Grandeza e natureza rigorosamente controlada marcam este jardim mandado construir Luís XIV, conhecido por Rei Sol, como símbolo do absolutismo régio. O jardim à la française aparece no final do século XVII e deriva do jardim renascentista à l’itallienne. São as rainhas francesas de origem italiana, Catarina de' Medici e Maria de' Medici, que procuram criar em França jardins que se assemelham aos da sua terra natal.
Surgem assim os jardins das Tuilherias e do Luxembourgo, em pleno centro de Paris. Muitos outros palácios terão, nas décadas seguintes, jardins à la française mas o expoente máximo são os jardins do imponente Castelo de Versalhes, Château de Versailles como os franceses lhe chamam. Localizado nos arredores da capital francesa, foi mandado construir no século XVII. O monarca gaulês mudou-se para lá em 1682.
Luís XIV transfere, nessa altura, a capital do reino para Versalhes e instala a corte naquela que era uma das casas de campo de seu pai, Luís XIII. O obreiro convidado é oriundo de uma família de jardineiros que trabalhará para a corte durante cerca de um século. André Le Nôtre, um conceituado arquiteto paisagista nascido em Paris, que é também amigo do rei, já havia ensaiado este modelo de jardim anteriormente.
Como foi pensada a conceção destes jardins
Nesta conceção, edifícios e jardins são interdependentes e formam uma totalidade. Desta forma, o arquiteto trabalha com o jardineiro-mestre e, no caso de Versalhes, é ainda convidado um pintor para o desenho das paisagens. André Le Nôtre trabalhará assim em parceria com o arquiteto Louis Le Vau e o pintor André Le Brun. A eles se deve grande parte do conceito que milhares de turistas ainda admiram hoje.
Geralmente, os jardins de Versalhes desenvolviam-se por detrás do imponente palácio, sendo impossível adivinhá-los para quem chegasse e, simultaneamente, protegendo-os da vida exterior. Pensados para serem apreciados de um ponto de vista alto, os membros da corte, vivendo sob o controlo do rei, já estavam habituados às vistas das janelas, marcadas por canteiros floridos, jardins com estátuas e campos a perder de vista.
Os embaixadores que visitavam o palácio ficavam impressionados com aquele que para a época era o maior de todos os jardins, com cerca de 93 hectares. Luís XIV, também conhecido por Rei Sol, queria um jardim que espelhasse o seu absolutismo régio.Efectivamente, será o jardim de Versailles, e não o palácio, que nos dá uma ilusão de imensidão. Grandeza e natureza rigorosamente controladas são as palavras-chave.
Para isso, contribuem perspetivas a perder de vista que, se prosseguirmos a visita, continuam pelo Grand Canal e terminam num horizonte que ainda pertence aos terrenos reais. A partir de um eixo central orientado no sentido este/oeste, desenvolvem-se numerosas avenidas paralelas e perpendiculares que percorrem os imensos jardins. Podemos considerar três tipos de espaços diferentes. Próximo do palácio, temos sucessivos terraços que permitem uma vista desafogada tanto dos jardins como da fachada do próprio edifício.
Num segundo momento, o Petit Parc, formado por pequenos bosques labirínticos, cada um dos quais com caminhos que desenham estrelas ou formas geométricas, que milhares de visitantes se forçam anualmente por percorrer, a pé ou nos veículos de quatro rodas disponíveis para alugar. E, por último, a floresta que atualmente tem cerca da metade da área original, mas que também está sujeita ao traçado ortogonal.
Às longas avenidas e ao alinhamento das árvores, acrescenta-se uma sucessão de estátuas em mármore que acentuam as perspetivas. A estatuária é outro elemento constante. Tal como nos jardins renascentistas, a mitologia clássica é a principal inspiração mas, sucessivamente, o barroco italiano dará lugar a uma arte nacional onde desaparecem as alegorias e França, tal como o rei, é glorificada com arcos de triunfo.
