Eles têm dificuldade em compreender o ponto de vista das outras pessoas, correm riscos, têm um baixo controlo sobre os seus impulsos, frequentemente estão mal-humorados e são, por norma, bastante autocríticos. Por que é que a sociedade e a cultura tanto criticam e ridicularizam os adolescentes? As alterações hormonais, as inquietações e as contradições que caracterizam a adolescência são terreno fértil para representações cómicas e dramáticas desta fase da vida.
No mundo real, os registos fotográficos e videográficos das preferências de estilo e das atitudes, assim como o desenvolvimento da autoconsciência, não permitem que as pessoas ignorem esse período. Se forem pais, sobretudo de pré-adolescentes, é como se a história estivesse prestes a repetir-se. Temos, no entanto, boas e más notícias para os progenitores de púberes. Antes de avançarmos para as positivas, vamos tirar, num instante, o penso rápido da ferida.
É que, como se não bastasse a adolescência ser a fase menos apreciada do desenvolvimento, parece estar a ficar mais longa, como têm advertido publicamente inúmeros especialistas. "Ela é definida como o período da vida que começa com as mudanças biológicas, hormonais e físicas da puberdade e termina com a idade na qual o indivíduo atinge um papel estável e independente na sociedade. Isso pode levar algum tempo", alertou Sarah-Jayne Blakemore, professora de neurociência cognitiva na University College London, no Reino Unido, durante a conferência internacional "The mysterious workings of the adolescent brain".
Tirando esse pequeno senão, comparando com a adolescência dos pais, mantém-se praticamente tudo na mesma. Só que com computadores portáteis, telemóveis e tablets à mistura, na linha das mudanças sociais que se têm vindo a verificar. O desenvolvimento infantil é pautado por uma crescente autonomia e responsabilização pelos atos. Acontece que alguns progenitores optam por depositar esse compromisso nos filhos apenas quando eles chegam à adolescência.
A maioria fá-lo, muitas vezes, sem antes os terem preparado para tal, uma situação que é criticada pela psicóloga infantojuvenil Inês Afonso Marques. "Deve começar-se desde cedo, explicando e demonstrando, a partir de exemplos práticos, que qualquer ato acarreta consequências", defende. "Por exemplo, se a criança insistir em continuar a comer doces depois de dizer que lhe dói a barriga, poderá ficar a doer mais ou mesmo chegar a vomitar", referiu à Saber Viver.
Igualmente, os pais não devem esperar que sejam os adolescentes a questionar sobre temas como a sexualidade ou o consumo de álcool e de drogas. "É importante que os jovens não sintam que há assuntos tabu em casa, porque isso poderá levá-los a esconder as suas dúvidas, os seus medos, as suas hesitações e potenciar a tomada de decisões de modo desinformado ou levá-los a ir buscar informação em fontes menos fidedignas", justifica ainda a especialista.
Fora da zona de conforto e sem noção
Na adolescência, os riscos são muito mais apetecíveis do que nas outras fases da vida. Mas isso deve-se ao facto de o cérebro ainda estar em desenvolvimento. Hoje, sabe-se que, neste período, o sistema límbico é hipersensível à sensação de recompensa que se tem quando se arrisca. Embora pareçam propositadas, grande parte das ações e das palavras que possam magoar, vindas dos próprios, dos familiares ou até mesmo dos próprios amigos, não o são, todavia.
"Uma das regiões do cérebro que muda mais radicalmente durante esta fase é o córtex pré-frontal, ele está envolvido numa vasta gama de funções cognitivas, tais como tomada de decisões, planeamento, inibição de comportamentos inapropriados, interação social, compreensão dos outros e a autoconsciência", explica a neurocientista britânica Sarah-Jayne Blakemore. Inúmeros especialistas, nacionais e internacionais, reveem-se nas palavras desta profissional.
Inês Afonso Marques sublinha que, "para se crescer e ocorrer aprendizagem e desenvolvimento, é necessário correrem-se alguns riscos, calculados". Isto é, expor-se emocionalmente, ter um relacionamento e, potencialmente, experienciar um desgosto de amor e ter negativa num teste, sem colocar a sua saúde mental e física em perigo.
Importa referir ainda que o ambiente em que o adolescente está inserido e o ensino podem moldar o seu cérebro.
Nesse período da vida, esse órgão é especialmente maleável. Segundo a especialista, os jovens tendem a distanciar-se dos pais "numa lógica de autorreflexão e autodescoberta, que decorre da capacidade emergente de pensamento abstrato". "Enviam pistas ambíguas aos seus pais quanto às suas necessidades, não por pura rebeldia, mas porque eles próprios se encontram numa fase de constante ajustamento às mudanças físicas, emocionais e cognitivas", refere.
O reforço positivo que é necessário fazer
Como forma de premiar o bom comportamento e o sucesso académico, alguns pais dão presentes, que variam muito em valor e grau de segurança e que podem ir de roupa, a bilhetes de concertos, a tablets e/ou a motas, consoante a disponibilidade financeira da família. Contudo, Inês Afonso Marques é da opinião que "os reforços de natureza social, os elogios, os sorrisos e as manifestações indiretas de satisfação, poderão ter efeitos mais consistentes", defende.
As competências necessárias para lidar com uma maior autonomia e independência dos pais são adquiridas gradualmente ao longo da adolescência, logo, mesmo que o jovem garanta que não precisa do apoio parental, a verdade é que (secretamente) o desejam. "Podem demonstrar pouco interesse em escutar os progenitores, numa espécie de rebeldia, mas, no fundo, os adolescentes anseiam por orientações", assegura a psicóloga infantojuvenil.
Filmes, livros e séries que o poderão ajudar
Os pais não devem usar psicologia invertida para obterem aquilo que pretendem dos filhos. O mais provável é que isso incentive ou reforce posturas desafiantes. Atualmente, não faltam fontes de informação sobre a adolescência aos familiares, professores e aos próprios jovens. Em caso de dúvida, aconselhamos a começar pelas leituras, filmes e séries que sugerimos, que acreditamos poderem ajudar a preparar os indivíduos para esta atribulada fase do desenvolvimento.
No que se refere a livros, aconselhamos a leitura de "Adrian Mole na crise da adolescência" de Sue Townsend, publicado em Portugal pela Editorial Presença. "Eleanor & Park" de Rainbow Rowell, um título da editora Chá das Cinco, é outra recomendação, assim como "B'teen - É a vida dos adolescentes de hoje" de Pedro Strecht, pedopsiquiatra, publicado pela editora Verso de Kapa. Tem ainda "Inventing ourselves: The secret life of the teenage brain".
Escrito por Sarah-Jayne Blakemore, integra o portefólio editorial da Public Affairs. Se é mais de ver filmes, sugerimos "As vantagens de ser invisível", uma longa-metragem de 2012. "Ela é fácil" de 2010, "Juno" de 2007, "Giras e terríveis" de 2004 e "10 coisas que odeio em ti" de 1999 são outros filmes a (re)ver. Em termos de séries, tem "Sex education", "13 reasons why" e "Atypical", títulos que muitos especialistas sugerem aos pais que querem compreender os filhos.
Comentários