mas apesar disso ainda temos longos tempos de espera nas aprovações de novos fármacos que já mostraram benefício clínico significativo com aumento de sobrevivência e diminuição do risco de morte em grandes estudos clínicos, inclusivamente já aprovados pela Agência Europeia do Medicamento (EMA) e que já estão a ser utilizados em outros países europeus, nomeadamente da Europa Ocidental.

Para ultrapassarmos este problema é essencial a aceleração dos processos submetidos às entidades reguladoras, bem como uma maior articulação com os especialistas de cada área.

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