400 estátuas que se (con)fundem no verde
As cerca de 400 estátuas em mármore ou bronze pontuam também o cruzamento dos eixos principais, embelezando as 55 fontes cujos jactos de água alcançavam alturas inéditas para a época. Num dos terraços próximos do palácio encontra-se a orangerie, um dos espacos presentes num jardin à la francaise, mas bastante comum pelo centro-norte da Europa. Com cerca de 2,8 hectares, a orangerie apresenta-se como um pomar.
Um terreno de cultivo de fruta que inclui um espaço exterior e uma galeria interior com um jardim de inverno. As cerca de 3.000 laranjeiras e outras árvores estão ainda hoje, plantadas em caixas transportáveis para poderem ser recolhidas para as galerias durante os meses frios. A laranja era a fruta favorita do rei e as suas laranjeiras mediterrânicas eram, na realidade, as únicas árvores que davam frutos comestíveis.
Enquanto estes terraços e os bosques se apresentavam como verdadeiros salões exteriores, onde a corte assistia a peças de teatro e espetáculos musicais, comemorava festas ou fazia as suas promenades, a floresta era local de caça. Porém, os jardins também estavam acessíveis ao público e a prostituição era comum nestes bosques. Para evitar o vandalismo, os bosques foram, a dada altura, vedados.
Passaram, então, a estar abertos ou fechados consoante os (muito variáveis) humores do rei. O jardim utilitário, a horta, era outro espaço indispensável que, segundo o monarca, devia estar afastado do jardim de lazer propriamente dito. Assim, a horta encontra-se destacada e, desde 1798, passa a integrar o Institut National Agronomique, mais conhecido como Agora, a escola nacional de agronomia francesa.
Para além dos legumes e das plantas medicinais que por lá eram cultivados, variadíssimas plantas exóticas surpreendiam a mesa real. A adaptação destas plantas é conseguida com espaços vedados por altos muros que criam verdadeiros micro-climas. Um último elemento que integra qualquer jardin à la française é a arte topiária. Arbustos recortados com formas geométricas, animais, peças de xadrez e por aí fora... A arte topiária na realidade já aparece pintada em frescos de Pompeia em Itália e é amplamente retomada nos jardins renascentistas.
No jardin à la française, Claude Mollet, outro importante e conceituado jardineiro real, introduz uma novidade que fica conhecida como terraços em broderies, os famosos bordados, outra das atrações destes jardins sedutores. Servindo-se de pequenos arbustos ou árvores, geralmente buxo ou teixo, desenham-se composições em arabescos ou entrelaçados no interior dos quais se plantam variadíssimas flores coloridas.
O percurso que o rei recomendou
Todos estes pormenores contribuem para a criação de uma natureza que é amplamente controlada pelo homem e é precisamente essa a mensagem política que, em última análise, um jardin à la française sugere. O monarca controla tudo inclusivamente a natureza. Para facilitar as promenades pelo seu jardim, Luís XIV escreveu um texto que ficaria popular, "Manière de montrer les jardins de Versailles".
Neste documento, sugere um percurso que passa pelas fontes e espaços que mais gostava. Esse mesmo percurso ainda é hoje recomendado aos visitantes do parque. No reinado seguinte, do filho de Luís XIV, Luís XV, o jardim é alargado com o Trianon, também da autoria de André Le Nôtre, assim como com os domínios de Marie Antoinette onde se encontra uma outra orangerie, uma horta ou ainda uma quinta.
O bosque do rei será, depois, adaptado ao estilo do jardim inglês, em voga na época, que acaba por ser criticado por ser pouco original. Reis e nobres ficarão fascinados com o jardim de Versalhes, que será o modelo para muitos outros jardins franceses, europeus, russos ou americanos. Arquitetos franceses serão também convidados para projetar jardins que adaptam o seu exemplo às características regionais.
A essas, à tradição local e ao gosto do próprio encomendador. Porém, nenhum desses jardins à la française excederá a majestade dos de Versalhes. Localizado a 12 quilómetros a oeste de Paris, o Château de Versailles ocupa uma área total de 93 hectares. Os bilhetes podem ser adquiridos online. Além de passes de um e dois dias, são várias as modalidades disponíveis, com preços a partir dos 18 €.
Texto: Diana Pereira e Luis Batista Gonçalves (edição digital)
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