A campanha First Years.First Priority pretende, a nível europeu, influenciar a adoção de políticas e estimular investimentos, de modo a todas as famílias terem o suporte de que precisam para proporcionar um ambiente saudável, estimulante, seguro e protetor às suas crianças.
O foco nas crianças entre os 0 e os 6 anos, e muito em especial entre os 0 e os 3 anos, torna-se necessário porque hoje há uma enorme distância entre o que a ciência sabe sobre a importância dos primeiros anos de vida e o que, de modo geral, a realidade reflete, nas práticas e nas políticas.
A ciência diz-nos que o ritmo de desenvolvimento nos primeiros 3 anos de vida é tal que este período constitui uma oportunidade única.
A neuroplasticidade (a capacidade de o sistema nervoso, aos níveis celular, metabólico ou anatómico, se modificar através da experiência) atinge o seu máximo neste período da vida. Ou seja, este é um período de sensibilidade excecional às influências ambientais.
O desenvolvimento da arquitetura cerebral estabelece-se muito cedo na vida e, as experiências pessoais e a qualidade das interações nessa etapa, têm impacto no modo como as predisposições genéticas se manifestam.
Relações carinhosas, estimulantes e consistentes com os cuidadores fundamentais (em regra, os pais) geram um laço (vínculo seguro) fundamental para o desenvolvimento da empatia, da confiança e do bem-estar. Por outro lado, a sujeição a um nível de stress tóxico (extremo e/ou de longa duração) e a condições adversas, têm impactos sérios no desenvolvimento do cérebro, com consequência duradouras, a nível social e cognitivo.
A ausência de estímulos adequados ou a indisponibilidade de serviços em tempo, podem, por sua vez, agravar mais uma situação de atraso de desenvolvimento e condicionar mesmo a saúde ao longo da vida.
No estudo da NOVA SBE “Intervir na Infância” (2018), patrocinado pela Fundação Nossa Senhora do Bom Sucesso (FNSBS), foram analisados 39 estudos de impacto, a nível internacional. Os projetos avaliados incidiram na gestação e/ou primeiros anos de vida e evidenciaram efeitos positivos, entre outros, nos domínios da escolaridade, saúde ao longo da vida, empregabilidade e contenção da criminalidade. Isto significa que a dinâmica familiar pode ser facilitada por uma sociedade que, ciente da importância dos primeiros anos de vida, alinha políticas e sistemas, de modo a proporcionar um suporte adequado às famílias. Significa ainda que os retornos desse investimento não se farão sentir apenas ao nível do desenvolvimento individual, mas também na sustentabilidade, como sociedade.
A campanha First Years. First Priority, lançada a 15 de dezembro de 2020, é promovida, a nível europeu, pela Eurochild e pela International Step by Step Association com o apoio da European Public Health Alliance e do Roma Education Fund. Esta campanha visa em especial 9 países. Para além de Portugal, Espanha, França, Irlanda, Finlândia, Bulgária, Roménia, Sérvia e Hungria, são o alvo.
Em Portugal a campanha Primeiros Anos. A Nossa Prioridade, é liderada pela FNSBS, no quadro de uma coligação nacional que envolve já milhares de organizações e conta com o Alto-patrocínio de Sua Exª o Presidente da República.
Porque é importante a campanha em Portugal?
A campanha é necessária em Portugal, apesar de todos os progressos feitos ao longo de décadas, porque:
- O conhecimento científico disponível ao nível da importância dos primeiros anos de vida não está ainda disseminado ao nível de toda a sociedade;
- Os nossos níveis de pobreza infantil são superiores aos patenteados na população adulta e, famílias em situação de pobreza, têm dificuldades acrescidas;
- O acesso real, generalizado e em tempo a cuidados de saúde infantil (diagnóstico e intervenção precoce) ainda não é uma realidade.
A institucionalização, no sistema de acolhimento, de bebés; o não reconhecimento dos 0 aos 3 anos como período educativo; e a falta de informação sistematizada e publicada sobre este estrato etário; são outros três sinais muito expressivos de que, como sociedade, ainda não entendemos bem que, o que se “joga” nos primeiros mil dias de vida, é mesmo muito importante! Deixar algumas crianças para trás é comprometer o futuro, de todos!
Texto: Paula Nanita, Conselho executivo da FNSBS
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