Estamos na Calçada do Poço dos Mouros, a piscar o olho à Morais Soares. Muito discreto, encontramos o Garrincha no número 83, uma antiga e típica tasca lisboeta que se manteve tal e qual para deixar entrar um novo projeto culinário, no bairro de Arroios.

Lá estão os azulejos azuis na parede com referências a Ponte de Lima (e talvez aos antigos proprietários), o balcão de inox, com possibilidade de ali comermos, também. No lugar onde antes estariam uma série de garrafas de licores portugueses alinham-se as mais de 80 referências de vinho, maioritariamente naturais, numa parte. Rótulos portugueses convivem com rótulos estrangeiros. Mas não só. Ao lado, o sistema de som e luzes dá o mote para um ambiente intimista e simplista. Não vale a pena exagerar quando o foco que se quer dar é à refeição.

Foi uma tasca, tem alma de tasca, mas não é uma tasca. Em Lisboa há agora o Garrincha
Foi uma tasca, tem alma de tasca, mas não é uma tasca. Em Lisboa há agora o Garrincha

Sentamos ao balcão, com o menu impresso no toalhete, para as apresentações e primeiras impressões. O Garrincha é o projeto do chef Adam Denis, um israelita que chegou a Portugal há ano e meio, depois de muitas viagens pela Europa, trabalhando em restaurantes de fine dining, em França e Alemanha. Começou por se instalar no Porto, onde numa viagem anterior tinha ficado a conhecer o "excelente peixe e a qualidade do azeite". Mas foi em Lisboa que montou a sua base e o restaurante. “Durante muitos anos trabalhei em fine dining, para os outros. Achei que estava na altura de abrir o meu próprio projeto, com pratos feitos a partir de ingredientes simples, e que estejam disponíveis no momento”, resume Adam Denis, em relação ao seu percurso de mais de uma década.

Foi uma tasca, tem alma de tasca, mas não é uma tasca. Em Lisboa há agora o Garrincha
Foi uma tasca, tem alma de tasca, mas não é uma tasca. Em Lisboa há agora o Garrincha O chef Adam Denis abriu o Garrincha em julho de 2023. créditos: Divulgação

O Garrincha partilha o mesmo ponto de partida de restaurantes como O Velho Eurico, em Alfama, ou a Tasca Pete, na Graça. Tratam-se de antigas e típicas tascas portuguesas que fecharam portas e voltaram a abrir com novas mãos. Mas visualmente continuam a ser o mesmo: não houve mexidas na decoração o que torna estes lugares numa espécie de híbridos, em Lisboa. Não são as tascas de bairro, mas também não são os conceitos “fancy”, virados para o turista. São sobretudo projetos gastronómicos que vão ganhando clientela, e que depois do passa-palavra, se tornam famosos pela sua essência.

O nome Garrincha não saltará à memória de qualquer pessoa. Mané Garrincha, futebolista brasileiro que se celebrizou na década de 1950, pelas suas fintas e pela vida boémia, e que muitos consideram melhor que Pélé, é a grande inspiração do chef, ao ponto de batizar o seu restaurante.

Foi uma tasca, tem alma de tasca, mas não é uma tasca. Em Lisboa há agora o Garrincha
Foi uma tasca, tem alma de tasca, mas não é uma tasca. Em Lisboa há agora o Garrincha Éclair de sardinha (9€). créditos: Divulgação

No Garrincha, quem vem a jogo são pratos de assinatura, com várias inspirações, da isrealita à marroquina,  como aquele que já é um incontornável: o éclair de sardinha (9€). Trata-se uma entrada em que a sardinha é curada em dois tipos de vinagres de vinho branco de Borgonha e de vinho tinto Moura Alves, que envelheceu 10 anos em barricas. Depois, os vinagres são reduzidos juntamente com açúcar, dando lugar a uma marinada onde as sardinhas ficam de um dia para o outro. Quando estão completamente secas, são conservadas “em bom azeite”. Servida em pão torrado, manteiga e tomate espremido, este é um dos pratos base que tem lugar cativo no cardápio desde a inauguração do espaço, em julho deste ano. Mas é um caso raro. “Nós temos um menu novo todos os dias, com opções que vão sendo diferentes, de acordo com os produtos que vou encontrando”, sendo o mercado de Arroios um dos locais onde o chef vai às compras.

A imprevisibilidade faz parte do processo. Um dos pratos do menu da noite em que visitámos o Garrincha seria pita de polvo (21€), mas como Adam não encontrou produto à altura, a opção passou por trocar o ingrediente principal por peixe.

Foi uma tasca, tem alma de tasca, mas não é uma tasca. Em Lisboa há agora o Garrincha
Foi uma tasca, tem alma de tasca, mas não é uma tasca. Em Lisboa há agora o Garrincha Pita de pexie, uma reinvenção da pita de polvo (21€). créditos: Divulgação

Outra das características da comida apresentada é o facto de o chef usar um grande leque de ervas aromáticas, em vez de “pimenta preta ou especiarias. É tudo muito simples: sal, azeite e ervas aromáticas. Conseguimos apresentar opções inteligentes com estes recursos”. Os preços começam nos 3,50€, sendo que o valor dos pratos estão dependentes dos produtos disponíveis no dia.

É possível reservar mesa através do link disponível na página de Instagram, de quinta a domingo, em dois momentos possíveis: o primeiro serviço, que tem lugar a partir das 18h30, com a última reserva às 19h45; e o segundo serviço cujas reservas começam pelas 20h45 e terminam às 22h30. Ao domingo é ainda possível marcar almoço, entre as 12h e as 14h30.

Garrincha

Morada: Calçada Poço dos Mouros 83, 1170-293 Lisboa

Horário: Quinta a sábado, das 18h30 às 23h. Domingo, das 12h às 15h e das 18h30 às 23h

Contactos e reservas: https://www.instagram.com/garrincha.lisbon/

Os clientes são essencialmente portugueses, sobretudo do bairro, que têm vindo descobrir o espaço, assim como clientela de bares de vinho, que se têm multiplicado por Lisboa, dado as referências que aqui se servem. Alguns turistas, aqui e ali. Mas parece que, por agora, ainda é fácil conseguir lugar no Garrincha.

O SAPO Lifestyle esteve no Garrincha a convite do restaurante.