Mo Gawdat, engenheiro de sistemas e ex Chief Business Officer da Google [X], baseado na sua experiência enquanto programador e nos seus conhecimentos de neurociência, revela-nos como os nossos cérebros, apesar de altamente complexos, se comportam de forma previsível. De acordo com o autor, se conseguirmos perceber os nossos padrões de comportamento, podemos trabalhar de forma eficaz na nossa felicidade.
Após o seu primeiro livro A Equação da Felicidade, Mo Gawdat apresenta-nos agora o título Essa Vozinha na Sua Cabeça (edição Lua de Papel), obra que, através de simples exercícios, propõe-se reprogramar o cérebro, tornando-o imune aos pensamentos negativos.
Diz-nos o autor na apresentação à obra: “porque nos emocionamos tanto quando vemos certos filmes? Sabemos que é apenas um drama interpretado por atores, mas ainda assim acreditamos. Acontece o mesmo com os nossos pensamentos: apesar de serem imateriais, conseguem causar-nos alegria ou tristeza. Se, porém, começarmos a desenhar na nossa mente apenas cenários negativos, abrimos as portas à infelicidade. Somos como um computador que pode ser destruído por um vírus maligno”.
“O meu objetivo será mostrar-lhe como gerir corretamente o seu cérebro, para que viva mais feliz”.
Do livro Essa Vozinha na Sua Cabeça, selecionamos o excerto que pode ler abaixo.
O parasita mais resiliente
O meu filme favorito de sempre, A Origem, sintetiza‑o da melhor forma. Na primeira cena, Leonardo DiCaprio pergunta: “Qual o parasita mais resiliente? Uma bactéria? Um vírus? Um parasita intestinal?”, após uns segundos de pausa, responde: “Uma ideia. Resiliente, altamente contagiosa. Assim que uma ideia se apodera de um cérebro, é quase impossível erradicá‑la.”
Vivi com esse parasita durante anos. Sei agora que não é impossível erradicar as ideias, mas sem dúvida que concordo que uma ideia – um pensamento negativo – é um parasita resiliente quando nos leva a conceitos errados. Não é preciso ser‑se um cientista, ter‑se um doutoramento ou ver uma manchete nas notícias para percebê‑lo.
Basta lembrarmo‑nos daquele amigo que ficou obcecado com algo durante dias, semanas ou anos, sentindo‑se infeliz em virtude disso. Talvez já se tenha sentido assim. Um pensamento que se aloja algures nas nossas cabeças pode custar‑nos anos, por vezes uma vida inteira, de sofrimento.
Na pesquisa que desenvolvi, percebi que os pensamentos, e apenas eles, têm o maior impacto no nosso nível de felicidade. A vozinha nas nossas cabeças afeta ainda mais o nosso estado de espírito do que algumas das mais terríveis circunstâncias que possamos viver.
Deixe‑me mostrar‑lhe como e revelar‑lhe qual a relação entre os seus pensamentos e a sua felicidade.
Este exercício consiste em duas partes. Na primeira, a sua tarefa será a de pensar em algo que o deixe infeliz. Na segunda, terá de formar o nome de algo a partir das letras apresentadas mais abaixo. Pode considerar que foi bem‑sucedido se conseguir completar ambas as partes simultaneamente. Isto significa que tem de adivinhar o nome corretamente (tarefa 2) enquanto permanece infeliz (tarefa 1).
Comece por fechar os olhos durante vinte a trinta segundos e pense em algo que o deixe infeliz (lamento, desde já, piorar o seu estado de espírito, mas verá que será útil dentro de alguns minutos). Esta será, acredito, uma tarefa fácil. Assim que diz ao seu cérebro: “Ei, cérebro, traz ‑me algo que me perturbe”, ele irá aproveitar imediatamente a oportunidade.
Dirá algo como: “A sério? Posso mostrar‑te algo que te deixe perturbado? Calha que até tenho aqui 263 coisas sobre as quais te queria falar”. Assim que ele lhe fornecer a primeira dessas coisas e se sinta infeliz, foque ‑se nesse sentimento, sinta ‑o profundamente.
Agora tente mantê‑lo e, com esse sentimento, passe à segunda tarefa, que consiste em perceber qual o nome do objeto que as letras compõem. (Pista: é algo que faz algumas pessoas muito felizes.) Lembre ‑se, precisa de fazê‑lo sentindo‑se infeliz. Preparado? Vamos a isso.
Conseguiu decifrar? A resposta é Gelado de Baunilha. Já agora, não é relevante se adivinhou ou não. Não sou o seu professor do segundo ano. O que importa é: conseguiu manter‑se infeliz enquanto tentava adivinhar? Já fiz este teste, ou alguma variação do mesmo, com dezenas de milhares de audiências ao vivo, nas minhas palestras públicas e, digo‑lhe, ainda não encontrei alguém que consiga completar corretamente ambas as tarefas.
Aqueles que conseguem adivinhar abandonam o seu estado de infelicidade autoinduzido, e aqueles que decidem deixar a sua infelicidade perdurar, concentrando a sua atenção no que quer que seja que escolheram para se tornarem infelizes, falham sempre em adivinhar as palavras Gelado de Baunilha.
Este é um ponto importante, porque o ajuda a compreender plenamente a forma como os seus pensamentos funcionam. Quando essa vozinha na sua cabeça fala, ela não consegue focar‑se em mais nada, e quando se consegue focar noutra coisa, simplesmente não consegue falar.
Imagem de abertura do artigo cedida por Freepik.
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