O Cancro de Cabeça e Pescoço é o sétimo tipo de neoplasia mais comum no mundo, sendo duas vezes mais frequente em homens do que em mulheres e o subtipo mais encontrado é o carcinoma pavimento-celular. As regiões mais afetadas são a cavidade oral, a faringe e a laringe, embora a cavidade nasal, as glândulas salivares e outras estruturas da cabeça e pescoço possam também estar envolvidas.
Classicamente, é um tipo de neoplasia com maior incidência em indivíduos idosos, em que os principais fatores de risco associados são o tabaco (cigarros, charutos, tabaco de mascar, exposição indireta) e o álcool. A junção destes dois fatores de risco está associada a um risco maior do que o de cada um individualmente. A sensibilização acerca dos efeitos nocivos do tabaco e do álcool deve ser encorajada como medida preventiva. Esta neoplasia pode também ser causada por infeções pelo vírus do papiloma humano (HPV) na orofaringe (amígdalas e base da língua). A diminuição da infeção pelo HPV na cavidade oral e eventualmente a vacinação profilática poderão diminuir a incidência desta neoplasia.
Este tipo de cancro está muitas vezes associado a dor, alterações da função, alterações estéticas e stress psicossocial, uma vez que as regiões anatómicas afetadas são muito importantes para a interação social e responsáveis por funções básicas como falar, engolir ou respirar. Como tal, é essencial uma avaliação por uma equipa multidisciplinar para a escolha do tratamento mais apropriado, com o objetivo de curar a doença e minimizar as consequências da terapêutica, tentando preservar ao máximo a função e estrutura da região afetada.
Manter a qualidade de vida a longo prazo após o tratamento implica, mais uma vez, uma abordagem multidisciplinar, na qual estão envolvidos médicos de várias especialidades (cirurgia, oncologia, radioterapia, medicina dentária), bem como enfermeiros e técnicos de diferentes áreas. Por exemplo, após a intervenção terapêutica adequada à situação, poderá ser necessário o acesso a uma vasta área de cuidados, tais como fisioterapia, terapia da fala, aconselhamento nutricional e medidas de ensino relativas às diferentes necessidades. Os serviços psicossociais, a família e os amigos são também uma parte fundamental desta rede de cuidados.
Recordo-me de um caso de um doente a quem foi removida a laringe na sua totalidade com um período longo e difícil de reabilitação. Houve necessidade de múltiplas vindas à consulta para ajuste de prótese de modo a permitir a fala, bem como da aprendizagem de medidas de limpeza e manuseamento da cânula de traqueostomia (orifício no pescoço que permite a respiração). Foi também necessária a realização de terapia da fala de modo a reaprender a falar. Atualmente, após este período de reabilitação, a fala é perfeitamente compreensível, retomou a sua atividade profissional e voltou ao seu quotidiano habitual. Realço um aspeto que me marcou especialmente, o apoio da esposa, que o acompanhava a todas as consultas, sempre com uma atitude otimista e positiva e que o incentivava quando havia algum desânimo. Certamente tornou todo caminho de retorno à vida normal muito mais fácil.
Atenção! É essencial manter o seguimento médico, de forma a possibilitar o rastreio de recidiva do tumor ou aparecimento de um segundo tumor. Este seguimento é feito através da avaliação de sintomas, do exame objetivo e, dependendo do tipo de tumor e tratamento, recorrendo a alguns exames complementares de diagnóstico.
Com o aumento do conhecimento científico, a diminuição dos fatores de risco, o aumento dos rastreios e os avanços terapêuticos, poderá ser previsível o aumento da taxa de sobrevivência e de cura, bem como um aumento da qualidade de vida associada ao tratamento. No entanto, tal só é possível com um diagnóstico atempado e com o tratamento adequado e personalizado de cada doente.
Um artigo do médico Tiago Caneira, especialista em Otorrinolaringologia no Hospital CUF Descobertas - CUF Oncologia.
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